Oscar 2017: Fora dos padrões, Manchester à Beira-Mar é um drama devastador

Vinicius Machado
SALA SETE
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3 min readFeb 23, 2017

Se tem uma coisa pela qual eu costumo torcer o nariz no cinema são filmes que apelam para o melodrama. Sequências cheias de trilhas, desesperos, feitas para tocar o espectador, o tal do choro fácil. Claro, há filmes em que a técnica funciona bem e é até compreensível que façam assim, além de ser o que atrai o grande público, é o caminho mais fácil e até mesmo convencional de se fazer drama. Por sorte, temos alguns que pensam fora da caixinha, como é o caso de Manchester à Beira-Mar.

Dirigido e escrito por Kenneth Lonergan, o filme conta a história de Lee Chandler, que se vê forçado a retornar para sua cidade natal com o objetivo de tomar conta de seu sobrinho adolescente após o pai do rapaz, seu irmão, falecer. Este retorno ficará ainda mais complicado quando Lee precisar enfrentar as razões que o fizeram ir embora e deixar sua família para trás, anos antes.

Fazer um longa como este não é nada fácil, ainda mais para se obter a qualidade que possui. Sua regularidade em manter a trama baseada na tristeza com pouquíssimos alívios impressiona. É como se toda a depressão fosse colocada dentro de um filme sem se preocupar com o que o espectador pensa disso. Aqui não há sutileza em evoluir a narrativa, pelo contrario, a trama joga tudo nas costas do público sem qualquer receio. A função do roteiro é de apenas explicar algumas pontas que resultaram nisso, e quando explica, lá pela metade do filme, a situação fica ainda mais agoniante.

A direção de Lonergan é essencial e sua escrita também. Um dos grandes pilares está em seus diálogos praticamente reais. Os personagens discutem entre si, algo pouco ensaiado, que aumenta a veracidade das situações. Além disso, ele conta auxílio da diretora de fotografia, Jody Lee Lipes para transmitir todos os sentimentos pelas cores e fotografia. As paletas são muito bem estabelecidas entre os flashbacks e o presente, responsáveis por determinar o desfecho dos acontecimentos e suas consequências. A trilha também é um fator determinante em certos momentos. Uma trilha praticamente silenciosa, mas que potencializa os sentimentos tanto dos personagens quanto do público.

No entanto, nada disso seria possível se não fosse as atuações de gala. Todos sem exceção fazem um trabalho extraordinário, a começar pelo protagonista, Casey Affleck. O indicado e provável vencedor do Oscar de melhor ator interpreta um cara triste, introspectivo e consegue trazer toda depressão e remorso pelo olhar e pela postura. Parece que a qualquer momento ele vai surtar, gritar bem alto, explodir, mas não, ele passa as duas horas do filme com o mesmo comportamento e essa é a grande causa da nossa angústia também.

O adolescente Lucas Hedges (Patrick) também faz um bom trabalho imprimindo toda a oscilação de humor que um jovem de sua idade tem. Sua atuação casa bem com Affleck. Já Michelle Williams (Randi) protagoniza um dos diálogos mais pesados do filme. Kyle Chandler (Joe) tem pouquíssimo tempo de tela, mas suas participações dão vontade de querer vê-lo mais em cena.

Muito mais do que só tristeza, Manchester à Beira-Mar possui um certo sarcasmo disfarçado e carrega uma história interessante sobre luto, recomeço, culpa e como superar (ou não) certos traumas. É possível esboçar alguns sorrisos em algumas cenas, até, mas seus diálogos e sua introspecção são os responsáveis por não deixar o espectador desgrudar do filme, o resultado é devastador. E isso é sensacional.

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Vinicius Machado
SALA SETE

Jornalista, cinéfilo, fanático por Star Wars e editor do blog Sala Sete. Escreve sobre filmes e não dispensa uma boa conversa sobre o assunto.