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Caixas

Tales Gubes
Ninho de Escritores
2 min readMay 20, 2021

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Rogério aproxima o cartão da maquininha. Bip, cartão recusado. A atendente informa. Rogério enrubesce e pede para passar de novo, desta vez colocando o cartão dentro da máquina. Essas tecnologias novas, diz meio que pra si mesmo, meio que para a moça que o atende. Ela nem responde. A máquina pede senha. Rogério digita apressado e certeiro. Atrás dele a fila de pessoas começa a ganhar vida: resmungos, corpos reajustam pesos entre os pés e alguém pergunta por que a atendente demora tanto. Cartão recusado. Não é possível, passei o cartão em outra loja agorinha, Rogério explica. É mentira, mas nem tanto porque ainda outro dia havia mesmo passado o cartão para alguma coisa, só falta lembrar o que foi. O senhor tem outra forma de pagamento? Não, não tenho, Rogério responde, o suor frio já descendo a nuca. Olha para a fila de curiosos e ansiosos, pensa em desistir das compras. Havia prometido que hoje o jantar seria por sua conta, se ao menos tivesse se planejado melhor… pergunta por um caixa vinte e quatro horas. A atendente diz a ele o mais próximo e emenda informando que precisará passar todos os itens de novo na volta, mas que Rogério pode passar à frente da fila e falar diretamente com ela. Pessoas ultrajadas chiam mais alto. Rogério agradece e sai apressado seguindo as instruções. Procura, erra o caminho, volta atrás, refaz os passos, encontra o caixa. Uma mulher idosa está à sua frente, então para atrás dela. Ela demora, Rogério fica ansioso, se mexe de um lado para o outro. Olha as horas no celular, a senhora continua ali, entra no Instagram, a mulher termina uma operação e começa outra, lê alguns posts no Twitter, a velha continua ali, acaba a bateria do telefone. Rogério tenta espiar o que ela tanto faz no caixa eletrônico, se percebe no espelhinho do caixa e volta para o seu lugar. Rogério se percebe batendo o pé e para. Olha ao redor, as pessoas seguem suas vidas, cada uma na sua velocidade. Se volta para o caixa outra vez e percebe que a velha já saiu. Insere o cartão no caixa, põe a senha, aparece uma mensagem estranha. Rogério aperta qualquer tecla para voltar ao menu inicial e ouve a máquina engolindo seu cartão. Tenta segurá-lo, porém a máquina é mais rápida. Rogério bate no caixa. Nada acontece. A mensagem na tela manda contatar o banco e oferece um número. Rogério pega o celular para tirar uma foto e lembra que está sem bateria. Derrotado, volta para casa.

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Tales Gubes
Ninho de Escritores

Um olhar não-violento para uma vida mais livre, honesta e conectada. Criador do Ninho de Escritores, da Oficina de Carinho e do Jogo pra Vida.