Cinzenta é a Hipocrisia
Tempos de ar preso
De ar que falta
Lá e dentro de mim.
Palavras soltas não me definem
Nem frases
Nada consegue definir quem sou neste instante.
Eu não me defino!
Letras de ponta cabeça
Pretas e brancas
A cor se esvai nesse emaranhado
Nessa teia que teima
Nessa teia que se enrosca em mim
Em você,
Em nós.
Palavras desconexas
Desequilibradas,
Confusas e frias
Como esse piso de pedra
Bonito, embora frio
Frio, apesar de
Bonito.
Sentimento indefinido
Sussurros
Murmúrios
Até gritos
O silêncio não encontrado
Necessitado!
O pulsar do órgão
Pontada
Calafrio
Permissão
Omissão
Devaneio ou clareza?
Será clareza que teimo não enxergar
E no óbvio me perco?
De que lugar é a minha fala?
Há alguma escuta?
Há escuta para o que luta, silencia e grita?
Para o que é assassinado neste país diariamente?
Quem escuta?
A falta de empatia
A injustiça social
Escravidão contínua
Opressão
O que é real
O que se denomina normal
Marginalizados
Descriminados
Reivindicando a cada dia,
Todos os dias
Suas existências.
Seu direito de ser
De pertencer
De serem vistos em suas humanidades
De viver!
E na casa da família
De classe média e alta,
A culpa de transmitir o vírus
Recai sobre o elo fraco
E nesta hora
Fica claro o preconceito.
Aquele que não limpa a própria sujeira
Não olha os filhos
Não faz sua comida
E precisa de quem o faça por ele,
Delega
Ao transporte público diariamente
Correndo risco,
O outro.
O branco imaculado,
Qual espuma abundante do sabão
Escorre
Da ponta ao cabo
A faca
A lâmina afiada
Qual língua ferina e mentirosa
Mancha a espuma
E o que parecia ser, já não é
Nunca foi.
Com o discurso hipócrita
Engana quem quer
Ser enganado
Repetem palavras e discursos rasos
Pobres, superficiais.
Não sentem
Nada sentem
Em seus sonos injustos
Só repetem.
Desafio
Agonia
Taquicardia
Espera
Erro
Ignorância
Cegueira
Acerto.
E de cinzento
O dia nasce,
O céu de tons laranjas
A leveza paira no amanhecer
No quintal o orvalho
Sobre a branca flor da mirra.
Nestes segundos de pura contemplação
O dia é claro e há silêncio
Silêncio margeado pelo canto de pássaros.
Instantes.
O branco e translúcido
Do amanhecer no outono.
O céu azul
Transforma-se em anil
De anil
A escuridão
A negra noite
Medo
Pânico
Sombras
E a desconexão
De letras soltas
Palavras e frases sem sentido
Os olhos turvos
Com lágrimas presas
Presas como se sentem
Em suas vidas vigiadas.