Como incluir minorias nas suas histórias?

Tales Gubes
Ninho de Escritores
3 min readDec 8, 2016

Como gay, não me sinto representado em muitos personagens que encontro por aí, principalmente no cinema. Nem deveria ser tão difícil: eu sou homem, branco, classe média etc., ou seja, as probabilidades estão ao meu favor.

Ainda assim, quando encontro personagens LGBT em filmes, a tendência é que eles sejam estereotipados, sirvam apenas como tipos humorísticos ou para sofrer por rejeição, violência e desencontros. Isso é reflexo da nossa cultura machista, homofóbica, transfóbica, racista, elitista…

Mergulhados nessa cultura, às vezes é difícil enxergarmos como podemos escapar desses lugares comuns aos quais relegamos as minorias.

No curso de escrita narrativa com temática queer que ministro, por exemplo, é muito difícil encontrar histórias sobre personagens transgêneros que não tratem exclusivamente da dor de não pertencer e de não ter o gênero reconhecido. Isso é um problema porque personagens trans enfrentam conflitos de todos os tipos, como quaisquer outras pessoas.

Para ajudar escritores e roteiristas a refletirem sobre o papel dos personagens pertencentes às minorias em suas histórias, há dois testes bacanas que podem ser feitos.

O teste de Bechdel

O primeiro é o teste de Bechdel, cujo propósito é avaliar se uma história abre espaço para mulheres como criaturas complexas e dignas de atenção. O teste, criado por Alison Bechdel nas tirinhas de Dykes to watch out for, envolve três condições:

  • deve haver pelo menos duas mulheres;
  • elas devem conversar entre si;
  • sobre algum assunto que não seja homens.

Parece simples, né? Ainda assim, muitas histórias falham em contemplar esses quesitos básicos inclusive em narrativas com e sobre mulheres.

O teste de Vito Russo

O segundo é o teste de Vito Russo, inspirado no Bechdel, porém voltado para personagens LGBT. Também são três as condições para passar no teste:

  • há um personagem claramente identificável como lésbica, gay, bissexual ou transgênero;
  • o personagem não deve ser caracterizado exclusivamente por sua orientação sexual ou identidade de gênero;
  • o personagem deve estar vinculado à trama de tal forma que sua remoção causaria impacto no enredo.

Em 2016, apenas 8 de 22 filmes com personagens LGBT passaram no teste (segundo a GLAAD). Estamos muito distantes de um universo ideal.

O que os testes significam

Os testes servem como indicadores. Uma história que passe no teste de Vito Russo tem mais potencial de tratar seus personagens LGBT com respeito. Ela ainda pode ser homofóbica, violenta e estereotípica, mas pelo menos o será com personagens mais relevantes.

No final das contas, o importante é nos questionarmos sobre o papel que vemos e damos para personagens em nossas histórias.

Ainda faltam outros testes para afinarem nosso olhar. Quais seriam as condições para testes sobre personagens negros (estarem em posições de poder), deficientes físicos e mentais (não serem definidos exclusivamente por suas deficiências), gordos (terem vidas que vão além de dietas e rejeições)?

A estrada da inclusão é longa e cheia de tropeços, mas a gente segue nela.

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Tales Gubes
Ninho de Escritores

Um olhar não-violento para uma vida mais livre, honesta e conectada. Criador do Ninho de Escritores, da Oficina de Carinho e do Jogo pra Vida.