O MAIS FUNDO DO POÇO …

Maria do socorro Vieira Freire
Ninho de Escritores
3 min readSep 8, 2021

Uma lágrima fina riscou meu rosto, uma agulha afiada furava meu peito invadindo minha alma na mais profunda angústia e desespero que eu jamais imaginei passar. Aquele dia fatídico não sai mais nunca da minha cachimônia. Ela era somente uma menininha, minha menininha que brincava entre os arbustos no quintal da casa, Emily, estava sempre nos arredores, enquanto eu envolvia-me nas minhas tarefas diárias, atenta a sua voz falando com seus brinquedos e seus amigos imaginários. Nesse dia já passava das onze horas quando percebi que a voz de Emily havia se perdido no silêncio. Senti falta do seu palavreado sem conexão falando com pessoas que ela criava na sua imaginação. Sai à sua procura, andei por entre os raros arbustos, gritando por ela. Emily não me respondia. Comecei a ficar desorientada. ” O que havia acontecido com a minha pequena. Lembrei-me do poço… e, que no dia anterior havia pedido a seu João para limpar-… “Ele não teria feito isso? “Corri até lá e o encontrei sem tampa. ”Emilyyyyyyy”. Gritei desesperada fazendo o céu me ouvir.

“Emilyyyyy. “Ela não me respondia. Mas meu coração não estava enganado, Emily estava lá no fundo daquele maldito poço. Sai correndo pedindo ajuda.

Em pouco tempo os bombeiros retiravam o corpo inerte de minha filha lá de dentro, escorrendo água dos seus cabelos loiros. Pessoas que eu não sei quem eram aqueles rostos que me olhavam penalizados, me seguravam para eu não atrapalhar a retirada do que sobrava da única joia que eu possuía.

Minha vida esvaiu-se juntamente com a vida dela. Que sentido teria o meu mundo? A minha vida sem a minha menina?

Em um estado terminante de loucura, ao levarem a minha filha, peguei um facão e corri até a casa daquele que eu julgava o culpado de todo aquele desfecho infernal pelo qual eu estava a passar.

Sem pensar e sem falar nada golpeie seu João com golpes de facão como quem estava matando a dor que consumia minha alma. Em poucos instantes olhei para o homem ensanguentado no chão e sua esposa e os três filhos me olhando embasbacados, com os olhos arregalados e o pobre diabo caído no chão. Sai correndo, ali era o meu fim, o fim de tudo, o fim de Emily, o fim do seu João, homem pobre que vivia ganhando centavos para alimentar sua família, também era o fim daqueles pequenos sem um pai… E da esposa… D. Maria, mulher submissa, dependente da pobreza do marido.

O que aconteceu dali em diante não sei mais, por que fui enclausurada entre os muros altos desse manicômio, mal vejo a luz do sol e melhor se não visse mesmo.

Deixei uma esposa e três filhos órfãos, e dias depois recebi a visita de Emily e seu pai, ela não morreu chegou ao hospital com vida e foi tratada.

Quem morreu fui eu, cada dia morre uma parte de mim, uma célula, meu cabelo cai, perde o brilho a vida se vai…. Por que não esperei a verdade para uma atitude tomar, acalorada pela emoção, decidi sem pensar e agora fui diagnosticada como louca e sou mesmo.

Estou perdendo o que a vida ainda estaria a me oferecer. Vejo os dias indo sem volta e a morte se arrastando lentamente, chegando como um animal rastejante, sinto ela se aproximando. Emily ficara bem com seu pai, e sua família, eu já me entreguei. O céu ou o inferno se abrirá, eu entrarei e se tiver outra oportunidade, antes de fazer… pensarei…. No outro.

Por Socorro Freire

Em 08/08/2021

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