onde acaba

Adriana Lippi
Ninho de Escritores
2 min readOct 17, 2020

não se sabe onde começa nem onde acaba. É imenso, posso me perder. Não tenho certeza aonde vai dar. Às vezes parece frio, às vezes quente. Não é garantido, a cada passo os pés afundam, onde pisei há minutos atrás já se foi.

Não tem como saber o que está por baixo da superfície, leio os sinais, busco o que não é dito. Uma leve mudança no céu pode indicar ventanias.

Quando olho vem um arrepio que não sei se é de excitação ou de pavor. Já estive aqui outras vezes. Me machuquei. Não quero essa dor de novo, ninguém pode me prometer que ela não virá mais. Mas lembro da sensação de flutuar, a sensação de ser mais leve que o ar. Sensações que só vem quando se entra de verdade, quando a água passa da cintura.

O salgado vem junto. Suor ou lágrimas. Suor e lágrimas. A maresia gruda na pele e deixa claro onde estou. Nem tudo é planejado, de repente acontece de se ver submerso em algo que nunca foi buscado.

Existem correntes, não dá pra ver, elas não nos prendem, mas levam para onde eu não saberia dizer. Segurar o ar pode ajudar quando algo empurra para baixo de súbito, mas por muito tempo pode acabar com tudo.

Não ter o controle, não saber o que vai acontecer. O mistério e o risco, a surpresa e a descoberta. A diferença entre cada um desses resultados depende de tantos fatores. Tem histórias de quem experimentou e não voltou mais. Às vezes por encontrar um bom lugar para ancorar, às vezes por não aguentar as tempestades.

Histórias não faltam. Aquelas que falam dos monstros, das ameaças e das tormentas. Aquelas que falam de tudo de maravilhoso que pode se encontrar, da paz de espírito e da calmaria. Uma não anula a outra, o problema de acreditar numa história só é ignorar o que mais pode acontecer, pro bem ou pro mal.

Nunca quis acreditar nas histórias que falavam só de encantos. Dizia que eram histórias de pescador, contos sobre sereias… mas o melhor é se preparar para tormenta. Estive com o pé em terra firme. Por muito tempo, não deixei a água passar das canelas. Para quê se arriscar? As promessas de tesouros não convenciam a encarar os apuros possíveis.

Um dia tive uma companhia. Não me prometeu tesouros. Me ouviu quando falei que estava com medo. Estendeu a mão quando pedi ajuda. Por um instante não tive dúvida de entrar naquele mar. Lá, onde acabam as certezas, esqueci dos pavores, conheci reinos que não imaginava.

Ainda sofro com as marés que oscilam do pavor de me ferir à vontade de viver um sonho. Mas eu sei que em algum momento essa ressaca vai passar e vou saber me guiar pelos bons ventos.

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