Vida e morte de uma paixão (e se…)
Em meio à tristeza nasceu uma paixão proibida.
O ano? Início de 2019.
A circunstância? Falecimento de uma tia dela.
O local? Rio de Janeiro.
Idade dela: e isso importa? Por que a sociedade insiste em classificar as pessoas pela idade? Já reparou que em toda reportagem, este ‘’número mágico’’ aparece acompanhado de uma vírgula logo após o nome de quem se está falando? Não, não vou dizer a idade dela!
Idade dele: 19, quando se conheceram. Completaria 20, no mês seguinte. Sim, a dele eu lhes digo.
Ela mora em São Paulo.
Ele, no Rio de Janeiro.
Conheceram-se no meio deste turbilhão de morte e tristeza. Ela foi ao Rio para o enterro da tia.
- Este é o meu filho, Carlos Roberto!
Falou a prima adotiva. Não a que perdeu a mãe, esta voz é da primeira filha de uma outra tia, também já falecida, que havia viajado com seu marido e seu único filho ainda criança à Bolívia, e de lá, voltara com duas meninas adotadas, uma com mais idade que a outra.
- Prazer, Carlos Roberto, disse ela!
Não se sabe ao certo como uma paixão começa. E paixão tem hora? Uma paixão não se curva às dobras do tempo. Tem vontade própria. Simplesmente se instala no coração dos amantes e quando eles percebem já estão completamente dominados por ela.
Havia um cheiro de proibido no ar, que os amantes logo perceberam. E quem não percebe as grades da prisão em que a sociedade mantém as pessoas? Os pilares que gritam o certo e o errado a plenos pulmões. Ai, de quem se aventura a serrar as grades para escapar à prisão!
Estes, estão condenados pelas bocas maldosas…
No início eles viveram esta paixão longe do alcance de todos. Era tão natural para os dois…para eles não havia empecilhos, somente o êxtase de estarem juntos. E a praça, a praia à noite e até o supermercado se inebriavam com o calor dos beijos furtivos dos dois.
De madrugada, quando todos dormiam, iam meditar na varanda vigiados pelo Cristo Redentor, e os beijos e amassos rolavam soltos após a meditação. O que será que o Cristo pensava? Será que ele abençoava aquele sentimento tão puro, efusivo, em fogo, brasa que ardia por dentro e queimava os corpos por fora alimentando sussurros?
Não se amaram ali, mas bem que poderiam tê-lo feito. Aproveitaram a distração de um dia ainda permeado pelo luto, e fugiram para o apartamento onde ele morava com a mãe. Lá, os gritos roucos puderam ecoar libertos de qualquer preconceito, unindo-se às juras de amor dos dois enquanto o suor molhava seus corpos. Vamos namorar?
Mas todo amor proibido não escapa a um dia fatídico.
Foram descobertos!
E gritaram na cara dela a diferença de idade.
A mãe dele, a plenos pulmões, e os outros, aos cochichos e fofocas. Onde já se viu? Ele é um homem mais novo!
Sim, porque num mundo regido pelo masculino: ao homem tudo e a mulher que se atire aos leões para ser comida pelo pecado de querer se igualar a ele.
- Se ao menos a diferença fosse de vinte anos! Disse a mãe.
Vinte, trinta, quarenta, será que paixão pode ser medida em números?
Ele tentou argumentar: mas eu gosto dela!
Não se ouve um rapaz de vinte anos, para estas coisas ele não tem voz.
- Você não entende nada, bradou a mãe para o filho. E então olhou para a prima: não é você, é sua idade.
E no dia seguinte o mandou para a casa do irmão, para bem longe da prima.
Da fresta da janela do banheiro eles se despediram.
Os olhares se cruzaram pesados, o cheiro do preconceito pela diferença de idade se arrastava no ar.
Ela percebeu que havia se deixado ficar no olho do furacão ali, sozinha, sem ele. A notícia do romance dos dois correndo solta por todos os cantos onde havia familiares, risos e caras de deboche e espanto poderiam ser imaginados largamente pelos buracos das fechaduras de casas maldosas.
Decidiu ir embora!
Abraçou a prima: nunca quis magoar você, disse.
Voltou para São Paulo.
Namoraram pelo Insta ainda por dois meses e meio. Era o lugar secreto dos dois.
Até que um dia, do nada, ele resolveu terminar, deixando-a sem chão.
- Desculpe, não sou forte como você, ele escreveu.
‘Depois de mais de um ano, duas idas escondidas dela ao Rio para encontrá-lo e após bloquear as insistentes procuras dele, mesmo sendo ele a parte que terminou, ela pergunta à vida, à sociedade, ao leitor: e se eu fosse do gênero masculino, teria sido diferente?