Madron FC, o pior time do mundo

Pedro Turambar
Notas da arquibancada
3 min readOct 19, 2016

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Texto originalmente publicado no site Papo de Homem no dia 09/11/2012

Uma vez, eu li no PdH um texto do Fabio Bracht que falava sobre futebol, ou melhor, falava sobre torcer para um esporte como esse. Obviamente, é a visão de alguém que não gosta daquilo, mas, principalmente, é um olhar crítico, racional e analítico.

E, se você for racionalizar a coisa toda, futebol é meio doido mesmo.

Aliás, qualquer esporte pode ser ridicularizado se analisado friamente. Curling, por exemplo. Um bando de malucos varrendo gelo, tentando acertar um ferro de passar redondo, feito de granito, no outro, dentro de um círculo. Coisa de maluco.

O que o Bracht não levou em conta foi a paixão.

Um sentimento que não é nada racional, muito menos frio. E paixão, para mim, é uma motivação inconsequente que faz você continuar fazendo o que quer que seja. Não é passional o antônimo de racional?

Nick Hornby explicou com detalhes como era torcer para um time ridículo em jogos que poderiam facilmente ser usados como tortura em massa por algum ditador. A definição que ele dá é o que resume o futebol:

“O estado natural do torcedor de futebol é de amarga decepção, pouco importa qual seja o placar.”

Nessa mesma passagem do livro, ele fala em como ficou impressionado ao constatar o quanto as pessoas simplesmente odiavam tudo ali dentro do estádio. Detestavam tudo, o tempo todo. Mas todo jogo eles estavam lá. Que motivação maluca é essa?

Paixão. Ou burrice. Sinônimos, dizem uns.

Veja o exemplo do Madron Football Club. Eles quebraram o recorde de gols numa das trocentas divisões do futebol inglês. Recorde de gols sofridos, é bom deixar claro. Foram 227 em 11 jogos, incluindo uma derrota por 55×0. Acabei de ver um vídeo sobre o time. Um senhor simpático de bigode fala sobre o time, no início do vídeo. Ele acumula as funções de dono, gerente de futebol e técnico, entre outras, do pior time de futebol da Inglaterra.

Os caras inventaram o futebol, então, é algo a se considerar.

Uma das palavras que mais se repete no vídeo é “paixão”. Eles são apaixonados pela coisa. Não importa se são os piores. Não importa o resultado. “Outro dia, jogamos contra o melhor time do campeonato e perdemos de 5 a 3”, disse um deles, com orgulho.

Isso é mágico. Essa é a verdadeira essência da coisa.

Outra fala que chamou a minha atenção foi a de uma garota: “a paixão que eu vejo deles eu nunca vi em nenhum time da Premier League.” Premier League é a primeira divisão do poderoso futebol inglês.

Esqueça 100 mil pessoas num estádio, esqueça aqueles engomadinhos que estão ali para tirar foto e falar que foram na final da Champions League. Esqueça aquele seu amigo que viu o time ganhar a Libertadores. Lembre-se daqueles 467 que vão ver Atlético Goianiense e Sport numa quarta às dez da noite. Lembre-se daqueles caras que pegam um ônibus do interior de Minas até Santiago numa quinta chuvosa, lembre-se de você se perguntando se eles têm emprego e, se não tiverem, como diabos eles pagam a viagem e o ingresso?

O Atlético Mineiro — meu time — não ganha um campeonato importante desde 1971. E o melhor jogo que vi na minha vida foi uma derrota. De virada. Para o Cruzeiro. E o ano em que jogou a segunda divisão foi o ano em que eu mais fui ao estádio.

E eu nem morava em BH.

Quando o amargo e detestável vira doce e irracionalmente apaixonante, mesmo que por breves momentos, é extremamente viciante. É aquela segunda, terceira dose, que demoram meses. Mas que, quando chegam, são puro êxtase.

É loucura mesmo, Bracht. Pura e simples loucura.

Deliciosamente edificante durante segundos e extremamente dolorosa durante anos.

Conheça meu blog:

Este texto faz parte do meu livro Crônicas do Cotidiano, que você pode conhecer aqui.

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