Não confio em zagueiro bonito

Pedro Turambar
Notas da arquibancada
3 min readMar 13, 2018

No futebol, assim como em quase tudo na vida, as coisas evoluem. Alguns dizem que involuem, mas aí não vou julgar. As posições, por exemplo. Lateral já virou ala, meia já virou enganche, volante já virou meia de ligação e atacante já virou ponta de lado. Até goleiro antes de ser goleiro foi arqueiro. Que devia ficar lá no gol só esperando um mais baixinho vir correndo em direção ao gol pra sentar-lhe uma flechada nos cornos.

Só tem uma coisa que não muda. O beque. Não o de apertar, mas o de enfiar a bica pro mato. Zagueiro. Becão.

Não confio em zagueiro bonito. Quando chega algum no meu time, já vou logo sabendo que não vai sair coisa boa. Se for quarto zagueiro até pode ser mais ajeitadinho. Mas beque central não. Isso não pode. Um lugar onde reinou Aldair, Odvan, Clebão, Lúcio e o eterno Durval não pode ser ocupado por moleques de nome composto. Que me perdoem os Thiagos Silvas e os David Luizes.

Tem um zagueiro na seleção hoje que se chama Rodrigo Caio. Não me conformo.

Veja bem, o problema não é a pessoa — nem o futebol que ela joga, no caso ele. Até porque, a beque da nossa seleção feminina se chama Mônica. Nada intimida mais que uma Mônica, pode perguntar ao pessoal do Limoeiro. (E nenhuma tem nome composto). Voltando à questão. O problema é conceito. E futebol tem tudo a ver com conceito e contexto.

Zagueiro bonito é igual comida com nome estranho, tipo uma coisa de comer se chamar Tutu, que é coisa que você tira do nariz. Não pode.

Feiura é o ingrediente da alma do zagueiro. A posição, a função, a mística é toda calcada neste conceito. Se o Thiago Silva se chamasse Cleiton Felipe, ou Cleber Manoel, ele nunca sentaria naquela bola e choraria o tanto que chorou quando quase fomos eliminados pelo Chile (pelo Chile!!) na Copa. São nomes compostos, mas pelo menos são dois primeiros nomes. E dois primeiros nomes de zagueiro. Rodrigo e Caio nem nome de jogador é, pra começar. Quanto mais de zagueiro.

O maior exemplo de zagueiro zagueiro é o Puyol. Que mesmo depois de parar de jogar bola ainda é beque. Era capitão, líder e pai absoluto daqueles times inesquecíveis do Barcelona. O do Ronaldinho e o do Messi. Não deixava dancinha, não deixava briga. Sempre ia pelo caminho do futebol. Talvez o jogador com mais espírito de jogador que já houve, mas posso estar me exaltando aqui. Ah sim, e muito feio.

Há exceções, é claro. Cannavaro, talvez, a maior delas. Porque além de bonito era minúsculo, mesmo assim, um zagueiraço. Gigante. Mas só ficou bom mesmo depois de raspar a cabeça e parecer mais feinho. Seu sucessor — tanto no espírito quanto na qualidade — é feio que dói. E é o melhor zagueiro do mundo. Chiellini. Que aliás, forma a trinca de zaga que mais joga bola hoje em dia. Junto com Bonucci e Barzagli. Só nome de zagueiro. Esses dois últimos mais arrumados e por isso não tão bons quanto o primeiro.

Barzagli aliás é o que avança um pouco mais. Um pouco como o Edmilson da seleção do penta. Que era mais bonitinho, por isso jogava quase de volante.

Na época em que o Felipão ainda sabia das coisas.

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