O que você mais queria saber fazer?

Pedro Turambar
Notas da arquibancada
3 min readSep 28, 2016

--

Texto originalmente publicado no site Papo de Homem no dia 10/07/2012

Eu queria saber bater falta.

Sabe aquela que entra no limite da junção com a trave e o travessão? Sabe aquela que sobe como um foguete e cai que nem jaca? Aquela em que você dá uma sapatada e o goleiro nem vê? Então, eu queria saber bater falta. Eu queria ser aquele cara que, bastasse o juiz apitar uma falta da intermediária pra frente, a torcida começasse a vibrar, porque eles saberiam que, dali pra frente, era pênalti pra mim.

Eu queria saber bater falta.

Eu queria ser aquele cara que está no banco e que, na final empatada, aos 47 do segundo tempo, entra em campo para bater uma falta e fazer o gol do título.

Todo garoto nascido no Brasil teve como primeiro sonho de carreira ser jogador de futebol. Eu não. Eu queria só bater falta. Nunca fui de correr, toda a minha habilidade motora estava nas mãos — tanto que virei padeiro -, nem nunca fui muito inteligente para o futebol. Mas já nasci sabendo o que era uma folha seca, um peito de pé, uma trivela, como botar curva na bola. Não pense que eu queria ser um camisa 10 clássico, que lançava, passava bem, sabia cadenciar o jogo, a hora certa de correr a hora certa de parar. Não, eu queria mesmo era bater falta. Só isso.

O problema era que, além de não querer nem entender o que diabos é um 4–3–1–2, muito menos saber o que era impedimento, eu era horrível para bater falta. A verdade é que eu detestava futebol como um todo. Detesto até hoje, inclusive. Por que tanta emoção com 20 marmanjos tentando colocar uma bola dentro de um retângulo? Sendo que outros 2 ficam que nem babacas o tempo todo, mal encostando na coitada e, quando fazem, é só para dar-lhe uma porrada. Por que essa fascinação com um esporte que tinha tudo para dar errado?

A única coisa que eu sempre achei incrivelmente fantástica era a tal da falta. De repente, todos aqueles 20 ficavam parados, esperando. Um dos babacas ficava lá longe, enquanto o outro se preparava para estapear ou socar a tal da bola. Dos 20, um parecia entrar em transe. Parecia que o mundo inteiro ficava cinza. Parecia que o tempo parava pra ele. Ele só via a bola e o gol. Naquele momento, aquele Um era a pessoa mais importante do mundo. E eu sempre quis ser aquele cara. Eu sempre quis bater falta.

Mas nunca deixaram.

Porque eu detestava tudo mais no futebol. A falazada, a cartolada, a babação de ovo, a falácia, a murrinha, o tapetão e a câmera lenta. Se o futebol fosse só o momento. Só aquele momento em que nada mais importa. Seria a coisa mais fantástica do mundo.

Perdendo talvez para pastilha Valda.

Conheça meu blog:

Este texto faz parte do meu livro Crônicas do Cotidiano, que você pode conhecer aqui.

Não esquece do ❤ e de mostrar para os amigos. ;)

--

--