acordei sobrevoando o marrocos

Dride
Nova Heart
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3 min readMar 8, 2017

Ouvi dizer que das experiências que colocam nossa existência em perspectiva é que surgem as grandes epifanias.

Em 2011, com vinte e um anos, saí do país pela primeira vez. Num voo de 12 horas até Amsterdã, acordei com o sol raiando e o piloto, feliz, avisava que sobrevoávamos a costa da África e o tempo era bom; o painel das poltronas, luminoso, mostrava centenas de vezes o ponto do globo em que estávamos. De súbito, levei um choque: “nós, duas centenas de pessoas nesse avião enorme, na verdade, somos um mosquito insignificante sobrevoando a África”.

Cheguei ao meu destino — a Turquia — e me perdi em novidades por algum tempo. Na época eu tinha o que o sistema gosta de chamar de “a vida ganha”: morava no exterior, trabalhava na minha área de formação, num escritório confortável, quentinho, com gente legal que me preparava café e doces turcos e me enchia de presentes. Pagava o aluguel, fazia compras, comia e bebia bem. Por que eu sentia que alguma coisa estava errada?

o horizonte de Bursa, minha cidade turca, e suas deslumbrantes e hipnóticas montanhas

Aos poucos comecei a sentir os efeitos colaterais desse estilo de vida: a rotina, o almoço no mesmo horário, no mesmo lugar, as mesmas pessoas, o café com o mesmo gosto, o trabalho se tornando monótono e minha vida colocada em segundo plano; eu me sentia vivendo de fato apenas dois dias por semana (você deve imaginar quais). Viajei inúmeras vezes dentro do país e uma vez, diante das grandes montanhas cobertas de neve, a sensação apareceu de novo: sou um feijãozinho no universo, um grão de areia, mosquito.

Inquieta, lia, desenhava. Traçava mapas, fazia planos e muitos esquemas no papel, muitos emails, muito google: o que fazer quando você tem certeza que a vida não é só isso? Um ano antes havia topado com Chris Guillebeau, um autor norte-americano que prega uma vida a partir da arte do não-conformismo. Durante meses pensei, passei e repassei os ensinamentos do homem que queria conhecer os 193 países do mundo (hoje ele já conseguiu) e que defende que ninguém precisa viver do jeito que os outros esperam.

Diante das minhas montanhas de reflexão, a questão se amplificava: se minha existência é tão pequena, por que não estou vivendo ao máximo, do meu jeito, minhas regras? Quem estou querendo agradar? A quem preciso me justificar?

Me inspirei com Chris. Respirei. Pedi demissão. (OH MEU DEUS!) Voltei pro Brasil.

Minha formação em design me manteve perto e interessada em trabalho autoral, e visualizei um caminho no empreendedorismo pra ser dona de mim. A história é mais antiga: empreendi a primeira vez, meio sem querer, em 2007. Pela segunda vez, no meu momento pós-epifania, em 2012. Empreendi, errei, aprendi, empreendi: processo infinito. Empreender agora é, na verdade, um estilo de vida. Uma forma de viver do que gosto, contar minhas histórias e, através do design gráfico, ajudar mais gente a contar as suas próprias.

Assim acabo dizendo, toda vez que me perguntam, que empreender é uma forma de protagonizar a própria vida, e o importante é começar, e começar agora — mesmo que seja ao acordar de susto sobrevoando o Marrocos.

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Dride
Nova Heart

I’m on a journey. I’m a graphic designer & entrepreneur willing to co-create the future and cause positive impact through design.