O Que É Nulitânia?

Mandé Malé
Nulitania
Published in
3 min readJul 15, 2019

Estamos acostumados demais à jornada do Herói. Saímos de uma vida tranquila no vilarejo para uma jornada épica de autoconhecimento, aprimoramento conquista. Terminamos nossa estória como deuses, arquimagos, lendas. Esse é o roteiro de qualquer RPG das antigas. From Zero to Hero. Começamos famintos em um lugarejo no meio do nada. Terminamos barões de nono nível guiando tropas contra hordas de monstros. Ou num jogo mais moderno, começamos uma pessoa pouco mais talentosa que o comum — mas única, especial, customizada, destinada à grandeza. E parabéns, nós somos Os Vingadores agora. Salvadores do Mundo. Ou ao menos os protagonistas daquele Mangá Shonen onde se mata fácil um inimigo atrás do outro.

Nulitânia não é sobre ser um Herói. É, com sorte, sobre tornar-se um, e nem sempre. É um jogo de horror social. É sobre estar preso a um mundo que te odeia e condena pelo simples fato de você ter nascido. É sobre estar preso a um destino traçado e fugir desesperadamente dele. Não é sobre salvar o mundo. É sobre sobreviver.

Você é um habitante de um país pobre, pequeno, dominado por nações estrangeiras e terrivelmente explorado. A Nulitânia. É um país entrando em revolução industrial. Aqui você não é Especial. Você é um Nulitano. Um Nulo. Uma sub-raça endêmica desta pequena região, vista como a bastarda de todas as outras. Você não é Talentoso como um anão. Nem sagaz como um Goblin. Nem forte como um Troll, ou Inteligente como um Tardo. Você é apenas odiado pelo mundo. Destinado à servidão, escravidão, violação e genocídio — como todos os outros de sua raça. Você está na posição da não-pessoa. O Pária. O depositário de toda a crueldade deste mundo. Confortável nisto? Obvio que Não.

Esse é um mundo onde Elfos e Dragões voaram pelos céus com mágica e encanto — e foram mortos. Extintos até o último. É um mundo onde haviam heróis, santos-guerreiros, deuses presentes e atenciosos — e tudo isso sumiu. Você não os vê mais. Goblins gananciosos, e Anões melancólicos, Trolls ranzinzas, Gnolls e Ogros caminham pelo mundo te olhando de soslaio.

Porque explorar este mundo triste e cinza? Porque arriscar sua vida se aventurando em vielas sujas e nas sarjetas empoeiradas? Porque você não tem nada a perder. O Mundo te deu uma posição fodida. Um emprego ruim, uma família de 5 irmãos mais velhos, um quarto numa favela imunda, uma prateleira vazia, uma surra da polícia. Ok. Mas o mundo te deixou sem medo. E quando não se tem medo de perder nada, tudo se tem a ganhar.

Nulitânia é um OSR, ou assim se propõe. Sua profissão, atributos, aparência,e tudo o mais estão fora de seu controle. Você não os escolheu no jogo, bem como na vida real não escolheu seus pais, irmãos, país.

Mas a Nulitânia te oferece um caminho: O da aventura. Os Goblins tem medo daquela gruta. Você não. Os Anões não sabem o caminho para a velha biblioteca élfica. Você sabe. A Inquisição da Hegemonia Tárdica quer fechada aquela igreja. Você a quer aberta.

A margem das leis, aventureiros Nulitanos fazem o trabalho sujo e duro que as raças acomodadas e de boa vida não querem fazer. Abrindo o caminho com pólvora e baioneta, os Nulitanos enfrentam o mundo em busca de um lugar ao sol.

Na língua dos Tardos, Nanorianos e Goblinóides, Chamar alguém de Nulitano é até um insulto. Afinal, para todas as raças eles são não-pessoas, seres de vida descartável. Seres efêmeros e sem alma, sem valor diante dos deuses. Mas na sua própria língua mãe, Nulitano quer dizer outra coisa: Humano. E eles farão todos os outros serem lembrados disto.

--

--

Mandé Malé
Nulitania

Eu escrevo fantasia por que a realidade é ainda mais estranha do que a Ficção.