Narrativas homossexuais ganham novas formas em contos e livros

Confira três contos inéditos: Bochechas vermelhas, Piá polonês e Noite de Natal.

Lucas Panek
Não faz a frígida
6 min readNov 16, 2015

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Com o sucesso do livro Will & Will, de John Green e David Levithan, a procura por literatura com temática LGBTQ cresceu exponencialmente. Isso é tão verdade que as editoras brasileiras passaram a abrir as portas para publicações que focam em personagens homossexuais, transexuais, bisexuais ou queers.

A maioria dos títulos ainda são encontrados em inglês, apesar de a literatura brasileira clássica contar com algumas referências, como Bom Crioulo e O Ateneu. A imagem abaixo conta com algumas obras, desde romances, ficção, até auto ajuda.

As plataformas que agregam contos e fanfics também contaram com um aumento significativo, não só de fãs/leitores, como também de conteúdo voltado para esse segmento. O agregador de conteúdo do Spirit, por exemplo, conta com categorias exclusivas para fics e marcações para personagens homossexuais e transexuais.

Seguindo essa linha, o Não faz a Frígida inaugura uma sessão com contos semanais exclusivos. Abrindo a rodada com 3 histórias especiais sobre amor, sexo e descoberta:

Bochechas Vermelhas

Por Lucas Panek

_ Branquinho do rosto vermelho — Ele falou baixinho no meu ouvido enquanto dava mordidinhas na minha orelha.
Senti as maçãs do meu rosto ficando mais quentes e vermelhas.
-Pele de pêssego, ficou com vergonha? — Perguntou ele, com as mãos no meu rosto, olhando meus olhos.
Resolvi entrar na brincadeira:
-Você sabe o porquê desse calor todo.
Fazendo-se de desentendido, ele respondeu com aquele sorriso escondido no canto da boca:
-Não sei, não.
-É por causa do que você faz comigo.
Num suspiro, uma mão na nuca dele e os lábios se tocando, eu disse:
- Ou o seu corpo faz comigo.
Ele riu e me beijou com força. Afastei-me depois de algum tempo e perguntei:
-Então esse é seu ponto fraco? Bochechas vermelhas?
-É um deles. Disse-me, piscando.
-Quais são os outros?
Ele riu, inclinou a cabeça com aquele olhar safado e me disse:
-Beijinhos na barriga. Daí desce, desce e desce…

Piá Polonês

Por Lucas Carvalho

Era uma vez um piá polonês cujas covas da face eu, de fato, fitei.
Se tivesse eu tido bem mais sensatez, teria agarrado e beijado de vez!
Mas mesmo sem beijo, o menino levado me levou na conversa e me fez de freguês…
Tirou minhas fotos, em poses(!)… Sem pouso, eu quase fiquei.
Se liga muleke! Ou manda essas fotos ou as busco de uma vez!
Fim.

Noite de Natal

Por Maicky Oliveira

Era mais uma daquelas noites frias de Natal.

Não tão fria como as outras, mas, mesmo assim, fazia os dentes baterem uns contra os outros. A neve caía pouco, o que era bastante estranho. Gabriel terminava de colocar o shorts marrom e já calçava suas botas, olhando-se uma última vez no espelho antes de sorrir e suspirar fundo. Talvez devesse colocar uma calça, afinal, estaria frio. Era mais uma noite de Natal que passava longe de seus pais, assim como Rafael que, no momento, ao invés de se arrumar para ir junto na festa de seus amigos, preferiu se afundar mais e mais em meio aos seus travesseiros na sua cama exageradamente espaçosa. O moreno, mais velho, estava naquele desanimo já havia dias e Gabriel não tinha a menor ideia do que fazer, mas não seria por isso que ficaria deprimido em casa, afinal, era uma noite de festas e nada melhor que se reencontrar com os amigos — em uma festa à fantasia — para esquecer os problemas.

Colocou o gorro verde sobre a cabeça e riu, olou-se outra vez no espelho, se sentindo bizarro, afinal, estava vestido de duende, ou como preferia chamar, ajudante do Papai Noel. Rafael havia gargalhado quando ficou sabendo da fantasia do amigo e pediu fotos, muitas fotos, mas sabia que no fundo o menino escondia que também estava vestido de um jeito ridículo. Pegou a bolsa marrom de cima da cama e passou a única alça pela cabeça, deixando-a atravessada enquanto ia caminhando até o fim do corredor com os dentes pressionados sobre o lábio inferior.

Socou sem força três vezes a porta.

“Rafael, eu estou indo…” Abriu uma fresta da porta. “Vai ficar bem sozinho?”

O amigo não respondeu, apenas se mexeu na cama, virando para o outro lado.

“Hey, cara, não fique assim…” O garoto entrou no quarto, hesitando a cada passo, afinal, e se o amigo estivesse chorando? “Eu estou indo em uma festa. Você pode ir junto se quiser, vai fazer bem sair um pouco”.

E novamente, nenhuma resposta. Ficou levemente irritado por estar sendo ignorado daquele jeito, mas sabia que o outro tinha motivos, afinal, seria o terceiro natal que ele passaria longe das irmãs e da mãe, de quem ele tanto falava. Não queria vê-lo daquele jeito, não num dia como aquele. Não no natal, droga!

Suspirou pela segunda vez naquela noite e então fitou a grande janela sobre a cabeceira de sua cama, sabia a vista linda que aquele lugar proporcionava, mas, mesmo sabendo disso, Rafael a mantinha boa parte do dia fechada. Escancarou as cortinas e a noite estrelada caiu sobre seus olhos esmeralda. Sentou no lado da cama onde o amigo não ocupava. Sua mão automaticamente foi de encontro aos fios rebeldes dele, acariciando os enquanto sorria de forma boba. Droga, ele era tão lindo de costas, pensou. Se aproximou um pouco e, quando ficou perigosamente perto, Gabriel se virou. Se afastou assustado ao mesmo tempo que o mais velho afundava o rosto nos travesseiros novamente, abafando uma risada alta. Alta e gostosa.

Risada essa que coloria o dia e a vida de um certo duende.

“Você tá ridículo e sabe disso, né?”

“Pelo menos não sou eu quem vai passar o natal com a cara toda amassada.” Respondeu com um bico, logo se levantando e fitando seu próprio corpo. “O que há de errado?”

O moreno na cama fitou-o da cabeça aos pés, demorando alguns segundos a mais em suas coxas presas pelo tecido colado do shorts. Estranhou o ato do amigo, afinal, não era do feitio dele reparar em seu corpo então apenas ignorou. Repetiu sua pergunta e viu o piscar seguidas vezes.

“Você… Vai encontrar alguém em especial lá? Um Papai Noel, por acaso?”

“Como assim, Rafael?”

“É que… pra você estar vestido assim, achei que estava indo encontrar alguém.” Coçou a nuca e desviou o olhar até a porta.

“Ninguém em especial, é uma festa, muita coisa pode acontecer. Por isso eu disse pra você ir junto.”

Seu melhor amigo armou um bico — que, particularmente, não gostava de ver em seu rosto — e assentiu diversas vezes, deitando-se novamente.

Não… Seria possível ele estar interessado em um mero duende?

O Gabriel subiu novamente na cama e ficou fitando o moreno demoradamente, não, talvez aquilo só fosse preocupação que amigos tem uns com os outros. Talvez.

Então, Rafael coçou a barba por fazer enquanto seu olhar novamente caía sobre o corpo do mais novo. Só então percebeu como havia mentido para ele, já que Gabriel estava absurdamente sexy: o moletom verde de malha fina e mangas compridas ficava por baixo dos suspensórios vermelhos com detalhes brancos presos ao shorts marrom surrado que era afivelado por um cinto preto com a fivela quadrada e dourada, marcando sua cintura de um jeito que nunca vira antes. O mais novo não estava tão parecido assim com um duende, mas, quem se importa? O menino estava adorando-o assim.

Engatinhou sobre a cama até parar ao lado dele, sentando-se ali. O mais velho se ajeitou na cama e sorriu com a língua entre os dentes, ganhando um suspiro do pequeno duende.

“Eu menti.”

“O que?”

“Você não está ridículo.” O mais velho se aproximou de leve. “O velho Noel deve estar orgulhoso do seu ajudante, hein?”

Riu novamente, aquela risada gostosa.

“Você acha? Bem, ele me ensinou algumas coisas sobre rapazes mal criados.”

Logo o duende se aproximou ainda mais do amigo enquanto ainda o fitava nos olhos, profundamente. Uma de suas pernas passou para o outro lado da cintura do mais velho e não demorou em estar encaixado sobre ele. Não tinha muita ideia do que estava fazendo, afinal, era Gabriel, seu melhor amigo, que estava ali embaixo de si, porém, isso não importava, não quando a atração física chegava a ser palpável de tão grande. Ele havia percebido os olhos gulosos do outro sobre seu corpo e não era como se nunca tivesse olhado assim para o corpo definido e tão atraente dele, então estavam quites.

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