Aquela noite

Jéssica Suguyama
O Baú das Minhas Palavras
3 min readFeb 1, 2021

Depois de tanto tempo lá estávamos nós no mesmo carro de sempre porém tudo estava diferente. Os cachos dela estavam mais cumpridos, enquanto os meus raramente formavam cachos de tão curtos.

Eu dirigia sem música, pois a melhor melodia que eu poderia ouvir eram os risos dela. Confesso que talvez estivéssemos mais que felizes, pois pela primeira vez tudo parecia estar em seu devido lugar.

Havia um brilho indescritível que vinha daqueles pares, o que me fazia se sentir como aquele adolescente que a conheceu anos atrás, com direito a palpitações e frios na barriga .

— Da pra ver a felicidade estampada em seus olhos! — falei.

— Sério? — perguntou enquanto sorria.

Assenti respondendo-a — É bom te ver assim!

— Digo o mesmo, você está radiante — falou enquanto sorria com os olhos e continuou — Humberto, por um momento tudo era familiar, as pessoas, as conversas e brincadeiras, me senti em casa, obrigada por isso!

Estacionei o carro e então pude olhar para ela — Talvez essa seja a sua casa…

Um silêncio tomou o carro, não havia mais ruídos do motor, a vizinhança já dormia e o único som que se ouvia era das nossas respirações.

Os olhos diziam mais que qualquer voz, liam mais que palavras, eu a li, o momento foi eterno, minha vontade era imola-la em meus braços e dar todos os beijos que antes não pude dar, mas eu não sabia se podia.

— Eu sei que já é tarde… Que os seus planos não me incluem e os meus também não te incluem, mas aqui estamos nós, ambos sozinhos…

— O que você quer dizer?

— Acho que você sabe bem!

Seus olhos já não estavam mais nos meus, como se estivesse procurando ou até mesmo fugindo — Talvez isso tenha um significado, quem sabe? … Mas acho que deveríamos pensar nas consequências, não?

— Catarina, com o quê devemos nos preocupar? Quem se importa? — falei enquanto buscava a mão dela que estava fria e eu sabia bem o porque, então continuei — Não estou te pedindo para abandonar tudo e ficar, só estou te pedindo para olhar para o agora e se permitir.

Com os olhos marejados respondeu— De todas as coisas o que mais senti falta foi da sua voz… As vezes eu ouvia os seus áudios antigos na tentativa de aliviar essa agonia… Sabe, eu me permiti tantas vezes, mas você nunca parecia disposto.

— Eu tive medo, me arrependo muito pelas minhas faltas com você… Eu penso em você diariamente, sei que isso é consequência e por esse motivo eu não te peço para ficar…

— Então é um adeus?

— Não precisa se não quisermos!

— Então nós temos essa noite? — perguntou franzindo a testa.

— Temos, vamos fazê-la durar… Sei que encontraremos um caminho!

Permanecemos ali, era como se não existisse mais nada. A mão dela estava na minha, os olhos dela nos meus e, então nos encontramos através dos lábios e o corpo no corpo.

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Jéssica Suguyama
O Baú das Minhas Palavras

Uma paulistana de fabrica mineira, uai sô. Profª de Artes e escritora nas horas vagas.