Já deu tudo errado

O que começa engraçado, acaba desgraçado

Aryel Martins
O Centro
3 min readAug 1, 2017

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Conheço pessoas que sempre conviveram apenas com seus pares, apenas com seus iguais. Iguais de cor, de classe social, de orientação sexual, de nível de estudo, de gênero. Parando para pensar, você deve conhecer pessoas assim: não são raros de se encontrar, é bem comum, infelizmente.

Quase nunca tiveram contato com o diferente, não sendo padrão com o qual estão acostumados. E quando colocados de frente com situações e pessoas que não são do seu convívio habitual, os olhares já saem tortos, o estranho começa a incomodar. E, somados a todos os problemas da atual conjuntora de divisão de classes (carregados de históricos preconceitos), não é de se assustar que algumas pessoas tenham medo e não saibam lidar com o diferente. Seu semelhante, mas que não use as mesmas marcas de roupa ou não tenha a mesma cor de pele.

Os jovens que participaram do intervalo temático “Se nada der certo”, que ficou notório em todo o País, não inventaram aquelas “fantasias” de lugar nenhum. Apenas reproduziram a visão que o meio em que elas convivem já tem sobre o conceito de “dar errado na vida”. O “dar errado” para essas pessoas é ser pobre, ou simplesmente ter uma profissão que não dependa de um diploma do ensino superior.

Consegue perceber a sutileza? Nos lugares aos quais você frequenta, nas cifras em uma conta conta bancaria ou no número do seu CEP: você já é visto como diferente, e por vezes, menor ou maior que alguém.

E tudo isso tem inicio no convívio quase que exclusivo e vedado a pessoas exatamente iguais. Até ai, nada de novo. O problemas maior é quando uma escola (não interessando se é publica ou privada), essa específica do caso acima sendo cristã — diga-se de passagem — , permite que essas desigualdades sejam replicadas sem o menor constrangimento. Com direito a cobertura de um site de noticias para jovens estudantes (leia-se: coluna social de colégio particular)

Além da instrução básica, uma escola também tem como função a socialização de crianças e jovens: é o momento delas estarem em contato com outras pessoas que não sejam do seu vinculo familiar.

Frequentei escola pública todo o ensino básico, e graças as amizades que fiz, sempre convivi com todo o tipo de pessoa. Uma semana estava na festa gigante de quinze anos da menina rica filha de uma amiga da família. No outro final de semana, tomando vinho na rua com os punks que moravam em um prédio abandonado na cidade do lado — os quais conheci através de uns amigos da escola. Não que isso evite que eu não replique algum comportamento preconceituoso, essas desconstruções são bem mais complexas. Mas pelo menos sei que o mundo não é feito apenas de pessoas iguais a mim ou que o mundo deve ser moldar às minhas experiencias de vida.

Para aquela escola, foi apenas uma brincadeira, que começou engraçada para quem estava participando, mas que acabou bem mal para quem sofre preconceito pelo emprego que tem.

Que tipo de ambiente esses jovens mais abastados estão frequentando? Está sendo vendida uma irrealidade para eles, e vão do colégio direto para o ensino superior, o qual também é ocupado por pessoas que saíram dos mesmos colégios que eles, e assim por diante.

Ouvem coisas como “dar certo e dar errado” e “esses são de bem e esses não” em casa, e quando chegam na escola e na universidade vêem esse discurso reforçado. “Deve ser isso mesmo, só tem pessoas iguais a mim aqui, eu devo ser mesmo um pouco especial”

Se ninguém vê nenhum problema nisso, é por que já deu tudo errado mesmo.

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