O futuro do Brasil está escrito

Mateus Feld
O Centro
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5 min readJul 13, 2017

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Se você tiver entre 15 e 64 anos e, após ler este texto, conseguir entendê-lo, interpretá-lo, tirar alguma conclusão dele, opinar sobre o meu estilo de escrita e sobre meu posicionamento, e ainda conseguir explicá-lo para outra pessoa — incluindo suas opiniões e visões — , meus parabéns.

Você faz parte de, ao menos, 23% da população brasileira. Talvez, até, 8% dela (pra ter certeza, teríamos que incluir uma certa quantia de matemática e gráficos aqui nesse texto).

É isso aí. O Instituto Paulo Montenegro e a ONG Ação Educativa realizaram, em 2015, o estudo “INDICADOR DE ALFABETISMO FUNCIONAL — INAF: Estudo especial sobre alfabetismo e mundo do trabalho”, gerando também este release.

Não vou me aprofundar no estudo aqui, o link dele completo está aí em cima. Mas, em resumo, a pesquisa se utilizou de um índice chamado INAF (Indicador de Alfabetismo Funcional) e dividiu a alfabetização da população brasileira em 5 categorias: Analfabeto (4%), Rudimentar (23%), Elementar (42%), Intermediár!@io (23%) e Proficiente (8%).

Os dados mostram que 27% da população brasileira naquela faixa etária (entre 15 e 64 anos) é analfabeta funcional. Ou seja, mesmo sabendo ler, tem dificuldade em compreender e interpretar um texto simples. Esse número é formado pela população classificada como Analfabeta + Rudimentar. E é um número alto demais para um país como o Brasil.

Sempre fui da opinião de que a educação é a principal necessidade básica de um país. A educação cria uma base forte e resistente em uma criança, permitindo que ela vá mais longe no futuro. É o pilar da nação ordenada — com ela, vem saúde, segurança, crescimento e desenvolvimento. É preparar o terreno para um futuro próspero, garantindo a evolução.

Acontece que já sabemos que nosso ensino não é de qualidade: o Brasil vive uma crise de aprendizagem, e isso é preocupante demais. Além disso, nosso terreno é enorme: um quarto da população brasileira (45,9 milhões) é de pessoas de até 14 anos. O que serão dessas crianças no futuro? Será que 27% delas continuarão sendo analfabetas funcionais?

Apesar da importância e da vitalidade da educação didática — português, matemática, geografia, etc — não quero me limitar a ela. Existe uma necessidade do povo brasileiro de melhorar como indivíduo em meio à sociedade. Sempre falamos sobre como o brasileiro é caloroso, amistoso, prestativo e receptivo. Entretanto, isso me parece uma imagem tão… Falsa. Pra inglês ver, como diz o ditado.

O brasileiro tem se tornado um egoísta sem empatia. O brasileiro dá risada de quem se ferra, se esse outro for diferente dele. O brasileiro ocupa vaga para deficiente e justifica dizendo que “nesse horário também, vou fazer o quê?”. O brasileiro acha que pode gritar com o garçom ou sujar o banheiro “porque tô pagando, ué”, ou que ter que deixar a bolsa e o celular na caixinha de segurança pra passar na porta giratória do banco “é um absurdo, pois sou cliente dessa joça há 10 anos!”. O brasileiro faz declaração falsa pra ganhar ProUni mesmo tendo estudado em escola particular ou já feito uma faculdade antes.

Então… Vemos muito disso por aí. Foto: Luciano Oliveira

Tudo isso é falta de empatia, falta de educação, falta de ética e de senso de coletividade. Isso tudo pode e deveria ser aprendido e desenvolvido na escola. Porém, o plano de ensino e os professores devem acolher a atitude de desenvolver essas áreas. É preciso que a escola seja mais do que a educação didática. É necessário ir além, para que o ensino seja prazeroso e efetivo. É papel da escola semear o terreno.

As taxas de escolaridade no Brasil para pessoas de 6 a 14 anos são relativamente altas (em média de 98,6%, em 2015, segundo o IBGE), porém, escolaridade não quer dizer muita coisa — é apenas o primeiro passo. O que conta é o ensino, a educação, a evolução e o crescimento.

A você que é ou pretende tornar-se pai ou mãe:

Apesar de ser papel da escola semear o terreno, é vital a função dos pais nesse contexto. A criança vai ser influenciada pelo ambiente ao seu redor, em seu lar. É inevitável.

Em alguns casos, se ela tiver sorte, mesmo em um ambiente familiar que não incentive sua curiosidade, leitura, busca por conhecimento ou o que for, ela pode ser motivada por um professor maravilhoso que a cative, substituindo completamente o papel do incentivo dos pais, ou por um sistema de ensino realmente efetivo. Porém, sabemos que isso é raro.

Se você for pai/mãe de uma criança ou pretende se tornar um/uma em breve, por favor, não se esqueça disso:

A leitura é uma das ferramentas mais fortes para educar e instigar a curiosidade, a criatividade e desenvolver a empatia em uma criança.

  • Não importa se você não entende exatamente sobre o universo sobre o qual ela quer ler;
  • Não importa se você tiver que ficar duas horas com ela escolhendo o que ela quer ler;
  • Não importa se é cheio de ilustrações ou sem ilustração alguma;
  • Não importa se a linguagem parece ser “mais adulta” do que você acredita ser a capacidade da criança para ler e compreender;
  • Não importa que você não leia frequentemente e não saiba recomendar nada;
  • Não importa o quão caro seja — se a coisa estiver feia, lide com a criança: dê uma ideia de outro título mais em conta ou diga que se ela quer aquele, vai ter que trocar por outra coisa; faça um esforço para economizar de outro lado; ache uma maneira;

Mas nunca, NUNCA diga “não” quando seu filho lhe pedir um livro / gibi / HQ / mangá / o que for. Nunca deixe de alimentar esse prazer. Lembre-se: semeie o terreno. Eu garanto que vai valer a pena.

“Um livro é um sonho que você segura em suas mãos” — Neil Gaiman

Lembra do que falamos mais cedo sobre o brasileiro egoísta e apático? Pois é, não são poucos os estudos que mostram que a leitura melhora a empatia, nos torna mais humanos e sensíveis, reforça habilidades sociais e nos faz entender melhor o pensamento e o sentimento dos outros. Agora faça uma pesquisa rápida sobre os hábitos de leitura no Brasil. Não precisa ir longe, logo nos primeiros links você vai ver que 44% da população brasileira não lê e 30% nunca comprou um livro.

Fico preocupado com nosso futuro. Com que tipo de brasileiros estamos criando. Com os frutos que serão colhidos. Estamos aqui no Medium — uma plataforma para escrita e leitura — escrevendo à uma população que, em boa parte, não lê.

Mas o que podemos fazer? Ficar quietos, assistindo programas de auditório e trocando vídeos engraçados no WhatsApp? Não, não dá. Precisamos lembrar dos 66% que leem. Precisamos investir nesse número. Precisamos germinar a semente.

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Mateus Feld
O Centro

Fundador da adormecida publicação O Centro. Eventual escritor de contos curtos, curtos demais.