El Príncipe não acredita nos milicos

Como o chileno Charles Aránguiz tornou-se símbolo popular dentro e fora dos gramados

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O Contra-Ataque
5 min readJul 20, 2020

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Reprodução/Getty Images

Charles Mariano Aránguiz Sandoval nasceu dia 17 de abril de 1989 e cresceu comendo bola na población (como são chamadas as comunidades urbanas periféricas) de Villa Portales, na comuna de Puente Alto, extremo sul de Santiago de Chile.

Formou-se no clube Nueva Esperanza com muita ajuda de sua mãe Mariana Sandoval, que foi treinadora de futebol e viu dois, dos cinco filhos, jogarem pela Universidad do Chile.

Aránguiz foi um projeto de jogador que deu certo. Impulsionado pelas pessoas ao seu redor, deu os passos necessários para ser tornar um atleta inteligente e de alto rendimento.

Em sua carreira profissional jogou por Cobreloa, Cobresal, Colo-Colo, Quilmes, Universidad do Chile, Internacional e, atualmente, é jogador do Bayer Leverkusen.

Em sua terra natal, ficou conhecido como ‘El Príncipe’. Mais calado que a maioria de seus companheiros, sempre se destacou por ser extremamente focado e educado, reflexo de uma criação direcionada para a carreira.

Puente Alto é uma área periférica de Santiago, onde estão várias poblaciones, espelhos da desigualdade gritante da capital chilena. Nos últimos anos a comunidade sofreu ainda mais com episódios de violência policial intensa, principalmente na repressão a manifestações populares que se deram durante o estalo social que acontece desde outubro de 2018 no país.

Inserido nesse contexto, e apesar do silêncio de outros atletas chilenos como Arturo Vidal, Charles se pronunciou em entrevista à Rádio Cooperativa, dizendo que não acreditava nas declarações de Carabineros nem das Forças Armadas do Chile sobre as denúncias de saques e outros atos de vandalismo.

Sua fala se baseia no fato de que foram gravadas participações de agentes do Estado em saques de supermercados e também em incêndios de estações de metrô e outros edifícios.

Charles esclareceu que sua família e seus amigos estavam se manifestando e que, se estivesse no país, estaria nas ruas somando na luta:

“Ver tudo que acontece nas poblaciones é difícil. Vivi e vivo de perto. [Eles] têm todo o meu apoio (…) Todo o Chile se mobiliza e agora é quando mais precisam empurrar. Não podem retroceder e tem que seguir empurrando”

Reprodução/Twitter

Após sua fase juvenil pelo Nueva Esperanza, foi para o norte do país, aos 16 anos, atuar pelo Cobreloa na cidade de Calama, perto do Atacama. Longe da família, estreou profissionalmente e impressionou pela qualidade de seu futebol.

Em entrevista para o Mercúrio em 2006, foi considerado o projeto mais relevante do clube nortenho, que também revelou Alexis Sánchez, e, no auge de seus 17 anos, revelou a grande meta de sua carreira:

“Venho de uma población com poucos recursos e espero sair do país. Meu sonho é aos 20 anos estar jogando fora, o mais importante para mim é melhorar a condição de minha família”.

Aránguiz iria realizar seu sonho, mas antes deixaria suas pegadas pelo futebol chileno. Depois de ser destaque no norte do Chile, foi contratado pelo Colo-Colo, maior clube do país, onde foi titular e campeão do campeonato nacional no mesmo ano em que chegou (2009).

No mesmo ano, El Príncipe’ estreou pela seleção nacional, um dos passos mais marcantes para a realização de seu sonho. Desde então, não deixou de vestir o manto “de la Roja”, sendo determinante em vários momentos e ficando marcado como o jogador que guardou Messi no bolso na Copa América de 2015.

Apesar de estar no clube de maior exposição do Chile, Aránguiz partiu em 2010 para o Quilmes junto com o treinador Hugo Tocalli, o mesmo que o havia trazido para o Colo-Colo.

No ano seguinte, outro treinador foi definitivo para seu crescimento profissional: Jorge Sampaoli, que o levou de volta à sua terra natal.

Em 2011, comandando a Universidad do Chile, Sampaoli bateu o pé para trazer o volante ao clube santiaguino.

Foi quando Aránguiz brilhou os olhos de milhares de hinchas, sendo tri-campeão do campeonato nacional e campeão da Sul-Americana, um dos títulos mais marcantes para os ‘de La U’.

Ficou bons anos na Universidad do Chile, onde amadureceu seu futebol e adquiriu cada vez mais relevância dentro do futebol latino-americano.

Em janeiro de 2014, foi para o Internacional de Porto Alegre, último passo de sua internacionalização. Foi destaque pelo clube gaúcho e também pela seleção na Copa do Mundo, marcando um golaço contra a Espanha em pleno Maracanã.

O tapa enjoado reforça uma das primeiras falas que sua mãe faz no vídeo “História de Charles Aránguiz”:

“O que eu mais gosto do meu filho é o jeito como ele bate na bola”.

Bom, Mariana está coberta de razão. Veja este tapa:

Após uma passagem breve e genial pelo Inter, Aránguiz foi contratado pelo Bayern Leverkusen, mas sofreu uma lesão no tendão de aquiles logo nos primeiros meses de atuação na Alemanha. Apesar do impacto pessoal em sua vida, dispôs de um bom tratamento, e hoje atua com gala na Bundesliga.

Mesmo sendo mais introvertido, caladão, Charles representa toda uma população marginalizada no Chile. Durante o estalo social, sua imagem foi amplamente usada pela população, principalmente após suas declarações sobre carabineros e os militares. Foi até criada a Frente Patriótica Charles Mariano Aránguiz em sua homenagem.

Reprodução/Facebook

E para preencher os requisitos de representante do povo chileno, Aránguiz foi atacado pelo político da extrema-direita chilena, José Antonio Kast.

Sob a ótica fascista do candidato à presidência, foi acusado de envolvimento com narcotraficantes. Apesar da gravidade das falas, não foi tomada nenhuma providência legal.

Melhor Jogador da final da Copa Sul-Americana (2011)

Melhor Jogador da Copa Suruga Bank (2012)

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Bola de Prata ESPN Brasil e Placar (2014)

Melhor Volante da América (2011, 2012 e 2014)

Equipe ideal da Copa América (2016)

O texto faz parte da série “Los ricos de la pobreza”, aqui n’O Contra-Ataque, que conta a origem de jogadores latino-americanos.

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