Me acostumei a fingir primaveras

Mateus Lima
o doce pierrot
Published in
1 min readDec 31, 2017
Frozen Flower

Me acostumei a fingir primaveras por isso não percebi se aproximar severo nevoeiro. Somente os meus dedos, tão descobertos quando lúcidos, sentiram crescer a frieza dos dias lá fora.
[aqui dentro: a velha saudade pálida daquela época laranja e de pessoas ainda mais alaranjadas que de tão distantes já não mais aqueciam]
Não fossem meus dedos transando palavras, tentando poesia, receio que o resto de meu corpo congelaria, enquanto minha cabeça, coberta por fantasias, floria jardins. Brotavam tulipas, petúnias, margaridas e os mais diversos tipos de flores (bonitas, mas imaginárias) por cima da neve, do asfalto, do dedo cortado, da mentira descoberta, da lágrima contida, da outra que rolou, do desejo inconfesso, da decepção já esperada, da raiva silenciada e de um grito no meio da noite. Tão imerso em rosas nem para o sol abri a porta.
Um ano invernal imaginado primaveril chega, enfim, ao fim, anunciando a promessa de um outro que se mostra outonal como a esperança de ser folha madura que sabe dar a cada estação o seu tempo devido.

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