Shaw, Einstein e o mercado de TI: A “Síndrome do Impostor” e o Suco de Limão

Er Galvao Abbott
O ElePHPant do Chapéu Branco
3 min readSep 11, 2016

“Expert”, “Especialista”, “Mestre”, “Jedi”, “Ninja”…

Não é irônico que um mercado tenha criado tantas expressões para indicar o alto nível de conhecimento de seus profissionais e maioria destes profissionais tenha receio em adotá-las?

Se você trabalha há algum tempo no mercado de TI e especialmente se você decidiu se tornar instrutor, professor ou palestrante há boas chances de que você já tenha se sentido… bem, uma espécie de fraude.

É o que chamamos de “Síndrome do Impostor”: o sentimento de que você não é tão bom quanto as pessoas pensam; que você não deveria realmente estar ocupando aquele espaço na grade de programação de um evento, ou contribuindo na formação de outros profissionais: que existem pessoas muito melhor qualificadas do que você pra isso.

O que muita gente desconhece é que a “Síndrome do Impostor” é real: ela se chama “Efeito Dunning–Kruger”: O pré-conceito cognitivo que indivíduos de pouca habilidade têm de que seus talentos são muito superiores do que realmente são e, em um sentido oposto, que indíviduos de muita habilidade têm de que seus talentos não são bons o bastante.

A inspiração para o estudo que determinou a existência do Efeito Dunning–Kruger foi um ladrão de bancos chamado McArthur Wheeler: ele roubou dois bancos usando como único disfarce… suco de limão (sério).

McArthur sabia que suco de limão pode ser usado como tinta invisível, revelado apenas pelo calor. O que ele não possuía era o conhecimento de porque este efeito de tinta invisível funciona, ou como câmeras funcionam, e portanto simplesmente imaginou que o suco de limão tornaria seu rosto invisível para as câmeras de segurança.

O Efeito Dunning–Kruger nasce, no caso de indivíduos de pouca habilidade, de uma impressão errônea que a pessoa tem de si mesma: ao ter pouca proficiência e/ou conhecimento em uma atividade, a pessoa imagina que esta atividade é simples, fácil e que portanto não há muito mais a saber a respeito.
No caso de pessoas de muita habilidade ele nasce de uma impressão errônea que a pessoa tem dos outros: de que eles não considerarão o seu conhecimento tão bom, ou ainda que eles possuem o mesmo nível de conhecimento.

O fato é que quanto mais se conhece sobre um assunto, mais noção temos do quanto o assunto é complexo e vasto e portanto nos damos conta da dimensão de nossa ignorância.
No sentido contrário, ao conhecermos pouco sobre um tema, ignoramos a sua dimensão e portanto cremos que sabemos “tudo o que há para saber”.

George Bernard Shaw em certa ocasião criticou Albert Einstein, dizendo que “A Ciência está sempre errada: nunca resolve um problema sem criar outros dez”. Einstein não discordou: ele usou geometria para ilustrar como a ignorância cresce mais rapidamente do que o conhecimento, dizendo “Enquanto nosso círculo de conhecimento expande, também expande a circunferência de escuridão que o cerca. Aprender, estudar, lançar luz em um campo de pesquisa também revela o quão no escuro continuamos a estar”.

Um dos problemas que ainda existem em nosso mercado é a dificuldade em aceitar o erro. Do lado dos profissionais, é normalmente doloroso aceitar que erramos; sentimos que isso nos diminui, nos rebaixa. Na ótica do “público” a dificuldade não é menor: o público deseja alguém que os conduza pela mão, que o assegure de verdades absolutas e soluções facilmente implementáveis e reproduzíveis.

Precisamos aprender a lidar com nosso conhecimento e com a falta dele. Precisamos aprender a errar e principalmente aprender a admitir o erro e… aprender com ele.

Não somos “Experts”. Não somos “Especialistas”. Não somos “Mestres”, “Jedis” ou “Ninjas”. Somos profissionais. Somos estudiosos, eternos pesquisadores e como tal estatisticamente estaremos com muito mais frequência errados do que certos e existe beleza nisso: é assim que o processo de crescimento e amadurecimento ocorre.

Senhoras e Senhores Profissionais: errem mais, admitam mais, cresçam mais. Senhoras e Senhores do Público: tenham mais paciência conosco e por gentileza reduzam a altura de nossos pedestais.

Artigo originalmente publicado no Bússola, da CodeSquad.

Referências:

Dunning-Kruger Effect, Wikipedia;
What is the speed of dark? VSauce, a partir de 8'49";
The Dunning-Kruger Effect, Huffington Post.

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Er Galvao Abbott
O ElePHPant do Chapéu Branco

Brazilian programmer and web app security advisor; Zend Framework Evangelist.