A geração com muita informação e pouco conhecimento

Lucas Correa
O EXPRESSO
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6 min readJul 14, 2016

Eu sou um crente-confesso na capacidade de mudança da nossa geração (anos 90 pra frente). Acredito, de verdade, que temos um poder enorme e único em nossas mãos para repensar e reestruturar boa parte do modo como o mundo tem funcionado desde o surgimento das primeiras civilizações. Não há dúvidas que a fonte sustentadora desse poder chama-se INFORMAÇÕES. Essa coisa não só tomou conta de nossas vidas como distorceu diretamente a pirâmide do capitalismo cujo topo era comumente ocupado por bancos e empresas do setor automobilístico. Conforme as ciências da computação foram evoluindo, produziram as famigeradas TI’s (tecnologias da informação), que desde a metade do século passado vêm tomando cada vez mais espaço em nossas vidas e nas empresas. Não é a toa que, em Maio deste ano, a Forbes divulgou uma lista das 50 marcas mais valiosas do mundo em 2016 em que no Top 20 metade das empresas eram do setor de tecnologia, mesma proporção do Top 10. No Top 5, ocupam o 1º, 2º, 3º e 5º lugar, perdendo apenas o 4º para ninguém mais ninguém menos que a Coca-Cola.

Mas não é difícil perceber que, na verdade, a informação sempre foi importante à humanidade, relacionada intimamente com a obtenção de vantagens. Isso é visível no modo de vida dos nossos ancestrais, no mercado financeiro, mundo dos negócios, até numa simples viagem à casa de um amigo que mora longe. Quem tem mais informações e de melhor qualidade, poupa tempo, dinheiro e energia. Mas então por que só no século XXI dados e informação se transformaram na “menina dos olhos” dos grandes capitalistas? Além disso, se informações e dados sempre existiram e sempre foram importantes, porque só para nossa geração eles representam algum tipo de poder que as gerações anteriores jamais puderam desfrutar? Os famosos 3 V’s respondem essas perguntas: Volume, Velocidade e Variedade dos dados.

Nossa geração cresceu na era da informação. Um volume estratosférico de dados gerados a cada minuto, que chegam até nós, incessantemente, via pulsos elétricos, ondas eletromagnéticas, sinais óticos e de diversas outras maneiras, numa velocidade incrível. Com um esforço mínimo de um click ou um toque de dedo repassamos essas informações a qualquer pessoa dentre as 3.2 bilhões (43% do planeta) que possuem acesso à internet. Essa alta conectividade entre as pessoas, gerada pela internet, fez com que elas recebessem informações dos mais variados tipos, em diversos formatos, sobre infinitos assuntos. A flexibilização do processo de construção do conhecimento individual se expandiu, tornando-o um processo cada vez menos limitado pela região do mundo onde a pessoa nasce e cresce, e pela cultura que a cerca. Isso é, de certa forma, maravilhosamente libertador. Um fenômeno de globalização, como antigamente foi a construção de barcos e posteriormente aviões, o desenvolvimento das telecomunicações; ações que aproximam os cidadãos da Terra, fazendo-lhes sentir, cada vez mais, como partes integrantes de um todo, tripulantes do mesmo barco. Porém, será que estamos sabendo lidar com tudo isso? Com tantos dados e informações vindo de diversas fontes, com imensa variedade e numa velocidade que não nos dá tempo nem de respirar?

A experiência nos mostra que, de maneira geral, esses grandes empresários prezam muito pela saúde e pelo desenvolvimento de seus negócios. Mais do que prezam pela sua própria saúde na maioria das vezes e, provavelmente, mais do que você preza pela sua e pelo seu próprio desenvolvimento. Talvez por isso a resposta de Roberto (que representa neste texto os empresários com as características descritas acima) às perguntas que encerraram o último parágrafo tenha sido “Não! Não sabemos lidar com tantos dados assim. Precisamos urgentemente pensar em uma forma de utilizarmos essa quantidade exorbitante de dados variados a nosso favor.”. É por esse sentimento angustiante de Roberto que é muito provável que você já tenha ouvido falar em alguns termos como “Big Data”, “Business Intelligence” ou “BI” (lê-se “bi ai”), “Cientista de Dados” ou “Data Scientist”, “Mineração de Dados” ou “Data Mining”. Todos esses termos nasceram à partir do “problema”, que eu chamei no parágrafo anterior de “maravilhosamente libertador”, dos 3 V’s. As aspas são necessárias já que problemas quase sempre podem ser descobertos como soluções se analisados com mais criteriosidade e atenção, o que no caso do fenômeno dos 3 V’s é um fato. Se Roberto faz jus às suas características de capitalista bitolado, provavelmente conseguiu resolver a tempo seu problema eminente em lidar com uma quantidade tão grande e variada de dados, e hoje sorri de orelha a orelha ao ver um crescimento de 17,35% em seu faturamento anual. Caso contrário, Roberto talvez tenha batido na esposa, se divorciado, ou se tacado de uma ponte ao ver sua empresa ser lentamente massacrada pelos concorrentes até falir. O problema de Roberto é o seu problema, é o nosso problema, é o problema de toda uma geração, da nossa geração.

Você não precisa ser tão alucinado com sua vida como Roberto é com sua empresa, aliás, não recomendo nem um pouco. Não queira ser a pessoa mais inteligente de todas, com as melhores e mais confiáveis informações dentre as disponíveis, com o melhor discernimento sobre os mais variados assuntos, o mais vasto conhecimento histórico, uma referência de integridade ética e moral para o Homem. Não precisa sentir-se na obrigação de ser assim apenas porque você cresceu na era da informação. A vida não é um capitalismo selvagem ou o mundo dos negócios. Mas é recomendável que você, ou melhor, NÓS, filhos dessa era da informação onde temos acesso a quase tudo num piscar de olhos, sejamos disciplinados durante o processo de construção do nosso próprio conhecimento.

Eu vejo jovens criticando as mídias tradicionais, como jornais e canais de televisão, por sua tendenciosidade e manipulação dos fatos, e criticando também aqueles que utilizam essas mídias como fonte de conhecimento sobre o mundo, geralmente pessoas mais velhas que viveram numa época onde não havia alternativas. Esses mesmos jovens pegam seus celulares e se dispõem a buscar toda e qualquer informação que os apoie e corrobore com sua linha de pensamento, que lhes dê argumentos para defender suas próprias opiniões, sem sequer cogitarem a possibilidade de estarem errados ou simplesmente mal informados sobre o assunto, sem sequer verificarem a fonte e veracidade das informações que colhem. Veem seus pais, tios, avós e professores como marionetes do sistema, das imprensas tradicionais, enquanto eles mesmos dançam sob o comando de sua própria ignorância como titereira, através do mar turbulento de dados que é a internet. Às crianças do século XXI é mais importante ensinar e mostrar COMO se constrói conhecimento que querer construir por elas. Um jovem pré-vestibulando tem todo o conteúdo do vestibular na palma de sua mão, mas se ele não souber como se disciplinar e obter conhecimento de forma eficiente, será tudo inútil. Um aluno que é super interessado e adora estudar conseguirá adquirir uma quantidade absurdamente grande de conhecimento nas salas de aula, livros e internet, mas será um ser humano abominável se transformar todo esse conhecimento em arrogância, não souber manter uma discussão saudável de ideias divergentes, não souber ouvir o contraditório e não se dispor a realmente tentar entender aquilo que estão lhe dizendo.

Nossa geração tem um “problema” (com aspas) nas mãos. Cada um de nós, com nossos 17, 19, 23, 25 anos de idade, é um Roberto com uma decisão a fazer; buscar uma forma de transformar esse problema em solução e sair na frente de nós mesmos, ou se deixar levar pela maré do mar turbulento que é a internet, jogando fora a enorme oportunidade de sermos infinitamente mais úteis ao mundo do que nossos avós puderam ser, devido a esse privilégio que temos e que eles não tiveram a oportunidade de ter. Quando falamos de dados e informações, quantidade não é nada, velocidade é importante e qualidade é tudo. Nós temos a nossa disposição uma quantidade enorme de informações e que só cresce a cada segundo que passa. A velocidade que elas transitam é impressionante, por mais lenta que sua conexão banda larga possa ser. Agora, a qualidade das informações que você toma para si, que você utiliza para construir o alicerce de todo seu conhecimento, que fundamenta suas ações e tomadas de decisão na vida, que te orienta sobre o que vale a pena lutar e que definem boa parte de quem você é, essa parte é com você, está nas suas mãos garantir isso. Se ignorarmos essa responsabilidade, o privilégio da nossa geração se transformará num problema que nos engolirá por inteiro, seremos a geração mais inútil ao futuro que a humanidade já viu.

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Lucas Correa
O EXPRESSO

28 na contagem regressiva da vida, que corre enquanto eu pulo muros por aí e tento ser feliz descobrindo aos poucos sobre o que tudo isso se trata.