O Tempo não tem culpa pelas suas angústias
Hei uma das habilidades do bom-vivente: inibir o Tempo.
Esse réu de todas as acusações, cujas costas suportam todas as culpas do mundo. O mais inocente dos julgados, vítima da maior injustiça que cometemos com a vida.
O Tempo é o que é, ele passa, está limitado a sua origem, a sua função de apenas passar. Mas não é o que nos parece. Parece que ele age, e quase sempre contra nós. Mas a verdade é que nada tem a ver o Tempo com seu esquecimento displicente. Culpa nenhuma ele tem por você ter se esquecido de seus reais valores, de suas prioridades, de seus amores. Não é ele quem o fez esquecer de valorizar quem ama, esquecer de beijar seus filhos na cama toda noite antes de dormir. Não lhe fez esquecer das promessas de amor, do valor daqueles beijos e abraços, daquela companhia boa nas noites frias, daqueles olhos apaixonados. Ele tampouco é culpado por tua velhice de alma, por teu olhar ranzinza, pelo cinza que empobrece teu mundo. Sequer é culpado pela dor em suas costas, pela barriga crescida, por sua indisposição física.
O Tempo é como um trem que nos leva ao nosso futuro, ao nosso destino final comum, e o passageiro que reclama da desconfortabilidade dos assentos não aproveita a paisagem, não aproveita a passagem. O bom-vivente inibe o Tempo, não o permite agir contra ele. É corajoso em chamar a responsabilidade das mudanças para si, e compreende que lembrar dos nossos mais importantes valores, lembrar de demonstrar nosso sentimento às pessoas que amamos e lembrar, principalmente, de ser feliz, faz parte da complexidade infinita que há no viver do nosso dia a dia.
Lembre-se de contemplar a beleza de tudo que tem ao seu alcance, das coisas às pessoas (principalmente as pessoas). Lembre-se do que sempre foi, ainda é, e sempre será importante em sua vida. Zele pelo que for crucial para sua felicidade, seja responsável com as coisas que diz aos outros e a si mesmo. Estar bem e ser feliz exigem atenção, vigília! É preciso cultivar um olhar de acompanhamento sobre a própria consciência, rastreando seus rumos e desvios para que seja capaz de identificar claramente quando algo importante começar a lhe passar pelas frestas dos dedos, com os quais segura todo sentido de sua vida, e então agir para recuperá-lo. Lembre-se sempre que o Tempo passa, mas não desgraça. A responsabilidade das coisas que acontecem conosco é, quase sempre, exclusivamente nossa, quando não, é de outrem, mas nunca da abstração infinita da vida, tampouco da pacificidade, limitação e imparcialidade do Tempo.
Inibi-lo é ao mesmo tempo conquistá-lo, domá-lo, para que vocês coexistam harmoniosamente — o que não faz diferença pra ele mas fatalmente faz para você.
Inibi-lo é perdoá-lo, por sua função única de passar ter a inconveniente consequência de nos trazer nosso próprio fim, perdoá-lo e então tê-lo por amigo.
Inibi-lo não significa ter a juventude eterna, mas não permitir que os elementos vitais para nossa felicidade se desgastem, se percam ou se corrompam por sua movediça presença.
Texto com algumas modificações sobre sua versão original, escrita por mim em 14/05/2013.
Estejam à vontade para comentar sobre como se relacionam com esse verdadeiro deus chamado Tempo, vou adorar ler suas opiniões e histórias.