Evil Eye, uma boa ideia com uma execução ruim.

Marcel Silva Gervásio
The Halo
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4 min readNov 27, 2020

O Prime Video tem apostado em uma série de originais para atrair novos usuários e uma dessas tentativas veio no halloween desse ano através do chamado Welcome to Blumhouse, uma promessa de novos filmes de terror da produtora que tem sucessos como Corra e Nós, mas também lar de filmes como Truth or dare.

The Lie e Black Box estrearem na plataforma no dia seis de outubro, já Nocturne e Evil Eye chegaram no dia treze fechando essa primeira remessa de filmes em parceria com a produtora. Os filmes não tiveram uma boa recepção nem do público ou do da crítica e fato de nenhum dos filmes serem lidos como filmes de terror pode ser uma das causas.

Conectados pelos temas que giram em torno de questões familiares, todos os filmes tem pitadas do gênero, mas não o suficiente para serem categorizados como filmes de terror, no máximo um suspense aqui e um drama familiar com uma pitada sobrenatural ali, mesmo Nocturne que tem mais elementos do terror se torna decepcionante por não se aprofundar bem na paranoia da protagonista corroída pela inveja que tem pela irmã gêmea. Evil Eye por outro lado, me chamou atenção pela forma que tratou o seu tema principal.

Num primeiro momento o filme parece um embate de gerações em relação a um costume antiquado. Usha, personagem vivido por Sarita Choudhury (Mississippi Masala) parece obcecada em arranjar um marido para filha Pallu (Sunita Mani — Glow) de 29 anos que não parece preocupada com o assunto.

Mas quando Pallu conhece Sandeep (Omar Maskati — Better Call Saul) a preocupação de Usha muda de foco e ela passa a achar que o relacionamento dos dois está andando rápido demais e pior, Usha passa achar que um antigo namorado do passado voltou para assombrá-la.

A ideia de um relacionamento abusivo ser quase como uma maldição, uma marca que pode passar de mãe para filha se não existir um cuidado das duas partes para evitá-lo é interessante, o filme todo foca em como Usha passa a desconfiar das atitudes de Sandeep em relação a sua filha ao dar presentes caros, convencer Pallu a aceitar que ele pagasse o aluguel dela para ela se concentrar na carreira de escritora, tudo o que num primeiro momento pode parecer inocente, passar despercebido por uns e almejado por outros, para Usha tem um significado diferente por ela ter passado por um relacionamento como aquele.

A produção dirigida pelos irmãos Dassani decepciona quem procura um filme de terror, o roteiro peca em não explorar mais a parte da paranoia da mãe ou dar em dar detalhes menos sutis da vida de Sandeep para corroborar as suspeitas da mãe, acho que isso se dá muito ao fato do o filme ser uma adaptação de um Audible de sucesso escrito por Madhuri Shekar que também é a responsável pelo roteiro do filme.

O audiodrama foi feito no formato de telefonemas e mensagens de voz que o filme incorpora, mas não vai muito além, talvez pelo orçamento curto ele não explora muitas cenas externas, é quase que irrelevante saber que Pallu está em Nova Orleans, já que não há nada que caracterize o lugar nas cenas.

Essa tentativa em se manter fiel ao material original contribui para construção de cenas fracas, além do grande problema com elipses que esse filme tem, é muito difícil perceber a mudança de tempo que por algum motivo os diretores preferiram colocá-la na boca dos personagens do que mostrar visualmente e isso atrapalha a experiência.

Precisei parar em alguns momentos para ter certeza de que tanto tempo havia passado, se passa um, dois meses durante o filme e não existe nenhuma marcação visual disso, o que contribuiu para achar o relacionamento de Pallu e Sandeep um pouco forçado demais se aliando a trilha sonora parece intrusa e meio dissonante não ajuda muito, algumas músicas românticas tocam em cenas onde o intuito não é exatamente esse.

A personalidade de Sandeep é uma dessas mudanças que não faz muito sentido, no audiodrama ele é um pouco mais filho da mãe que no filme, talvez para criar a imagem de falso príncipe encantado e aumentar a surpresa do terceiro ato, mas isso acabou prejudicando a cena que deveria ter maior impacto no filme.

Quando Usha vai para os EUA atrás da filha a situação montada no audiodrama cria uma tensão maior que no filme e durante o jantar entre os três, o que acaba entregando Sandeep é o seu comportamento. Já no filme, mesmo com essas dicas um pouco mais sutis, Pallu só fica confusa quando um objeto entra em cena o que para mim diminui o impacto. Mesmo com o Sandeep sendo a reencarnação do ex da Usha não existia motivos para reação dele, seria mais esperto continuar fingindo.

E por fim, a frase que é repetida durante todo o filme acaba perdendo todo o sentindo quando eles trocam a arma de fogo por uma faca, perdeu toda adrenalina que a cena teria se isso tivesse sido conservado.

Mesmo com todos esses defeitos, e olhando bem para o filme, Evil Eye acaba tendo um teor mais interessante que os outros filmes da Tetralogia Welcome to Blumhouse. Black Box não passa de uma tentativa de replicar o sucesso de Corra, The Lie é quase um filme bom, mas falha em criar elementos de suspense assim como Nocturne.

Evil Eye por outro lado apresenta uma família e a cultura indiana fora dos moldes estereotipados que estamos acostumados e ainda que a execução cause bastante interferência ao passar essa mensagem para o público, foi o único dos quatro que eu continuei pensando depois de assistir ao filme e prestei mais atenção na mensagem do que nos erros.

Com um roteiro mais forte e uma direção mais criativa seria um filme incrível, mas os 4,7 na avaliação do IMDB são bem justos olhando para o conjunto da obra.

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Marcel Silva Gervásio
The Halo

A Brazilian guy trying to be a good writer (Escritor em formação).