Os laços familiares em Uncle Frank.

Marcel Silva Gervásio
The Halo
Published in
4 min readDec 22, 2020

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Ao se mudar para Nova York onde seu tio é professor universitário, Beth acaba conhecendo uma parte da vida de Frank que até então era desconhecida para o restante da família. Ainda se acostumando com a novidade os dois precisam pegar a estrada e voltar para Creekville onde um episódio trágico do passado de Frank o espera.

Estrelado por Paul Bettany (Vingadores: Guerra Infinita) e Sophia Lillis (I Am Not Okay With This), o filme é dirigido, escrito e coproduzido por Alan Ball, ganhador do Oscar de melhor roteiro por Beleza Americana. O filme é um pouco dramédia, um pouco Road movie, conseguindo trabalhar temas que o fariam ser uma história sombria sobre traumas e vícios, mas que são traduzidos na tela de forma delicada, transformando Uncle Frank num dos meus filmes favoritos de 2020.

Caso você seja um desavisado Spoilerfóbico saiba que vamos ter muitos spoilers a partir daqui.

A parte técnica de Uncle Frank se destaca, mesmo não sendo o meu forte, alguns setores chamaram minha atenção nesse filme. O som ambiente por exemplo, ele é onipresente a partir do segundo ato quando o filme se desdobra num mini Road Movie.

Seja o som dos insetos ou os ventos contra as árvores, o som se faz presente, quase como invadindo e tomando a atenção do espectador para si. Quando assisti o filme pela primeira vez e comecei a esboçar um rascunho para esse texto percebi o quão isso foi importante para me prender na história, sendo tão importante quanto os figurinos ou os cenários na construção da cidadezinha do interior.

O filme acerta bastante ao introduzir os traumas de Frank aos poucos. Primeiro descobrimos que ele é alcoólico ainda na festa enquanto Beth tem seu primeiro porre, instantes antes de descobrir que o tio é gay. já na estrada vemos como ele reage de forma estranha quando a sobrinha pergunta sobre quando ele ficou com um homem pela primeira vez e só depois fica mais o porquê dele ter desenvolvido o vício.

Como alguém que assistiu ao filme umas quatro vezes no mínimo e está disposto a assistir mais uma vez, posso dizer que o roteiro é bem direto em como lida com a história, nenhuma cena está ali de forma gratuita, elas sempre apresentam algo sobre os personagens, ainda que num primeiro momento algumas nuances possam passar despercebidas. Ou ainda, são cenas que servem para o personagem se desenvolver e ganhar camadas.

Nesse aspecto apenas a forma como a cena na oficina mecânica pode fugir um pouco da organicidade construída até aquele momento, o que não chega a incomodar e é bem engraçada, mas achei que deveria pontuar.

Ainda falando em roteiro, Alan Ball fez um bom trabalho ao conseguir trabalhar bem os temas que o filme aborda. O vício de Frank não é romantizado e tão pouco é abordado como uma cruz que o personagem carrega.

Mesmo estando tanto tempo sóbrio, o passado e mais importante, a sombra do pai joga Frank de volta ao vício, quando vi pela primeira vez já esperava as clássicas cenas do personagem que tem problemas com álcool fazendo um escândalo no funeral do pai que ele odiava. E o personagem tinha boas razões para fazer isso.

No entanto, Uncle Frank foge desse clichê e mostra o professor descolado da família na reunião do funeral, surpreso ao ouvir que a figura que sempre o machucou era o melhor amigo do irmão, deixando nas mãos de Wally e Beth lidarem com a questão do vício de Frank.

Beth tem um arco menor, mas bem demarcado durante todo o filme, vemos desde o início como a relação com o tio é importante para ela e como isso molda a mulher que ele se torna. Coisa que ela pontua num diálogo com o tio quando precisa ajudá-lo.

O que me faz voltar a hilária cena da oficina. Ver Beth acabando com o mecânico é bem cômico, e como eu havia dito antes, pode incomodar os chatos de plantão que amam reclamar de lacração em filmes. Não tem como negar que a cena só tem essa função, mas para mim ela não atrapalha o tom da história.

Os flashbacks por outro lado se unem tanto à questão do vício de Frank quanto a sua péssima relação com o pai, dando a medida certa de drama para o filme. Uncle Frank não esconde como uma relação tóxica entre pais e filhos pode ter fins trágicos.

Ainda que seja difícil encontrar qualquer filme no streaming horroroso da Amazon, Uncle Frank é uma boa pedida para sessão da tarde nessas férias. O filme é leve, ainda que tenha sua carga dramática e trate de temas espinhosos, mas que nos emociona ao mostrar que apesar de todos os pesares sempre poderemos contar com nossas famílias, sejam as sanguíneas ou as que escolhemos conforme avançamos pela vida.

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Marcel Silva Gervásio
The Halo

A Brazilian guy trying to be a good writer (Escritor em formação).