Por que a arte se tornou “feia”?

E mais: a arte precisa ser sempre “bonita"?

Bruno A.
o mundo precisa saber
3 min readAug 25, 2024

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Photo by Brian Lundquist on Unsplash

Muito se pergunta sobre os porquês da arte ter se “enfeiado” através dos tempos.

Este é mais um dos temas em disputa entre conservadores e progressistas, onde os primeiros dirão que este é um resultado de um mundo que, por ter se afastado de Deus, também se afastou do belo, enquanto os segundos dirão que é necessário desconstruir um padrão eurocêntrico de beleza.

Há verdades e mentiras nas duas visões apresentadas, e até podemos tratar isso de maneira mais profunda em outro texto, mas eu quero ir em um ponto ainda mais fundamental: a arte precisa ser bonita?

Existem outros argumentos sobre o assunto. O que estou escrevendo aqui não tem a intenção de ser a verdade absoluta. Quero partir de uma definição de arte que em muito me convence.

Pasquale Bona (1816–78) foi um compositor e teórico musical italiano, e no seu método de solfejo, comum em escolas de música, uma frase sempre me pegou.

“Música é a arte de manifestar os diversos afetos da nossa alma mediante o som.” — Pasquale Bona

Vamos dissecar essa frase.

Segundo ela, entendemos que música é arte, e que a arte é uma forma de manifestar os afetos da alma. Segundo esse pensamento, poderíamos tomar a liberdade poética de, por exemplo, dizer que a “literatura é a arte de manifestar os diversos afetos da nossa alma mediante as palavras”, ou que as “artes plásticas são a arte de manifestar os diversos afetos da nossa alma mediante as cores e formas”.

E podemos, também, focar no “manifesto da alma”: de louvor, alegria, amor até mesmo raiva, revolta, ódio, passando por ansiedade, depressão, apatia, conformismo. Os “afetos” possíveis são infinitos.

Logo, podemos utilizar uma forma de arte qualquer para manifestar um afeto qualquer mediante a um estímulo sensorial qualquer.

Só que, como citamos nos parágrafos anteriores, nem todos os afetos da nossa alma remetem à beleza. Uma canção de amor pode ser bela (sem entrar nos pormenores do que é considerado “belo” em cada cultura). Mas, uma música de protesto?

Pense, por exemplo, no punk rock. Um gênero musical que é uma expressão de afeto de um movimento cultural forjado no sentimento de revolta. A cultura punk demonstra um inconformismo com a sociedade. Logo, como podemos exigir uma música bela e simétrica de quem está sensível demais à assimetria deste mundo?

Nós poderíamos argumentar que esta é a consequência de um mundo caído, e que cristãos também estão inconformados com o mundo, mas procuram expressar isso em forma de um louvor que testemunha de um Deus que nos salvará. Mas este é o argumento errado, pois fala muito mais sobre nós — cristãos — do que sobre eles.

O punk está revoltado. E não tem como eles expressarem afetos de fé e esperança, pois eles em nada crêem, portanto, em nada esperam. Sendo assim, isso justifica sua expressão artística.

Seus riffles e solos são “sujos”, dissonantes, mal esculpidos. Este é o código pelo qual eles expressam seus afetos de revolta.

É diferente, por exemplo, de uma bossa nova, que expressa o sentimento de contemplação. A poesia é mais bem cuidada, as palavras são mais bem escolhidas, os acordes, mais bem esculpidos. Soa gostoso aos ouvidos.

Assim, podemos voltar às perguntas que motivaram esse texto.

A arte precisa ser bonita? Penso que não, pois se a arte é manifesto da alma, então se sua alma não está manifestando algo “bonito”, como sua arte será bonita?

E, por que a arte está se tornando feia? Talvez seja apenas um clamor de uma humanidade desesperada e inconformada com os rumos do mundo.

Para terminar esse texto com uma provocação, será que, como cristãos, não caberia a nós, antes de julgar a “feiúra artística" de um certo grupo, procurar compreender os afetos deste grupo e os clamores que estão por trás disso?

É um exercício de escuta ativa. De empatia, esse pecado terrível.

Este texto pertence à seção Areopagus, que é o nosso mix entre cristianismo e cultura pop. Gostou? Tem mais aqui. Aproveite!

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