Syriza é esquerda, mas não tanto quanto andam dizendo por aí
Existe esquerda além do partido de Alexis Tsipras
O ocidente inteiro acompanhou as eleições gregas do dia 25 de fevereiro, a ampla vantagem que o partido de esquerda Syriza, do candidato Alexis Tsipras, apresentava nas pesquisas, foi confirmada nas urnas. A mídia logo tratou de apelidar o partido de “extrema-esquerda”¹ ou “esquerda radical”², o mesmo tipo de fenômeno que aconteceu com o PT e que hoje comprova-se que de extremo e radical não tem nada, apesar de ainda muita gente contraditoriamente acreditar neste rótulo.
O primeiro indício de que o Syriza não é tão radical assim foi o fato de o partido comunista grego (KKE) criticar o conservadorismo de suas propostas, dizendo que apesar da vitória, os “memorandos de resgate continuarão”³. Outro partido que fez uma dura avaliação foi o brasileiro PCO (Partido da Causa Operária), afirmando que o partido grego é um “grupo pequeno-burguês pró-imperialista”⁴.
Se para a mídia o Syriza é extrema-esquerda, então como classificar o KKE, por exemplo? A principal crítica recebida pelo partido vencedor, é que não há uma posição firme que garanta a saída da Grécia da União Europeia e rompimento com a OTAN, pelo contrário, a intenção parece ser a de permanência. O KKE diz que Alexis Tsipras “não é a preferência da oligarquia, porém é a nova socialdemocracia, útil para o sistema”⁵.
Aliança com a direita
Um fato interessante, e que também coloca à prova o suposto radicalismo, é que o Syriza não conquistou maioria absoluta no Parlamento (por duas cadeiras) e formou sua coalizão justamente com um partido de direita nacionalista, o Gregos Independentes⁶. Este partido defende uma forte lei anti-imigração, é contra o multiculturalismo, e além disso defende um sistema de educação orientado para o cristianismo ortodoxo⁷. O fato de Tsipras buscar o apoio primeiramente da direita e só depois procurar a esquerda, deixa dúvidas quanto o “quão à esquerda” o Syriza está. O único ponto comum entre os dois partidos é que ambos são anti-austeridade e contra a troika, a comissão composta por membros do FMI, Banco Central Europeu e Comissão Européia, que interferiram na economia grega e impuseram uma série de medidas de austeridade à serem tomadas como condição para que o país fosse resgatado.
Do lado dos apoiadores temos o recém-formado partido espanhol, o Podemos, e no Brasil o PSOL. Eles apostam no rompimento com a troika: o discurso inicial de Tsipras é primeiramente tentar uma renegociação, porém já é sabido que os líderes europeus não abrem mão das medidas. A sua postura anti-troika é tido como principal motivo de sua vitória, sendo este um desejo dos gregos, que viram o desemprego aumentar assustadoramente nos últimos anos: cerca de 26% foi a taxa de desemprego em 2014, entre os jovens o valor sobe para 50%⁸.
Estancando o crescimento do neonazismo
Alexis Tsipras ainda irá se reunir com os representantes dos demais partidos, afinal irá precisar, principalmente por ainda ser alto a votação do — e aqui cabe chamar de extrema-direita — Aurora Dourada, partido nazi-fascista⁹ que ficou na terceira posição, porém terá 17 cadeiras assim como o quarto colocado, o To Potami (que pode se aliar ao Syriza). O comunista KKE terá 15 cadeiras, e o PASOK contará com 13, mesmo número do Gregos Independentes. A oposição ficará por conta do partido derrotado, a Nova Democracia, que conquistou apenas 76 cadeiras contra as 149 do Syriza.
De 2012 pra cá, o Aurora Dourada, que tinha 21 cadeiras, viu sua bancada diminuir para 17, e se a esquerda for bem-sucedida, pode enterrar de vez os ideais neonazistas do partido, que ganhou espaço com a crise.
Concluindo
Em suma, rotular o Syriza de extrema-esquerda, é ter uma visão preguiçosa e reducionista. E claro, o uso das palavras “extremo” e “radical”, em tempos de “extremistas” cometendo atentados terroristas na França e de “radicais” decapitando reféns na Síria, tem uma intenção implícita proposital.
A vitória de Tsipras nestas eleições sem dúvidas pode trazer mudanças significativas na forma como a Grécia conduz sua política econômica, além de dar força e esperança para partidos de esquerda na Europa. A pressão das forças que trabalham contra governos com viés socialista irá agir, mas o povo grego decidiu e, no berço da democracia, prevalecerá sua vontade.