Entre o passado e o futuro

Como dizer adeus ao que mora em ti?

Edgar Dourado
O sexo e a cidade
4 min readAug 24, 2023

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Sex and The City foi e é meu guru espiritual. Carrie Bradshaw (sim, a personagem fictícia) seja talvez entre Carlos e Clarices, quem me deu o direcionamento para seguir na escrita. Imagina ser redator ou colunista e falar de um tema universal: O Amor.

Estou solteiro novamente e o término me foi doloroso. Terminamos até então na paz, tranquilidade; e isso foi o que mais me inquietou. É difícil ver a pessoa que você ama e arquitetou uma vida toda ao lado ir embora. Percebi que dentre o sentimento da perda, o que mais me pegou foi a calmaria do término. É muito mais fácil você deixar alguém ir quando você causou ou sofreu uma catástrofe, quando tem raiva envolvida.

Lembro que no Oscar de 2017 eu disse a minha mãe que não fiquei feliz com a vitória da Viola Davis por “Fences”, argumentei que preferiria a Naomie Harris por “Moonlight”. Minha mãe entendia meu ponto, mas ela me disse que a Naomie carregava raiva e angústia, a Viola trazia o perdão, e na vida real é muito mais difícil perdoar do que sentir raiva.

Quando se termina um laço humano; é muito mais difícil perceber o fim do que quando ocorre uma ruptura. É igual ao luto. E é estranho.

Talvez seja por isso que coloquei “a pessoa que você ama” e não “a pessoa que você amou”; porque eu ainda o amo. Talvez não mais da forma romântica e tradicional, mas o amo. Amo porque o tempo em que fomos juntos, eu fui feliz; amo porque quero o ver realizar seus sonhos e objetivos; amo porque, pelo bem ou pelo mal, ele levou uma parte de meu coração com ele.

Não confundam as coisas; não é porque existe o amor e porque o término foi amigável que está tudo bem. Não está. E mesmo com voltas ou não, nunca estará. A verdade é que ele me machucou muito. A verdade que me dói é que eu talvez tenha o machucado mais ainda.

Essas feridas são tópico para outro texto e outras dissertações ( o lado bom de um coração partido é que a dor se torna combustível para a arte); ou talvez eu aprenda a respeitar os meus segredos e o dos outros. Todavia, é importante sustentar o “não estará tudo bem” da oração. Existem certas feridas que não se fecham nunca, e cabe a você a escolha de conviver com quem te feriu ou não.

Certa madrugada, voltando de uma festa, mandei mensagem para um amigo falando que eu não sabia que sentiria tanta saudade de ser cobiçado por outras pessoas e não sentir culpa por isso.
Vejam bem, eu não sofria um relacionamento abusivo e nem era podado, longe disso. Acontece que, voluntariamente ou inconscientemente, quando temos uma relação com terceiros, abrimos certas concessões do nosso próprio ser. Nada vem de graça, nem o pão nem a cachaça. Isso também é uma ferida. É sobre isso que temos que lidar.

Hoje conversei com uma amiga que também passou por um término, que sim, a sua ex era uma escrota; mas ela também foi. Eu percebi essa relação comigo quando uma amiga do casal me disse “não tem um certo ou errado ai, só tem vivências em prismas diferentes”. Eu volto áquela questão do magoei e fui magoado.

Hoje eu peço perdão para todas as pessoas em que eu vilanizei; assim como espero o pedido de perdão daqueles que me vilanizaram. Da mesma forma que eu amo e cultivo o amor por todos aqueles que passaram em minha vida.

Sustentarei um adendo aqui: A mágoa é tolerável quando não passa para o nível da agressão. Eu passei por dois abusadores e não há terapia ou perdão no mundo que me faça ter qualquer resquício de sentimentalidade ou humanidade para tal. O mesmo vale para as pessoas que apoiaram meus agressores ( que indiretamente, também me agrediram).

Dito isso, é engraçado ver o prisma da vida e entender que somos todos não binários no plano de conjunção social. Não há um certo ou errado, um vilão ou mocinho. Há pessoas humanas e sentimentais que funcionam de maneira única e específica de acordo com tantas situações.

No capítulo final da segunda temporada de “And Just Like That”, Miranda perde perdão a Steve e diz que agradece pelo passado, mas que não quer ser excluída de seu futuro, mesmo sendo a ex. Eu também não quero ser excluído de um vínculo social, ao mesmo tempo que percebo que excluí outras tantas pessoas. Quando se sai do posto de vítima e se coloca no papel do humano, isso dói muito né?!

Acho o cúmulo do clichê, so que usarei aqui nesse momento. Minha psicóloga me pediu para não falar mais a frase “assumi minha culpa” e sim trocar por “assumi ou falhei com minhas responsabilidades”. Culpa te prende e te coloca em um estado de negação e inércia. Responsabilidade fere igualmente, só que te ajuda a prosseguir o translado.

Para prosseguir com meu futuro, preciso abraçar e entender o passado. Fui acusado de mentir para o homem que eu amo, decidi que não mentirei nunca mais para ninguém. A mentira se devia ao fato de eu engolir meus sentimentos; hoje eu irei os expurgar. Que minha linha para o finito seja ténue e sincera; que meu reflexo passado seja perdoado e acolhido. Esse texto é muito mais para vocês do que para mim.

Fernanda Young eternizou “Posso até pedir perdão, só não posso deixar de pecar”. Peço perdão agora e sigo rente as minhas braçadas para aquilo que ainda não alcancei. Esse será meu epígrafo e meu manifesto.

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Edgar Dourado
O sexo e a cidade

Designer, Ator, cronista do caos e Carrie Bradshaw Tupiniquim. Escrevo sobre o que der na telha. Instagram: edgar_dourado