Fio de Esperança: 17 Anos do Adeus ao Mestre Telê

Danyel Lima
O Veterano
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10 min readMay 13, 2023

No último dia 21 de abril completaram-se 17 anos desde que Telê Santana nos deixou. Em homenagem ao treinador, abordaremos um pouco de sua trajetória e importância ao futebol.

No dia 26 de julho de 1931, nasceu Telê Santana da Silva na cidade de Itabirito, no interior de Minas Gerais. Iniciando a carreira no futebol na própria cidade, foi jogador nas categorias de base do Itabiraense. Após passagem pela equipe e pelo América de São João Del Rei, foi contratado para defender o time juvenil de seu clube de coração, o Fluminense.

O jovem ponta-direita se destacou na equipe juvenil do Tricolor das Laranjeiras e foi promovido para o seu time profissional, onde iniciou sua carreira oficialmente.

Pelo clube, obteve rápido destaque, conquistando um título logo no primeiro ano como atleta profissional: o Campeonato Carioca de 1951, marcando os 2 gols da vitória na partida decisiva contra o Bangu, no estádio do Maracanã.

Em 1952, o Fluminense de Telê Santana conquista o que é para o clube o seu maior título até hoje: a Copa Rio de 1952, reconhecida pelo clube como título do Mundial de Clubes.

Além disso, o Fio da Esperança (apelido dado após concurso realizado entre torcedores pelo jornalista Mário Filho) conquistou mais três títulos pela equipe carioca, os 2 títulos da equipe no Torneio Rio-São Paulo em 1957 e 1960 e o título carioca de 1959.

No ano de 1960, Telê se despediu do Fluminense, após jogar 557 partidas pela equipe e marcar 165 gols, conquistando o quinto lugar de jogador com mais gols da história do clube e o terceiro com mais partidas jogadas até hoje. Porém, não conseguindo manter o mesmo nível de desempenho no Guarani, Madureira e depois no Vasco da Gama, Telê decidiu encerrar a sua carreira como jogador em 1963.

O último evento marcante em sua carreira como jogador foi em 1962, quando defendia a camisa do Madureira e marcou um gol de cobertura na derrota da equipe por 5X1 para o Fluminense, sendo aplaudido pelos torcedores presentes no estádio que viram seu time sofrer o gol, em respeito à passagem dele como atleta no clube anos antes.

Após se aposentar dos gramados, Telê foi convidado para se tornar treinador, e em 1967 iniciou sua principal trajetória no futebol, começando na mesma equipe de juniores do Fluminense mas agora como técnico da equipe.

Pela equipe de juniores, o treinador se destacou e foi campeão carioca em 1968, o que o levou a ser promovido ao time principal em 1969, ano em que foi novamente campeão carioca, no seu primeiro título profissional como treinador.

Além do desempenho em campo, fora das 4 linhas o treinador se posicionou internamente contra a decisão de que os jogadores deveriam ir para os treinos e voltar pela porta dos fundos do campo enquanto ele próprio poderia entrar pela entrada social. Após a diretoria do clube não aceitar alterar essa decisão, o treinador passou a ir para os treinos por conta própria pulando o muro que delimitava o terreno do clube, após os funcionários não aceitarem abrir as portas dos fundos da instituição também a ele.

O bom desempenho da equipe no título carioca e o time montado para o Campeonato Carioca e Brasileiro em 1970 despertaram o interesse do Atlético Mineiro, que contratou Telê. Logo na primeira temporada, o Atlético Mineiro chega à final do Campeonato Brasileiro, perdendo justamente para o Fluminense montado por Telê meses antes que conseguiu se sagrar campeão brasileiro e posteriormente campeão carioca em 1971.

Chegando na equipe de Minas Gerais com o objetivo de encerrar a hegemonia cruzeirense no campeonato estadual e impedir que o clube alcançasse um hexacampeonato consecutivo, o Atlético Mineiro de Telê Santana, com uma campanha com 20 vitórias e somente um empate e uma derrota, conquista o título mineiro de 1971, com 51 gols marcados e somente 12 sofridos ao longo dos 22 jogos no campeonato.

No campeonato brasileiro do mesmo ano, o Atlético Mineiro consegue chegar até a fase de triangular final contra o Botafogo e o favorito ao título São Paulo, mas com uma vitória em Minas Gerais por 1X0 sobre a equipe paulista e um novo 1X0 em pleno Maracanã contra o Botafogo, o Atlético Mineiro se sagrou o primeiro campeão brasileiro de um torneio organizado pela CBD (atual CBF), sendo esse o maior título da história do clube durante mais de 40 anos, até a Libertadores de 2013 conquista pela equipe mineira.

Em 1973, Telê foi contratado pelo São Paulo, que buscava seu primeiro título brasileiro. Porém, um desempenho aquém do esperado, aliado a algumas rusgas internas com os ídolos do clube Paraná e Toninho Guerreiro, fizeram com que a passagem de Telê durasse apenas alguns meses, até o treinador voltar ainda em 1973 para o Atlético Mineiro.

Após um retorno ao Galo sem grandes feitos, o treinador é contratado pelo Grêmio em 1976, com o objetivo de encerrar outra hegemonia estadual. Dessa vez, o objetivo era parar o Internacional de Falcão, que conquistara os últimos 8 campeonatos gaúchos. Com um time que mesclava jogadores experientes com atletas mais novos, a equipe gremista vence o Colorado por 1X0 na final e se sagra novamente campeã estadual.

Em 1979 o técnico saiu do imortal para treinar o Palmeiras, e conseguiu um desempenho que agradou os torcedores, porém sem ter grandes peças no elenco, aquele time palestrino encerrou o ano sem títulos, passando por um jejum iniciado em 1976 e que só se encerraria em 1993 na conquista do Paulistão contra o Corinthians.

Após a passagem pelo Palmeiras, o treinador, com a alcunha de Mestre Telê, é contratado pela seleção brasileira em 1980, com o objetivo de se classificar e fazer uma boa Copa do Mundo em 1982. O time liderado em campo por jogadores como Zico e Falcão se classifica para a copa com facilidade e chega no torneio como favorito ao título.

Na fase de grupos, vitórias por 2X1 sobre a União Soviética, 4X1 sobre a Escócia e 4X0 frente à Nova Zelândia, indicando que o título era iminente naquela equipe que jogava como que numa orquestra. Na fase seguinte, novamente em modo de fase de grupos, o Brasil enfrentou Argentina e Itália. Após vitória tranquila por 3X1 frente aos argentinos, um empate bastava para a classificação no último jogo, contra a seleção italiana.

Ao iniciar o jogo, a Itália abre o placar com o atacante Paolo Rossi, que não havia feito nenhum gol naquela copa até então. Em seguida, Sócrates empatou para o Brasil. Porém, contando com falha de Toninho Cerezo, Paolo Rossi marcou o segundo gol italiano. No segundo tempo o Brasil chega ao empate com Falcão, mas, aos 30 do segundo tempo, Rossi novamente marca e define o placar do jogo em 3X2 e elimina a seleção brasileira tornando a Itália posteriormente a campeã do torneio.

A eliminação para a seleção italiana fez o treinador rever alguns de seus conceitos, deixando um pouco de lado a questão artística de suas equipes para dar maior enfoque ao resultado. Com isso, após 3 anos no futebol saudita que renderam a Copa do Rei Árabe de 1982–83, o Campeonato Saudita de 1983–84 e a Copa do Golfo em 1985, Telê Santana é novamente contratado para assumir a seleção, que iria para a Copa do Mundo em 1986.

Contudo, com uma geração já envelhecida em relação à 1982 e contando com o corte de Renato Gaúcho por atrasar aos treinos da seleção, culminando também no pedido de dispensa de seu amigo, o lateral Leandro, aquela seleção não conseguiu desempenhar um bom futebol e caiu nas quartas de final para a França nos pênaltis, após pênalti perdido por Zico no tempo regulamentar.

Com isso, começou a surgir a ideia na imprensa nacional de que o treinador era azarado, de modo que ele nunca teria o sucesso a nível internacional que era esperado.

Após a passagem pela seleção, Telê retorna ao Atlético Mineiro, onde consegue novamente o campeonato estadual em 1988. Após isso, o mestre vai para o Flamengo, onde conquista a Taça Guanabara de 1989, indo depois para o Palmeiras, para então ter seu auge na carreira, na passagem iniciada em 1990 novamente pelo São Paulo.

Chegando no clube que vinha de um vice-campeonato brasileiro em 1989 e de um péssimo campeonato paulista, amargando somente a 15ª posição dentre 24 equipes, Telê instaurou ao máximo sua filosofia de dedicação ao clube, morando no São Paulo Futebol Clube e realizando atividades como a inspeção de pragas que pudessem prejudicar o gramado, verificação da qualidade do campo para evitar lesões, consultas constantes sobre como se sentiam os atletas do clube, e treinando como principal fundamento o passe.

Após novo vice-campeonato brasileiro em 1990 com derrota para o Corinthians, o time em 1991 liderado em campo por Raí conquista o primeiro título de Telê no São Paulo, o Campeonato Brasileiro de 1991, batendo o Bragantino na final. No mesmo ano, em nova final contra o Corinthians, o São Paulo se sagra campeão paulista de 1991 com um 3X0 com 3 gols de Raí, sendo Telê o único treinador a ser campeão paulista, gaúcho, mineiro e carioca.

Com o título brasileiro, o São Paulo garantiu vaga para a Copa Libertadores de 1992. Na competição, o São Paulo passou em segundo no seu grupo ao lado do Criciúma e Bolívar. Nas oitavas, duas vitórias sobre o Nacional colocaram o São Paulo nas quartas de final. Uma vitória por 1X0 e um empate por 1X1 eliminaram o Criciúma e colocaram o tricolor paulista nas semis. Após vitória por 3X0 sobre o Barcelona no primeiro jogo e derrota por 2X0 no segundo, o São Paulo estava na final da Libertadores, pela segunda vez na história, após o vice em 1974 para o Independiente.

No primeiro jogo da final contra o Newell’s Old Boys do técnico Marcelo Bielsa, vitória argentina por 1X0. No segundo jogo, com gol de pênalti de Raí, o São Paulo vence e leva a disputa aos pênaltis. Com brilhante atuação do goleiro Zetti, o São Paulo vence por 3X2 nos pênaltis e se sagra campeão da Copa Libertadores, se classificando para a Copa Intercontinental.

No Campeonato Brasileiro, as derrotas no Rio de Janeiro para o Vasco e para o Flamengo que mais tarde levaria o título eliminaram o São Paulo na segunda fase. Contudo, no Campeonato Paulista o mais querido liderou o campeonato tanto na primeira fase quanto no quadrangular final, se classificando para a final contra o Palmeiras.

No primeiro jogo da final, 4X2 para o São Paulo com 3 gols de Raí e um de Cafu. Porém, no intervalo entre o primeiro e o segundo jogo, a equipe viajaria para a disputa do intercontinental no Japão, contra o campeão europeu Barcelona, treinado por Johan Cruyff.

Em duelo equilibrado, Stoichkov abre o placar para o Barcelona. Porém, com um gol de barriga e um de falta, Raí vira o jogo e consagra o São Paulo como campeão do mundo, coroando o trabalho da equipe e do melhor treinador da América do Sul naquele momento. Após o jogo, o próprio treinador do clube europeu disse que “Se é pra ser atropelado, que seja por uma Ferrari”, exaltando o nível da equipe paulista.

Retornando ao Brasil para a disputa do segundo jogo da final do Campeonato Paulista, com gols de Muller e Cerezo, o São Paulo vence por 2X1 e garante o terceiro título da equipe no ano.

Retornando à Libertadores em 1993 já nas oitavas, o São Paulo reencontra o Newell’s Old Boys, vice na temporada anterior. Com uma derrota por 2X0 na Argentina e uma goleada por 4X0 no Morumbi, o São Paulo avançou às quartas de final. Em um empate sem gols contra o Flamengo no Rio e vitória no Morumbi, o tricolor era semifinalista. Vencendo por 1X0 em casa e empatando sem gols fora, Telê eliminava o Cerro Porteño e estava na final contra a Universidad Católica.

Na final, a maior goleada em uma final da Libertadores até hoje. 5X1 São Paulo no primeiro jogo. Apesar da derrota por 2X0 no segundo, a América do Sul era vermelha, branca e preta por mais um ano.

No segundo semestre, o São Paulo disputou a Recopa Sul-Americana contra o então campeão da Supercopa, Cruzeiro, além da disputa da própria Supercopa Libertadores, chegando na final contra o Flamengo. Com ambas as finais contando com dois empates e duas vitórias em disputas de pênaltis, o São Paulo era novamente campeão, consolidando seu domínio no continente naquele ano.

Com os 3 títulos e um terceiro lugar no campeonato brasileiro daquele ano vencido pelo Palmeiras, o São Paulo de Telê viajou para o Japão para disputar novamente o intercontinental, desta vez contra o Milan do zagueiro Baresi.

Em mais um jogo difícil, principalmente por não ter mais a estrela de Raí, vendido ao PSG, o São Paulo vence por 3X2 o Milan, com gols de Palhinha, Toninho Cerezo e Muller, e conquista o mundo pela segunda vez, fechando o ano com 4 títulos internacionais, um feito até hoje inédito no futebol sul-americano.

Em 1994, na Recopa Sul-Americana, mais um título, dessa vez sobre o Botafogo, e a formação de um time formado apenas por jogadores da base do clube conhecido como Expressinho, que garantiu o título da Copa Conmebol com um 6X1 na final contra o Peñarol. Contudo, na Libertadores, depois de eliminar o rival Palmeiras, o São Paulo perdeu o primeiro jogo da final para o Vélez, e num segundo jogo cercado por polêmicas de arbitragem, uma vitória simples levou a decisão novamente aos pênaltis. Nela, brilhou a estrela do goleiro Chilavert, que fez seu gol e defendeu o pênalti de Palhinha, dando o título ao time argentino num Morumbi lotado e encerrando a hegemonia tricolor.

Por conta de problemas de saúde, Telê se viu obrigado a deixar o São Paulo em 1996, encerrando sua trajetória como treinador, tendo a carreira interrompida pela diabetes. No dia 21 de abril de 2006, após ser internado com uma infecção abdominal, Telê faleceu, deixando como legado sua filosofia de jogo e cuidado com o elenco, além de sua carreira vitoriosa, sendo um dos maiores nomes em quase todos os times por onde passou e sendo um dos maiores treinadores, senão o maior deles, em toda a história do futebol no país.

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