SDGV

O papel das sociedades de debate no mundo contemporâneo

Kaio Torres Dias
O Veterano
7 min readAug 15, 2020

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por Kaio Torres, Vitória Guardieiro e Rafaella Salles.

Sobre a entidade

Quase todo aluno da FGV deve ter ouvido falar da SDGV — Sociedade de Debates FGV -, mas a maioria também deve ter pouca ou nenhuma ideia do que ela faz, de quem são seus membros ou do motivo pelo qual amam tanto debater. Sua história começou em 2017, com alunos da FGV EPGE que tinham o sonho de impactar o debate público do país em um cenário de polarização, discurso de ódio e muita intolerância política. Desse objetivo, nasceu a 2ª Sociedade de Debates da cidade do Rio de Janeiro, que logo se tornou uma das mais eminentes do movimento de debates nacional.

O debate competitivo existe há muitos anos nas mais renomadas universidades mundo afora, como Cambridge e Harvard, mas no Brasil é mais recente, possuindo cerca de 10 anos. A SDGV utiliza o modelo de debates mais comum no mundo atual, que é internacionalmente conhecido como British Parliamentary (BP). Dentro do modelo BP, existem 4 duplas, 2 defesas e 2 oposições, e um tema que, geralmente, é revelado apenas 15 minutos antes de cada debate. Dentro desse tema há uma delimitação de ação que é chamada de “moção” e as posições das equipes são sorteadas; ou seja, até 15 minutos antes elas não sabem o que vão debater, nem mesmo em qual lado estarão. Isso é altamente desafiador, mas muito empoderador e empático também.

Assim, por acreditar que o discurso em si não tem vantagem intrínseca, a SDGV entrou no universo do debate competitivo, que é capaz de desenvolver as habilidades de análise micro e macro para a resolução de problemas complexos, a valorização do dissenso e a escuta ativa. Tudo isso exige aprendizado constante, mas é muito importante no contexto atual e ajuda a formar um perfil capaz de antever cenários e de propor soluções rapidamente. Ademais, para aqueles que acreditam no valor social do debate competitivo, ele é, acima de tudo, um exercício de empatia.

A SDGV estimula seus membros a usar habilidades comunicativas, raciocínio lógico e pensamento crítico para refletir sobre questões práticas da realidade, permitindo a aplicação dos conhecimentos teóricos estudados. Isso tem uma importância muito grande na vida universitária dos estudantes do movimento, que se deparam com moções dos mais diversos assuntos. Desse modo, o foco do membro durante os anos de faculdade não se restringe ao conteúdo do seu curso, mas abrange tópicos de cursos diversos, de economia a psicologia, entre outros.

A entidade acredita que ser um cidadão bem informado é importante não apenas para o exercício da democracia, mas também para o bom desempenho na vida profissional. Essa crença se baseia na ideia de que ter conhecimentos de nichos distintos do seu ajuda uma pessoa a se tornar um trabalhador mais completo e competente. Assim, a capacidade de criar casos em defesa ou em oposição a uma ideia, comparar cenários e raciocinar rapidamente traz benefícios tanto para um diplomata quanto para um advogado, ou, mesmo, um analista de ações.

Os treinos da SDGV servem como preparação estratégica para os torneios com estudantes de universidades brasileiras e internacionais. Tais eventos ocorrem em diversas cidades, logo, durante o ano, viajamos para vários lugares do país e do mundo, no intuito de competir e trazer títulos para a FGV.

Nossas conquistas

Rafaella Salles, campeã e melhor debatedora do torneio Maria Curupaiti

Após completar um ano, a SDGV já acumulava conquistas relevantes. Ela foi a quarta sociedade a chegar a uma final do Campeonato Brasileiro de Debates (CBD), o mais importante campeonato do Brasil, e enviou um dos membros da melhor dupla nacional no World Universities Debating Championship (WUDC), a principal competição de debates mundial. A entidade ganhou vários títulos do norte ao sul do país, sendo uma das mais premiadas sociedades brasileiras, entre as mais de 30 que existem.

Daniel Rocha e Matheus Popst, vice-campeões do V CBD

No entanto, se perguntassem à SDGV quais realizações lhe trouxeram mais satisfação ao longo de sua curta existência, a entidade não mencionaria torneios. A sociedade de debates se orgulha muito de trazer relevância ao debate público no Rio de Janeiro e, sobretudo, de ajudar vários alunos a vencerem a timidez e a se tornarem pessoas mais habilidosas, capazes de expressar seu raciocínio com clareza. No entanto, para manter essas realizações, a SDGV precisou superar um obstáculo tão grande quanto inesperado esse ano: uma pandemia global.

A pandemia e o debate online

O mundo teve que se adaptar a uma pandemia nos últimos meses e a SDGV não foi exceção. O isolamento social impôs uma série de restrições à mobilidade dos estudantes e mudanças drásticas às rotinas dos próprios, algo especialmente impactante para a entidade, tendo em vista a frequência com que viaja ao redor do Brasil. Assim, desde março, a sociedade foi obrigada a reinventar sua organização e sua atuação, assim como todo o movimento de debates.

Nesse sentido, o novo contexto representou uma época tanto de desafios quanto de adaptação para os debatedores. As sociedades não apenas estão incapazes de realizar torneios, como também não podem se reunir presencialmente para treinos regulares e para formações em temas, como Políticas Públicas ou Relações Internacionais. No entanto, essa situação se mostrou a oportunidade perfeita para a veloz ascensão de uma modalidade que já vinha se popularizando nos últimos anos: o debate online.

Esse modo de debater, recente no Brasil, utiliza plataformas como Zoom e Discord para que debatedores e juízes se comuniquem de forma quase idêntica a como o fariam em eventos presenciais. Ele começou a ser praticado por ser cômodo e, principalmente, por permitir que estudantes de diversas partes do Brasil debatam juntos regularmente, o que o tornou uma opção enriquecedora e atraente. Desse modo, sua popularidade cresceu de forma rápida e, assim, no ano passado, dezenas de pessoas já treinavam online semanalmente. Logo, os debates digitais passaram a ser cada vez mais presentes no movimento nacional de debates, ao ponto de campeonatos começarem a acontecer de forma virtual.

Nesse contexto, a pandemia transformou o crescimento linear do debate online em exponencial. Impossibilitados de treinar e competir presencialmente, além de menos atarefados, tendo em vista a ausência de atividades em muitas faculdades, uma grande adesão a essa modalidade marcou o primeiro semestre do ano para o movimento. Em ritmo acelerado, um número cada vez maior de sociedades passou a adotar treinos virtuais como regra e uma miríade de campeonatos digitais surgiu. Isso está mudando o movimento de debates de diversas maneiras, talvez permanentemente, e elas estão longe de serem todas negativas.

De muitas formas, o debate competitivo nunca foi tão abrangente e integrado como é hoje. Nos últimos meses, vários debatedores passaram a treinar regularmente em sociedades de outros estados. Além disso, esse ambiente virtual representou a queda das barreiras financeiras e geográficas que impediam estudantes de participar de muitos torneios organizados ao redor do Brasil e do mundo.

Desse modo, a ascensão do debate online representou uma oportunidade para muitos conhecerem e competirem com pessoas novas de diversos lugares e para manterem, ou mesmo aumentarem, sua participação no movimento. Nesse contexto, a SDGV foi uma das sociedades que aproveitou a nova situação.

Atividade da SDGV em 2020

Durante o primeiro semestre, a presença da sociedade da FGV foi notada de diversas formas no cenário nacional e internacional. Membros da SDGV compareceram a torneios organizados em diversos estados do Brasil, como São Paulo, Ceará e Minas Gerais, e mesmo em outros países, como Panamá e Portugal, conquistando prêmios em várias dessas participações. Além disso, alguns dos estudantes da entidade ajudaram a organizar muitas competições, criando moções para os debates e administrando as inscrições dos debatedores e juízes. Dessa forma, a sociedade de debates se manteve bastante ocupada ao longo desse ano, mas a segunda metade do período promete ser ainda mais ativa.

No mês de agosto, ocorrerão dois dos eventos mais importantes do ano para a SDGV: o processo seletivo e o III GV Debate. Quanto ao primeiro, o procedimento para a entrada de novos membros será inédito na história da entidade, e não apenas por ser virtual, ele será o único, até hoje, no qual a sociedade aceitará estudantes das filiais da FGV em São Paulo e em Brasília. Tal mudança ocorrerá no intuito de aproveitar o contexto digital do movimento para apresentar o debate competitivo a um número ainda maior de pessoas. Em relação ao segundo, o torneio organizado anualmente pela SDGV ganhará sua terceira edição, a primeira online, entre os dias 21 e 23 de agosto. Ele contará com dezenas de debatedores e juízes do Brasil e de Portugal, e será o maior evento do ano para a entidade.

Portanto, mesmo com diversos obstáculos, vários universitários da FGV, do Brasil e do mundo se dedicam para melhorar não só a si mesmos enquanto debatedores, mas também a todo o cenário dentro do movimento de debates. Esse é um esforço que fazem por acreditarem que o diálogo sustentado por lógica argumentativa é uma ferramenta primordial para lidarmos com os desafios com os quais nos deparamos enquanto sociedade.

Assim, tendo em vista o cenário de polarização política em que o país se encontra, no qual são escassas as oportunidades para debatermos ideias contrárias de forma lógica, sem ataques pessoais ou de outra natureza, as sociedades de debate se mostram mais necessárias do que nunca. Nesse sentido, quem quiser saber mais sobre a Sociedade de Debates da FGV e se aproximar desse movimento pode acompanhar as redes sociais da entidade (@sdgvdebates e @gv.debate). Além disso, são realizados treinos semanais abertos nos quais todos são convidados a ouvir e participar -mesmo não-membros da sociedade — no intuito de diversificar ainda mais as vozes no debate.

A verdade emana do dissenso.

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