Termina uma era, começa um plano de quase 2 trilhões de dólares

O primeiro bimestre do governo Biden

Kaio Torres Dias
O Veterano
6 min readMar 24, 2021

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Imagem de BatBus por Pixabay

No começo deste ano, após uma das eleições mais acirradas e tumultuadas da história dos Estados Unidos — que incluiu acusações de fraude, protestos e uma invasão ao Congresso — Joe Biden foi eleito o 46º presidente dos EUA. O democrata realizou tal feito com discursos que incluíram posicionamentos diametralmente opostos aos do seu concorrente, Donald Trump, em diversas pautas, como a ambiental e a imigratória; um combate agressivo à pandemia e à pobreza, além da promessa de unir uma nação ideologicamente dividida. Depois de dois meses à frente da maior potência econômica do Ocidente, quais progressos podem ser vistos nos objetivos propostos por Biden?

O Fim da Era Trump

Desde o início de seu mandato, o novo presidente dos EUA mostrou ao mundo uma clara mudança na posição do país em diversos assuntos. Em seu primeiro dia, Biden emitiu diversas ordens executivas e declarações com a intenção de reverter muitas das políticas mais representativas — e polêmicas — da administração Trump. Estas alteraram notavelmente o posicionamento da nação em temas como meio ambiente, imigração e saúde.

Em relação à pauta ambiental, o maior ato do democrata no dia foi assinar uma carta que declarava o retorno dos Estados Unidos ao Acordo de Paris. Esse tratado, do qual o presidente Trump retirou os EUA em 2019, representa um compromisso do país com metas que visam a reduzir o aquecimento global — como o controle na criação de gases do efeito estufa. Além disso, Biden também desfez as mudanças do governo anterior em políticas referentes aos limites das emissões de gases por veículos e a áreas de conservação estabelecidas durante a Era Obama.

No que tange à questão dos imigrantes, as ações do presidente podem ser ainda mais significativas. Em primeiro lugar, ele fortaleceu o programa DACA — que Trump buscava encerrar –, cuja função é impedir a deportação de imigrantes trazidos aos EUA quando crianças. Em segundo, Biden desfez as restrições impostas pelo governo anterior a viajantes vindos de certos países de maioria muçulmana. Por fim, o democrata paralisou a construção do famoso muro com o México, além de ordenar uma análise da legalidade da declaração de emergência nacional que Trump fez para conseguir os recursos necessários à construção.

Ademais, se as ações iniciais do presidente na saúde não foram tão dramáticas quanto em outras áreas, elas, certamente, não foram desprezíveis. Indo contra as críticas do seu antecessor ao uso mandatório de máscaras, Biden exigiu a aplicação do distanciamento social e o uso de máscaras em todas as propriedades do governo federal e por parte de todos os funcionários federais, além de pedir à população de todo o país que siga o exemplo. No entanto, o principal ato do presidente em seu primeiro dia em relação à saúde foi o restabelecimento de relações com a Organização Mundial da Saúde — da qual Trump havia retirado os EUA no ano passado.

O Começo do Legado Biden

Desde o começo do seu governo, o presidente tem dado prioridade máxima ao combate à pandemia. Isso ocorreu, principalmente, por meio de esforços intensos para garantir a vacinação rápida em todos os Estados Unidos. Nesse sentido, com o objetivo de disponibilizar vacinas para todos os adultos do país em maio, Biden tem aprovado diversas políticas para estimular a produção e distribuição dos medicamentos.

Entre tais atos, dois se destacam: os estímulos dados às produções das vacinas da Pfizer e da Johnson & Johnson. No primeiro caso, o presidente aprovou um apoio do governo federal para a compra de maquinário pesado usado para expandir as instalações da empresa. No segundo, a Casa Branca intermediou um acordo entre a companhia e a firma farmacêutica Merck & Co para acelerar a produção de vacinas. Dito isso, é importante destacar que o sucesso da vacinação do governo Biden — que já administrou mais de 100 milhões de doses — se deve também às ações de seu antecessor, que encomendou centenas de milhões de doses da Pfizer, da Johnson & Johnson e da Moderna.

Assim, ainda que seu empenho na administração das vacinas seja digno de nota, dificilmente ele será mais lembrado na história do que um dos principais e mais recentes atos de Biden: o seu projeto de estímulo econômico. Aprovado no dia 11 de março (um ano após a declaração da pandemia do coronavírus pela Organização Mundial da Saúde), esse plano consiste em uma série de medidas ambiciosas que visam — além de combater os efeitos do vírus -, a reduzir a pobreza nos EUA. Seja pelo tamanho do projeto ou pelas consequências duradouras que ele pode ter, esse ato pode vir a ser não apenas o mais importante do presidente até hoje, mas também um dos destaques de seu mandato.

O custo dele está estimado em mais de 1,9 trilhão de dólares americanos — o que o torna um dos mais caros já realizados pelo país — e é esperado que boa parte desse valor chegue diretamente aos bolsos dos norte-americanos. De forma semelhante ao auxílio emergencial brasileiro, uma das medidas do programa consiste em dar dinheiro para as famílias mais necessitadas, mas pode-se dizer que Biden usa a riqueza de seu país para tornar o plano bem mais generoso. Nesse sentido, qualquer adulto com renda anual inferior a US$75.000 (para casais que declaram imposto juntos o limite é de US$150.000) poderá receber US$1.400 por si mesmo e para cada dependente que tiver. Por exemplo, uma família composta por um casal e três filhos com renda anual inferior a US$150.000 (pouco mais de R$800.000) teria direito a US$7000 (cerca de R$38.000). Além disso, o “auxílio-desemprego” de US$300 semanais que o governo norte-americano já estava oferecendo desde o ano passado foi prolongado até setembro.

Ademais, o projeto de estímulo inclui auxílios a diversas instituições privadas e governamentais que têm sofrido com a pandemia. Entre esses, destacam-se US$350 bilhões concedidos a governos — tanto estaduais quanto locais — e cerca de US$130 bilhões investidos em escolas, além de quantias substanciais alocados em faculdades, casas de repouso, pequenas firmas e outras empresas. Tais investimentos visam a impedir falências e ajudar nos custos da retomada gradual das atividades econômicas.

No entanto, como esperado, a aprovação de um projeto tão ambicioso não veio de forma suave para o presidente. Se a população recebeu a política com grande empolgação, o partido republicano montou uma ferrenha — ainda que ineficaz — resistência ao plano de Biden. Taxando-o de caro e desnecessário, os políticos da oposição tentaram impedir a passagem do projeto em todas as etapas do processo legal. Isso representou a primeira oportunidade para o presidente usar a vantagem de pertencer ao partido majoritário do Congresso e do Senado: um dos maiores planos da história dos EUA foi aprovado sem um único voto de apoio republicano. Tanto uma demonstração do amplo poder de Biden quanto uma interrogação colocada sobre a promessa de unir um país dividido ideologicamente, as consequências desse ousado ato serão vistas em breve na política norte-americana.

Portanto, o início do governo de Joe Biden foi marcado pela reversão de muito do que houve de mais polêmico no mandato de Trump, bem como pela execução de projetos ousados para combater a pandemia e a pobreza. Tendo sido eleito em um dos momentos mais difíceis das últimas décadas, ainda é cedo para dizer se o atual presidente dos EUA será lembrado como uma figura heroica ou fracassada. No entanto, já se pode afirmar que ele não passará em branco na história de seu país. Tanto para os empolgados quanto para os temerosos com essa nova fase que os Estados Unidos entram neste ano, uma única afirmação pode ser feita com confiança sobre a Era Biden: ela está só começando.

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