Um antigo inimigo de volta ao cenário brasileiro

JK
O Veterano
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4 min readSep 3, 2023

No fim do século XVIII, Thomas Malthus, economista e matemático britânico, publica o “Ensaio sobre o Princípio da População”. A Teoria de Malthus responde, de uma forma pessimista, qual seria o futuro da humanidade: com a população crescendo exponencialmente e a produção de alimentos linearmente, haveria escassez. Na época em que foi formulada a teoria fez sentido, visto que o êxodo rural e os avanços na medicina não só fizeram com que as taxas de natalidade aumentassem como também a expectativa de vida das pessoas. A população europeia crescia rapidamente e a preocupação era de que mais cedo ou mais tarde a produção de alimentos não seria suficiente para todos. A solução proposta por Malthus era um controle de natalidade, focado principalmente nas camadas menos abastadas da sociedade. A teoria Malthusiana se provou equivocada, pois ele não considerou outros fatores, como a modernização na produção de alimentos, guerras e pandemias (que diminuíram drasticamente a população). No entanto, sendo errônea a noção de que o planeta não seria capaz de suprir a demanda de alimentos para toda a população, por que fome e a escassez de alimentos são uma realidade?

O problema não é o desenvolvimento, mas a distribuição. Um país pode ser um grande produtor de alimentos, mas se a desigualdade social for alta nada mudará no problema. O Brasil é um exemplo disso, estando entre os cinco maiores produtores de alimentos do mundo, porém, é o 10° país que mais desperdiça e o 20° na lista feita pela ONU para avaliar países que estão no mapa da fome. O relatório mais recente da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) mostra que mais de 70 milhões de brasileiros sofrem com algum tipo de insegurança alimentar, ou seja, praticamente um em cada três brasileiros não tem uma alimentação adequada e digna. O cenário pandêmico apenas trouxe um problema que o país já havia enfrentado e que estava praticamente mitigado em 2014, quando aproximadamente 3% da população sofria com a extrema pobreza e o Brasil saía do mapa da fome de acordo com a ONU. Enquanto as taxas de exportação de commodities disparavam, os programas sociais de combate à desigualdade e à fome eram abandonados. Paradoxalmente, enquanto o Brasil “alimentava” o resto do mundo, sua população passava necessidades básicas. Dessa forma, é nítido que Malthus errou ao desconsiderar a ganância dos homens.

Políticas públicas que buscam promover uma alimentação adequada começaram a ser desenvolvidas na década de 90 no governo de Fernando Henrique Cardoso, como o Programa Comunidade Solidária e a bolsa-alimentação. Mas foi apenas com o Programa Fome Zero, implementado em 2003 no início do governo Lula, que ações pontuais obtiveram êxito no combate à fome. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), criado em 1955, foi aperfeiçoado para compor uma das mais de 30 políticas públicas do Programa Fome Zero, e passou a ser a ligação entre a agricultura familiar e a alimentação escolar. Para as crianças e adolescentes de baixa renda ter pelo menos uma refeição por dia é essencial para evitar a desnutrição, por isso o PNAE oferece refeições completas aprovadas por nutricionistas, com as quantidades certas de proteínas, vitaminas e minerais. Durante a pandemia, com as escolas fechadas, não foi possível garantir a merenda dos estudantes. Alternativas foram propostas, como repasses financeiros ou até mesmo a entrega dos alimentos às famílias, mas não chegaram a ser efetivadas devido à falta de compromisso e/ou coesão entre governos estaduais e federais.

Ao contrário da causa apontada por Thomas Malthus para a pobreza e a fome — que, de acordo com ele, seria o aumento populacional — é evidente que o mau planejamento, o descaso estatal e as desigualdades estruturais são os reais motivos do problema. Uma nação que cresce economicamente sem se preocupar com o bem-estar da população, ou seja, que não busca reduzir as desigualdades sociais, estará fadada à fome e à miséria. Alguns meios possíveis para atenuar a questão são: centralizar os repasses financeiros para suprir as necessidades das pessoas em maior vulnerabilidade, intermediar o caminho entre o agronegócio e as famílias, diminuindo, assim, o desperdício e fortalecendo a economia local, além de retomar programas de monitoramento e apoio de famílias de baixa renda. O Brasil já conseguiu superar a subnutrição há quase 10 anos atrás e será imprescindível que no decorrer deste governo o combate à fome volte a ser uma prioridade na agenda política e social.

Fontes: https://mercadoeconsumo.com.br/26/01/2023/sustentabilidade/brasil-e-o-10o-pais-que-mais-desperdica-alimentos-no-mundo/?cn-reloaded=1

https://odia.ig.com.br/rio-de-janeiro/2023/04/6603341-fundadora-do-favela-organica-que-aproveita-100-dos-alimentos-transforma-vidas-em-morros-da-zona-sul.html

https://www.suno.com.br/artigos/teoria-malthusiana/#:~:text=De%20autoria%20do%20economista%20brit%C3%A2nico,elaborada%20no%20ano%20de%201798.

https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/noticia/75085849/ciencia-e-tecnologia-tornaram-o-brasil-um-dos-maiores-produtores-mundiais-de-alimentos

https://oglobo.globo.com/brasil/noticia/2023/07/12/mapa-da-fome-inseguranca-alimentar-se-agravou-na-pandemia-e-atingiu-mais-de-70-milhoes-de-brasileiros.ghtml

https://www.gov.br/fnde/pt-br/acesso-a-informacao/acoes-e-programas/programas/pnae

https://agroecologia.org.br/2021/07/09/pnae-alimentacao-escolar-como-proposta-essencial-de-combate-a-fome/

https://www.brasildefato.com.br/2022/10/13/fome-atinge-quase-830-milhoes-em-todo-o-mundo

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