4 livros de História da Magia

Inês Barreto
O Voo da Bruxa
Published in
4 min readApr 4, 2018

História da Magia é uma das matérias mais entediantes de toda Hogwarts. A começar pelo professor, que é um fantasma que nem percebe muito bem os alunos vivos em sala — uma crítica da educadora JK a professores que pararam no tempo. Mas acho injusto ser logo o professor de História o alvo. Enfim, críticas à parte, no universo de Harry Potter, História da Magia é a disciplina que fala de guerras de humanos contra duendes e tratados mágicos de diplomacia.

Na vida real, História da Magia não é necessariamente um campo de pesquisa, mas um monte de historiadores já se dedicaram sobre o tema embaixo dos guarda-chuvas da história cultural, do imaginário e da história social. E alguns deles criaram grandes obras, que nos ajudam a pensar no significado dessas crenças para o ocidente.

Escolhi falar de algumas delas, que são acessíveis para ler e que dá para comprar por aí. Existe muita gente apaixonada pelo tema, que acaba caindo em bibliografia ruim por falta de conhecimento da área, ou de acesso a bons livros. Como pesquiso o tem há algum tempo e já fiz muita leitura, selecionei quatro livros que são bem bacanas para um início, ou para quem não está acostumado a ler pesquisas científicas da área .

Lista de leituras iniciais

“Bruxaria e História” — Carlos Roberto Nogueira
Esse aqui é o compilado geral de História da magia que você deve ler. Ele pega desde as primeiras ideias de magia da Antiguidade até os movimentos contemporâneos para te inteirar do assunto, e depois dá um nó na sua cabeça falando das formas de patologizar essas crenças. O autor é provavelmente a principal autoridade brasileira em história da bruxaria. O livro é da Edusp, que não é tão fácil de encontrar, mas vale a pena procurar um pouco.

“Os Andarilhos do Bem” e “O Queijo e os Vermes”— Carlo Ginzburg
Os dois são estudos de documentações bem específicas da Inquisição durante a Era Moderna (lembrando que, tradicionalmente, é o período que vai das Grandes Navegações até a Revolução Francesa). No primeiro, ele estuda uma suposta seita que combate as bruxas, e no segundo ele conta a história de um moleiro acusado de heresia, ambos no território que hoje é a Itália. O que é legal das duas pesquisas é ver as crenças gerais, o contexto, as coisas que se passavam na cabeça da sociedade da época por meio de alguns indivíduos. Ginzburg é um pioneiro nisso, que chamamos de Microhistória. No Brasil, o Ginzburg é editado pela Companhia das Letras e você acha esses dois livros na coleção de bolso, por cerca de uns R$20 cada.

“O Diabo e a Terra de Santa Cruz” — Laura de Mello e Souza
Essa é outra obra pioneira, que estuda os processos de Inquisição do Brasil durante o período colonial. Pois é, tivemos pessoas acusadas de feitiçaria no Brasil, a maioria mulheres, negros e pessoas das classes mais baixas. Essa pesquisa incrível mostra um pouco de crenças do Brasil e discute vários aspectos do período, como preconceito, segregação, movimentos econômicos e formação da população, a partir dos processos da Inquisição de Lisboa e das práticas religiosas da colônia. Também é da Companhia das Letras e não é tão simples de achar nas livrarias porque já é antigo, mas em sebo você encontra. Não é tão barato, mas é outro que vale o investimento.

Algumas recomendações

Quando você for ler essas pesquisas, tenha em mente que é mais comum que a maior parte dos historiadores acabe estudando a Inquisição, porque é o período mais rico de documentação sobre esse tema, mas já existem pessoas trabalhando com um recorte de tempo contemporâneo, como o Ronald Hutton e o Owen Davies, por exemplo. Mas as traduções dessas obras mais novas são difíceis de encontrar, sai caro importar e a gente nem sempre acha o livro por vias menos ortodoxas (leia-se pirataria).

Mas tanto nas obras que pensam a Inquisição quanto as mais novas, você vai encontrar a história como uma interpretação do pesquisador sobre os documentos que ele pesquisou. Claro que para chegar nesse ponto ele tem uma série de referências historiográficas, metodológicas e sabe bem o que está fazendo. Mas não é porque está no livro que foi exatamente assim… infelizmente, a História é uma ciência que não tem como a gente colocar a bruxa no laboratório e ver como ela se comporta, porque ela morreu há uns 600 anos…

Essa é uma das questões que estão eternamente em debate nas faculdades e centros de pesquisa de História, assim como estão na cabeça do pesquisador enquanto eles faz seu trabalho. Mas isso não invalida nenhum desses trabalhos, todos muito melhores do que aulas dadas por um fantasma.

Me segue no Twitter que de vez em quando farei umas threads por lá! ;)

--

--

Inês Barreto
O Voo da Bruxa

Redatora e historiadora. Pesquisadora de feitiçarias e macumbas. Mestre e doutoranda em História pela @puc_sp