Sobre ansiedade, dark patterns e UX
O Brasil é o país mais ansioso do mundo. De acordo com a OMS, 9,3% da população brasileira sofre com algum transtorno de ansiedade (e olha que esse dado é pré-pandemia).
Em um design centrado no usuário, a missão do designer é criar uma interface que leve em consideração o que o usuário está procurando, prevendo a melhor forma de mostrar suas vontades e necessidades.
Isso deveria ser feito de forma clara e simples, porém o que mais vemos por aí são sites e aplicativos usando "truques" de interface para confundir e levar o usuário a fazer uma escolha que ele não quer, ou não precisaria fazer (como comprar algo por impulso ou erro, ou se inscrever sem querer numa lista de e-mails). A esses truques nebulosos, damos o nome de Dark Patterns.
A ideia ao utilizar um dark pattern é beneficiar unicamente aquele produto ou serviço, em detrimento dos interesses (ou até mesmo da saúde mental) dos usuários. Textos confusos, custos escondidos, mudar a ordem padrão de certas funções, tem de tudo neste vasto mundo online. Somos como eternos personagens de Fall Guys tentando constantemente chegar até o outro lado com o menor dano possível — se for possível.
Dark Patterns, além de por em cheque a ética questionável de determinado produto ou serviço, são problemáticos porque contribuem em fazer com que vários usuários se sintam ansiosos ou mesmo em pânico ao lidar com a interface.
David Swallow, engenheiro de acessibilidade sênior na TPGi, fez uma pesquisa junto a várias pessoas que possuem ansiedade e/ou transtorno do pânico e listaram alguns tópicos sobre quais aspectos de UI e UX podem desencadear essas sensações, como:
Urgência
Gerar pressa na decisão ao trazer relógios, contadores ou escassez do produto pode trazer um estresse desnecessário. Enquanto algumas pessoas precisam desse "empurrãozinho" pra agir, outras podem se assustar a ponto de desistir da compra. É preciso avaliar se vale a pena mesmo trazer esse senso de urgência.
Sites que trazem esse mecanismo deveriam oferecer formas de desabilitar, estender ou até mesmo ajustar mecanismos como esses, de acordo com as diretrizes de acessibilidade web.
Imprevisibilidade
Não saber quantos passos faltam para terminar um cadastro ou se aquela pessoa leu ou não sua mensagem (porque você ativou o double-check, mas ela pode não ter feito o mesmo — e você não tem como saber) é algo que deixa muito usuários sobrecarregados.
A verdade é que as pessoas detestam fazer tarefas sem ter o mínimo de noção do tamanho delas e de quais são as próximas fases.
Isso vale de forma especial para formulários que aparentam ter muitas informações a serem completadas ou muito complexas. Aqui, o ideal é manter o conteúdo claro e conciso, mostrando, inclusive, o que pode acontecer após o clique no botão “enviar”.
Impotência
Situação 1: Você faz o cadastro em um site, mas após um tempo decide desativar sua conta. Aí começa a saga. Clique aqui para ir pra cá, que vai te levar para a página tal, onde você encontrará a informação de que, na verdade, o cancelamento só pode ser feito via e-mail. Ou pior, telefone.
Situação 2: você está fazendo uma compra online que APARENTEMENTE custará 50 reais (vamos imaginar que o frete é gratuito). Ao final da jornada, você descobre que há mais 3 tipos de taxas diferentes e o valor já não é mais aquele que você estava imaginando.
Situações como estas fazem com que os usuários se frustrem, se confundam, se irritem. No primeiro exemplo, muitos usuários acabam desistindo de cancelar a conta. No segundo, muitos não percebem o valor a mais e acabam levando algo que não gostariam.
O ideal é oferecer formas claras de contato para o usuário utilizar em casos de dúvida e ser transparente ao exibir dados.
Sensacionalismo
"10 chás que previnem você de cair da escada. O número 5 irá te surpreender."
"Você está com tosse? Veja a lista de 25 doenças que você poder estar desenvolvendo".
A internet está cheia de clickbaits ou notícias mentirosas que fazem de tudo para gerar acessos. Infelizmente, além de enganar o usuário, práticas desse tipo podem desencadear muitas sensações ruins em quem tem ansiedade.
Como designers, é nosso dever balancear os objetivos da empresa e do usuário em uma única experiência e tentar ao máximo fazer isso de forma positiva para ambos. A melhor forma de atingir esse propósito é trazer clareza e segurança para a interface, engajando o usuário (e mantendo ele por perto) sem entrelinhas ou armadilhas.
