Ética no fotojornalismo e fetichização do sofrimento

Caroline Viúdes
Observatório de Mídia
2 min readJan 7, 2018

Um menino observa de olhos arregalados os fogos de Copacabana. Na semiótica mergulhada na lógica racista que nos cerca, o preto e o branco se evidenciam inclusive nas cores escolhidas pelo fotógrafo Lucas Landau ao divulgar a fotografia pela agência Reuters. O menino negro se diferencia tanto na cor da pele quanto na cor das roupas, dos outros que habitavam o mesmo cenário.

Fotografia original encaminhada à agência Reuters (Lucas Landau/REUTERS)

As interpretações, diversas: Enquanto alguns compartilhavam a imagem evidenciando uma desigualdade social, outros reclamavam a diferença de adultos para as crianças, que no caso da fotografia se diferenciavam pelo fato dos adultos apenas se preocuparem com selfies, enquanto o menino se preocupava com a vista dos fogos.

Versão editada da Fotografia que se tornou viral (Lucas Landau/REUTERS)

No âmbito da ética do fotojornalismo podem ser analisados vários aspectos. O primeiro deles é de que em uma fotografia jornalística deve-se ser preciso e exaustivo na representação dos sujeitos, o que traz a tona o debate da fetichização do sofrimento do povo preto, levando em consideração que a interpretação da imagem para ter se tornado viral se refere ao “abandono” de um menino em situação de pobreza, porém, até 5 dias depois da fotografia seu autor nem sabia o nome do menino, muito menos em que situação econômica se encontrava sua família. Sendo assim, a interpretação da maioria segue uma lógica racista, em que o menino apenas é retratado como destoante do restante do cenário pela cor da sua pele.

Outro aspecto é a fotografia não prover nenhum contexto do sujeito retratado. Junto a fotografia não foi divulgada uma identidade do menino, apenas um enquadramento e expressão do rosto que colaborassem para interpretações sensacionalistas de um sofrimento que nem se sabe se existe. A fotografia carrega estereótipos sem apresentar qualquer contextualização jornalística.

Diversos grupos do movimento negro questionaram a fotografia e os estereótipos que a mesma carrega, a viralização da imagem com certeza nos traz questionamentos sobre o assunto e considerações a serem feitas enquanto jornalistas. Em grande parte das vezes os juízos individuais não representam a realidade, para isso a apuração é importante e a valorização dos indivíduos retratados em matérias ou fotografias deve ser primordial, antes mesmo de quaisquer ambições envolvendo estética fotográfica e likes em redes sociais.

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