A interferência do poder na liberdade de imprensa
No dia 16 de outubro o jornalista de cultura do jornal Folha de SP, Diego Bargas, publicou no site do veículo uma resenha crítica do filme “Como se tornar o pior aluno da escola”, criado pelo humorista Danilo Gentili.
Mas seria mesmo um filme de humor? A trama faz piadas em cima de conteúdos como pedofilia e bullying. Com uma linguagem chula degradante, o filme é destinado para o público infantil de uma forma ruim. É uma ruim influência, já que os dois atores protagonistas do filme tinham 12 e 17 anos durante as filmagens. A classificação indicativa do filme é 14 anos, o que se torna muito contraditório quando o público-alvo são crianças e adolescentes, sendo toda a divulgação do filme construída em cima disso.
Após a crítica intitulada “Comédia infantil ri de bullying e pedofilia” de Diego ser publicada, Danilo Gentili começou a atacar o jornalista em suas redes sociais. Esse foi o primeiro tweet se declarando contra as acusações de Bargas sobre o filme:
Após isso, muitos fãs do humorista começaram a “stalkear” as redes sociais de Diego Bargas e expor sua posição política. Nas redes sociais, o jornalista compartilha publicações e demonstra apoio a Lula, Dilma e Haddad, todos representantes do partido político PT. Em contrapartida, Danilo Gentili foi um dos apoiadores explícitos ao Impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff.
A exposição da vida pessoal de Diego Bargas e a exploração de sua opinião causaram sua demissão da Folha de SP. O veículo declarou que orienta seus jornalistas a não exporem opiniões pessoais publicamente. De acordo com o jornal, os profissionais são orientados a “evitar manifestar posições político-partidárias e a não emitir nas redes juízos que comprometam a independência de suas reportagens”.
Apesar de isso ser uma faca de dois gumes, com muita polêmica acerca da independência opinativa nas redes sociais pessoais, a demissão do jornalista gerou diversas discussões. A maioria, a favor de Bargas.
A demissão de Diego Bargas não se deu somente por suas publicações nas redes sociais. Ele sempre postou conteúdos político-partidários, o que poderia já ser de conhecimento de seus chefes. O que pesou na demissão do jornalista foram as acusações feitas por Gentili e sua legião de seguidores. Os apontamentos e a grande exposição que o jornalista sofreu se assemelharam a uma censura de imprensa.
A liberdade de imprensa é algo assegurado pelo Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros, redigido pela Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas). De acordo com o Art. 2º, item III:
“Como o acesso à informação de relevante interesse público é um direito fundamental, os jornalistas não podem admitir que ele seja impedido por nenhum tipo de interesse, razão por que:
III — a liberdade de imprensa, direito e pressuposto do exercício do jornalismo, implica compromisso com a responsabilidade social inerente à profissão”.
Diego Bargas, em sua crítica ao filme, estava apenas expondo sua opinião acerca dos fatos: o filme faz piadas de cunho pesadíssimo para o público infantil. E isso foi algo que ofendeu Gentili — inclusive poderia afetar o lucro de bilheteria -, que moveu forças cibernéticas para expor o jornalista.
Acontecimentos desse tipo geram medo e, em consequência, uma autocensura que pode partir dos jornalistas de cultura da próxima vez que forem criticar algum filme. Isso não é afetar a liberdade de imprensa?
Episódios como esses, em que o poder e a fama de um humorista (há quem não veja graça em seu trabalho) passam por cima da informação e da crítica a um filme de má influência, fazem nós, jovens jornalistas, questionarmos sobre a necessidade de leis para a nossa profissão.
O Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros é apenas um código escrito em 2007. Não são leis. Sua punição é perder a filiação ao sindicato dos jornalistas: “impedimento temporário e impedimento definitivo de ingresso no quadro social do sindicato e à publicação da decisão da comissão de ética em veículo de ampla circulação”.
A profissão de jornalista precisa de regulamentos efetivos e que possam ser fiscalizados, além de punições mais graves para o descumprimento do Código de Ética.