A postura da ESPN na demissão de José Trajano

Mariana Faria
Observatório de Mídia
3 min readDec 1, 2017
Trajano foi um dos fundadores da ESPN Brasil em 1995 (Créditos: Reprodução/ESPN)

Em setembro de 2016, o renomado jornalista esportivo José Trajano da ESPN Brasil foi demitido do canal após 21 anos de trabalho na emissora. Segundo Trajano em entrevista ao site UOL, ele não esperava a rescisão do contrato (que iria até 2018), e ainda acredita, que motivações políticas tenham influenciado na decisão da emissora.

Trajano, que atualmente trabalhava apenas como comentarista no programa “Linha de Passe,” sempre mostrava sua opinião política fora da tv. No impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, ano passado, o jornalista demonstrou apoio a ela e afirmou ser contra o golpe e a favor da democracia em vários vídeos pessoais dele.

Em entrevista à Carta Capital e ao site Diário do Centro do Mundo, Trajano afirmou que a direção do canal não concordava com essa postura do jornalista, pois ele era a “cara” da ESPN e isso era “chato” para a emissora.

“Diziam que eu representava a ESPN onde estivesse. Não concordava. Eles até poderiam dizer para eu não falar certas coisas durante o programa…”, disse Trajano à Carta Capital.

No Código de Ética dos jornalistas brasileiros o artigo 9o diz que “é dever do jornalista (…) b) lutar pela liberdade de pensamento e expressão. c) defender o livre exercício da profissão (…) e) opor-se ao autoritarismo e à opressão, bem como defender os princípios expressos na Declaração dos Direitos do Homem”.

Como podemos observar há um desencontro entre o pedido da ESPN e aos direitos no Código de Ética, com uma tentativa de censura prévia pela emissora. Claro que, segundo um dos princípios básicos do jornalismo a imparcialidade deve ser preservada, mas todos nós sabemos que não é possível ser 100% imparcial.

“Antes da Olimpíada, me deram um papel para assinar, segundo o qual que os ‘talents’ da ESPN não devem se envolver em questões políticas etc. Diretrizes da matriz nos EUA”, o jornalista também relatou em entrevista ao Diário do Centro do Mundo.

Conforme o artigo 10o do Código de Ética: “o jornalista não pode: (…) concordar com a prática de perseguição ou discriminação por motivos sociais, políticos, religiosos, raciais, de sexo e orientação social.”, assim, houve uma perseguição a ele devido suas posições políticas.

Em outro trecho da entrevista ao Diário do Centro do Mundo, o próprio Trajano fala sobre perseguição da emissora ao comentar sobre a demissão do jornalista Sidney Rezende da Globonews em 2015, e, embora segundo ele sejam perseguições diferentes, elas têm ligações entre si.

Em nota ao Diário do Centro do Mundo, a ESPN negou haver influências políticas. “A ESPN sempre respeitou a posição política de todos os seus funcionários. Lamentamos que José Trajano não reconheça a nossa posição, sempre baseada em nossos valores de credibilidade, isenção e liberdade de expressão”, disse a emissora no comunicado.

Entretanto como relatado por Trajano há sim quebra da liberdade de expressão, já que ele era “a cara” da ESPN em qualquer lugar que estivesse. O jornalista ainda afirmou que “O macartismo está no ar”. Segundo Trajano o diretor geral da ESPN no Brasil, German Hartenstein, disse na conversa da dispensa que o motivo era a contenção de despesas.

“O Trajano é um profissional há muitos anos na ESPN, são 21 anos de história. Ele teve uma atuação fundamental no crescimento da empresa, é um dos grandes responsáveis pelo canal estar onde está. A gente teve, ao longo dos anos, uma história muito rica, só tenho a agradecer pelo trabalho que ele fez. Assim como acontece com a carreira de muitos executivos, chega o momento em que não contamos mais com o apoio do Trajano. No meu balanço, o saldo é muito, muito positivo”, disse German ao UOL Esporte.

O fato é que a emissora e o jornalista já tinham discrepâncias de pensamento. Trajano sempre com a postura do jornalismo esportivo crítico, não tecia elogios ao que ele chama de “jornalismo engraçadinho” referindo-se ao jornalismo esportivo atual. Mas essa censura prévia e perseguição ao jornalista é uma postura deplorável da emissora diante do jornalista e do jornalismo brasileiro.

--

--