A precocidade das figuras públicas no jornalismo de entretenimento

Lara Ignezli
Observatório de Mídia
3 min readDec 19, 2017

Stranger things é uma série de ficção científica norte americana que surgiu em 2016 e carrega consigo (de forma brilhante) monstros, teorias da conspiração sobre o governo dos Estados Unidos e um mundo invertido um tanto quanto sombrio. Quando falamos sobre a produção, a série traz a renomada atriz Winona Ryder e um grupo de crianças extremamente cativante, com idades que variam de 13 a 16 anos.

O grupo constava originalmente com Millie Bobby Brown, Gaten Matarazzo, Finn Wolfhard, Caleb McLaughlin e Noah Schnapp, que no ano passado — quando a série estreou — tinham respectivamente 12, 14, 13, 15 e 12 anos.

Foto do evento de lançamento da primeira temporada da série. Da esquerda para a direita: Caleb, Noah, Millie e Gaten.

Em consequência do boom que a primeira temporada teve, os criadores da série Matt e Ross Duffer convenceram a Netflix de que uma segunda seria uma boa ideia. E foi. A segunda temporada também foi majoritariamente aclamada pelo público e o elenco ganhou mais uma integrante: Sadie Sink, de 15 anos.

O sucesso da série fez com que os holofotes da grande mídia se voltassem para seis pré-adolescentes e adotassem um posicionamento problemático quanto a imagem de passava desse grupo para o grande público.

De um ano para o outro (e de uma forma assustadora) as câmeras, os ângulos, os figurinos, as poses, as maquiagens; toda a estética em geral, foram responsáveis por adultizar e erotizar um grupo de atores composto por crianças.

É claro que, por conta da sociedade em que vivemos, a mudança mais perceptível foi a de Millie, a qual apareceu chocando quem a via na estreia da segunda temporada da série. O all star do primeiro evento foi trocado por um sapato de salto, a maquiagem apareceu muito mais carregada e o vestido antes com laços e flores foi trocado por um vestido de couro preto.

Foto do lançamento da segunda temporada da série. Da esquerda para a direita: Caleb, Noah, Gaten, Finn e Millie.

Infelizmente, o caso é apenas mais um dos incontáveis episódios onde a imagem da “mulher sexy” é vendida baseada em figuras e situações que não deveriam ser sexualidadas, nesse caso em especial por conta da idade da pessoa em questão. É importante pensar por que essa situação é tão absurdamente naturalizada, um reflexo da sociedade como um todo e a forma como meninas são forçadas a se tornarem mulheres de um dia para o outro.

O papel do jornalismo de entretenimento se torna peça-chave para o entendimento, principalmente se analisarmos as revistas. Diversos photoshoots foram feitos durante o ano, todos onde Millie aparece com uma maquiagem extremamente carregada, além de roupas e feições “sensuais”.

Um dos maiores exemplos é a W magazine, que trouxe em sua capa uma lista de atrizes responsáveis por deixarem o cenário da TV mais sexy e entre os nomes está o de Millie.

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As fotos publicadas nas revistas da forma como foram levaram a uma onda de comentários que “elogiavam” a atriz de forma grotesca e erotizada. O Twitter foi a plataforma mais utilizada para que tais comentários fossem feitos. Outras celebridades que utilizam assiduamente a rede social se manifestaram contra o posicionamento dos jornalistas e das pessoas que estavam reproduzindo o comportamento nas ruas ou redes sociais.

Também no cenário virtual, Finn Wolfhard recebeu uma “cantada” de Ali Michael, 27, via Instagram e disse em entrevista ao TMZ que a situação o deixou extremamente desconfortável. A internet respondeu a modelo falando o quanto aquele post tinha sido errado e como ajudava na sexualização de crianças e pouco tempo depois ela postou um pedido de desculpas.

O jornalismo de entretenimento não pode continuar acreditando que qualquer coisa que gere lucro é apropriada para ser publicada, para entreter, para seduzir, para chamar a atenção. Nada justifica invadir, da forma absurda como vem sendo feita, a vida de um grupo de pessoas que deveria ser protegido das coisas ruins que a sociedade tem a oferecer, não ser cruamente exposto à elas.

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