Quimbanda e Gnose
“Fragmento de “O Livro negro da Quimbanda” por Ophis Cristos e Ordo Volucer Serpentis”
O fato de a Quimbanda ser um eclético sistema magístico faz com que existam muitos outros aspectos ocultos além dos já tradicionais citados anteriormente, e a partir de agora iremos descrever um pouco mais sobre estes aspectos.
Para que se possa compreender como nós conectamos o Gnosticismo a Quimbanda, precisamos entrar em um assunto extenso para que possamos explicar todas as coisas com detalhes.
Definir o gnosticismo é uma tarefa extremamente difícil, devido a uma ampla visão a cerca dos conceitos gnósticos e por este motivo iremos tratar apenas dos aspectos que tem relação com a nossa obra. Iremos reunir estes aspectos de maior relevância para explicar nossa visão gnóstica acerca da Quimbanda.
O gnosticismo desde o início tem sido associado a ideias opostas e
incompatíveis as tendências dominantes. Podemos dizer que todos aqueles que possuem uma aversão à sociedade e ao mundo, se sentindo ontologicamente estranho a ele, se aproximam das ideias gnósticas.
Os gnósticos representam a contracultura e as heresias de cada época, e a partir disso, eles utilizaram de várias tradições e mitos para explicar sua forma de ver este mundo, porque o gnosticismo é uma expressão mitológica de uma experiência interior, e todo o homem que recebe gnose possui uma melhor compreensão do ser humano e do mundo, possuindo uma forma contrária aos
pensamentos hegemônicos, que é aquele que se transforma em senso comum.
O Deus supremo dos gnósticos não é o criador deste mundo, nem mesmo é o governante, em verdade ele é ontologicamente estranho a este mundo, sendo sua completa antítese. Os gnósticos consideram que este mundo é obra dos poderes inferiores e que
é uma coisa que melhor fora que não existisse. Nós que compartilhamos das ideias gnósticas não compreendemos como os humanos se alegram e aplaudem quem criou este mundo que é totalmente desprezível e ainda chamam o criador de perfeito e bondoso. A nossa lucidez nos leva a descrença sobre este mundo, aqueles que não conseguem enxergar a realidade se refugiam na visão de que esta criação é uma obra perfeita, criada por um ser perfeito. O gnóstico é aquele que sem utopia, conhece a realidade sobre este mundo, os traços monótonos dessa existência, a miséria que se difunde, a verdadeira natureza humana e sabe que não se pode esperar algo muito melhor deste mundo.
Um dos pontos mais importantes que podemos encontrar tanto na Quimbanda quanto no gnosticismo é a rejeição a ética e a moral.
Se as palavras “ética” ou “moral” são compreendidos como um sistema de regras, então tanto o gnosticismo quanto a quimbanda se opõe a ambos.
Nós, assim como os outros grupos gnósticos, acreditamos que as leis são obstáculos para descobrir a própria divindade interior, e por isso acreditamos que tanto o gnosticismo quanto com a Quimbanda sejam uma viagem no reino proibido e ilegal.
Os espíritos que pertencem a Quimbanda possuem estas características amorais e antiéticas, demonstrando aversão às leis e representando a oposição dos valores que a sociedade vigente dominante tenta impor.
Estas entidades não possuem apenas estas características antiéticas
e amorais que se assemelham aos aspectos do gnosticismo, mas também estão ligadas a muitas outras características como a rebeldia, a irreverência e a busca para a ruptura da essência dogmática.
Nós entendemos que tanto no gnosticismo quanto na Quimbanda se manifestam princípios de rejeição as leis dos homens e as leis de Deus( o Deus de Abraão/o arquiteto do universo/ chamado de Demiurgo pelos gnósticos).
As entidades da quimbanda demonstram não somente através de atos, mas também convocam àqueles que buscam seus ensinamentos a diluição das regras, ordens, leis, e a entrega total aos desejos que brotam no coração de forma misteriosa e intuitiva, ensinamentos estes que consideramos puramente gnósticos.
O fato das entidades da Quimbanda assumirem essa postura amoral e sem lei e se apresentarem como o lado marginal e caótico, não significa que devemos mergulhar em excessos e depravações, tomando atitudes irracionais. Em verdade, um indivíduo não preparado que se arrisca a viajar no mundo do “sem lei, proibido e ilegal”, está fadado a se afundar “no lado negro” dos vícios e do descontrole, e não poderá possuir a capacidade de compreender e transcender a tudo isto.
Auto — conhecimento, auto — disciplina e auto — domínio são os princípios básicos para se obter gnose, e são adquiridos através de experiências pessoais. Através das experiências pessoais devemos fazer uma análise íntima e reflexiva de nós mesmos, e através dessa introspecção podemos evoluir e passamos cada vez mais a saber onde estamos pisando, onde queremos chegar e quais atitudes devemos tomar e consequentemente, de forma racional, passar por cima de todas as leis que estejam nos impedindo de alguma forma de atingir nossos objetivos e de evoluir.
Podemos citar ainda outros aspectos gnósticos na Quimbanda, por exemplo, podemos dizer que só há gnosticismo onde houver insolência, rebeldia, impaciência, imaginação, um humor ácido peculiar, sarcasmo, ou um mau humor, comportamentos estes típicos nas manifestações das entidades da Quimbanda.
Nestas manifestações, assim como nos ensinamentos gnósticos, são demonstrados que à obediência às leis morais, a prática da virtude, ou a “bondade” não são requisitos substitutivos para se chegar à plenitude do ser.
Acreditamos também que os Exus Catiços como espíritos divinizados, reforça a convicção da identidade divina do homem descrita no gnosticismo. Identidade esta que é alcançada através de um processo estritamente pessoal, um processo evolutivo, alquímico.
Tanto o gnosticismo quanto a Quimbanda também possuem carácteres iniciáticos e esotéricos, porque somente alguns poucos seres são capazes de receber este conhecimento e absorve-lo, e assim desafiar e ir de encontro às normas e as leis, não aceitando nenhuma limitação, a não ser aquelas que impõem neles mesmos.