O seu trabalho ainda faz sentido?

Leo Ornelas
Octop
Published in
4 min readJun 30, 2020

Aviso: esse texto é uma reflexão provocativa, e não traz respostas absolutas para os problemas que estamos vivendo. Se souber onde podemos encontrar, nos avise! E como falaremos um pouco sobre tempo, a leitura fica mais coerente se você estiver ouvindo "Time", do Pink Floyd, no seu fone de ouvido.

Estamos vivendo um momento histórico. Sem entrar na absurda quantidade de mortos por lideranças e políticas incompetentes, estamos dentro de uma janela de oportunidade de remoldar o mundo em que vivemos. Por que, de fato, estamos nessa janela?

Quantos paradigmas e padrões foram quebrados nos últimos 6 meses em que estamos vivendo? Poderíamos fazer um texto só para eles, mas por hora iremos citar alguns aqui: o seu protocolo de higiene pessoal, a sua jornada de trabalho de 8h, alguma empresa isenta de opinião social e política, suas necessidades básicas de consumo… e a lista é extensa.

Com a quebra de tantos conceitos (que já estavam fragilizados), novos padrões estão sendo construídos pela sociedade, tanto no contexto macro (o mundo inteiro, literalmente) quanto no micro (a comunidade em que você vive, por exemplo). Para esses novos padrões, novos protocolos e políticas também surgem. E aí que entramos na janela de oportunidade mencionada acima. Esse momento pode ser entendido como um momento fluido e maleável, em que o remolde é possível. É a interceção do passado (velhos paradigmas) e o futuro (novos padrões). As ações que tomarmos agora como sociedade e como empresas irão moldar e ter impacto significativo nos nossos próximos (20? 30? 40?) anos.

O Fórum Econômico Mundial criou a iniciativa chamada The Great Reset, que discute justamente essas mudanças necessárias para o tempo em que vivemos.

The Covid-19 crisis, and the political, economic and social disruptions it has caused, is fundamentally changing the traditional context for decision-making. The inconsistencies, inadequacies and contradictions of multiple systems –from health and financial to energy and education — are more exposed than ever amidst a global context of concern for lives, livelihoods and the planet. Leaders find themselves at a historic crossroads, managing short-term pressures against medium- and long-term uncertainties.

Para ver a tradução desse texto para português, é só clicar aqui!

O professor e escritor Yuval Harari diz em um de seus artigos, sobre o tempo fluido e maleável:

“In the next few months, politicians will remake the world. During these few months, the world is going to be fluid and malleable. We could choose to deal with the current crisis through global solidarity and cooperation, which will result in a more unified and harmonious world. We could also choose to deal with it through nationalistic isolation and competition, which will probably make the crisis far more acute and will result in a more fragmented and hostile world.

This crisis has taken politicians completely by surprise, and they don’t have a readymade blueprint for what to do. They are therefore singularly open to new ideas. Even to crazy ideas. But once the choices are made, a new order will solidify, and it will become increasingly difficult to try a different path. Whoever comes to power in 2021 will be like somebody coming to a party after the party is already over, and the only thing left to do is wash the dirty dishes. While the party lasts, we have to be extremely focused and help governments adopt the right policies.”

Para ver a tradução desse texto para português, é só clicar aqui!

Foto de Oladimeji Ajegbile no Pexels

Ok. E o que o meu trabalho tem a ver com isso?

Muito mais do que não gerar mais impacto negativo, as empresas têm a obrigação moral de terem uma mentalidade regenerativas. Esse termo — regeneração — pode ser relativamente novo para a nossa leitura cotidiana, mas é um assunto urgente: estamos tirando mais do mundo ele pode suportar. Vale a pena ler e entender mais sobre isso. Colocando os óculos dos tomadores de decisões das empresas, podemos perguntar: a minha empresa ainda faz sentido?

As reflexões aqui também são infindáveis:

  • O seu negócio é feito para os acionistas ganharem cada vez mais dinheiro, ou para transformar a vida das pessoas — colaboradores e clientes — de alguma forma?
  • Quais são as métricas que baseiam suas decisões? Só a margem de lucro de um produto ou serviço, ou a bem-estar emocional dos seus funcionários também?
  • Qual a discrepância salarial entre o CEO/Coordenador de uma empresa e seus funcionários? Você está preocupado com a desigualdade de renda estrutural em que vivemos?
  • Quão inclusivo é o seu ambiente de trabalho? A sua empresa está sendo acolhedora para a comunidade ao seu redor?
  • Falando em comunidade, você tem contribuído para melhorar a que a sua empresa está inserida? Você sabe as necessidades dela?

Por aqui, entendemos trabalho como a forma que podemos contribuir para o mundo. Não simplificando isso no termo propósito, mas é a única maneira que você tem de impactar uma quantidade significativa de gente, independente se ele te remunera ou não por isso.

Dito isso, o trabalho que você tem feito atende as necessidades que o mundo, de forma escancarada, está pedindo? Você está aproveitando esse momento fluido e maleável, que citamos ali em cima, para remoldar a comunidade e o ambiente ao seu redor? A empresa que você trabalha divide os mesmos valores que você?

Essas perguntas são provocações. Quem escreve esse texto também tem se questionado todos os dias, e precisamos aproveitar o zeitgeist para moldar o mundo que queremos.

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