Construindo ambientes de confiança na OLX Brasil a partir da troca de conhecimentos

Felix Ribeiro
Grupo OLX Tech
10 min readApr 13, 2021

--

Me inspirando a partir de um modelo

Eu sempre tive muitas dificuldades em aceitar hierarquias impostas e sistemas rígidos de controle. Por volta de 2015, eu trabalhava numa empresa que acreditava muito em um modelo novo de organização que tem emergido na nossa sociedade. Nesta época me deparei com “Reinventing Organizations”, um livro de Frederic Laloux em que ele observa as novas formas de estruturas organizacionais que têm emergido em nossos tempos, as quais ele chama de Teal. Ele defende que essas organizações se estruturam em 3 pilares:

  • Propósito evolutivo: A organização busca algo maior que o lucro, o objetivo agora é contribuir para o mundo a partir de sua capacidade de mudança. O propósito evolutivo é o balizador dos objetivos, estratégias e decisões tomadas.
  • Integralidade: As pessoas são convidadas a estarem de maneira íntegra no ambiente de trabalho, onde a falsa separação "eu profissional"/"eu pessoal" não existe.
  • Autogestão: A gestão é responsabilidade de todos e não apenas centrada numa figura e/ou papel. A prestação de contas é direcionada aos pares, criando um ambiente de “pressão dos pares” (peer-presure).

Para mim foi um deleite perceber que era possível se organizar de uma maneira mais natural e que organizações no mundo já estavam praticando! Se alguém fez, é possível!

Nessa empresa em que trabalhava, percebia algumas das práticas que Laloux descrevia em seu livro, mas algo ainda me incomodava — e na época não entendia muito bem o quê — mas eu continuava estudando e pesquisando sobre as Organizações Teal e tentava desesperadamente aplicar o que lá estava descrito no meu dia-a-dia! Porém, o incômodo continuava, e a sensação de frustração aumentava conforme a leitura avançava.

Frustrações e Aprendizados — Percebendo o modelo na prática

No início de 2016, comecei a viver momentos que trouxeram grande ruptura — percebi que estava a cada dia morrendo por dentro, sem alma, sem auto-cuidado, usando uma máscara diariamente para ir ao trabalho e terminar meu mestrado! Eu ainda não tinha me dado conta que estava caindo na armadilha que Laloux define em seu livro — eu não estava por inteiro naquela empresa, eu vestia um personagem que, a cada dia que passava, ficava muito desgastante de manter. Depois de algumas crises de ansiedade — com direito a alguns burnouts, crises de agressividade e diversos sintomas psicossomáticos; percebi que estava completamente alienado do meu corpo: pré-diabetes, 135kg, péssima alimentação, muito cigarro e álcool para manter alguma “sanidade” e conseguir ser produtivo.

Algo estalou por dentro e resolvi mudar algumas coisas: iniciar terapia, entrar numa nutricionista para reverter o quadro da pré-diabetes, parar de fumar, voltar a fazer exercícios, largar o mestrado!

Tudo isso colaborou para restaurar minha saúde emocional e física, mas algo realmente catalisou diversas outras mudanças que ocorreram depois: entrar de cabeça como voluntário da TETO Brasil.

TETO é uma Organização Social que tem em seu propósito trabalhar para construir uma sociedade justa e sem pobreza, fazendo intervenções de moradia e habitabilidade nas favelas mais invisíveis do Brasil.

E o que isso tem a ver com a história do “Reinventing Organizations” e toda aquela frustração que contei? Pois foi no TETO que percebi algumas coisas que estavam faltando para que os 3 pilares definidos por Laloux estivessem alinhados na empresa que trabalhava.

Foi no TETO que vivi a importância de um propósito evolutivo no trabalho e de estar por inteiro ali dentro(integralidade), fazia a autogestão funcionar e não se tornar um sistema de desamparo.

Transitando na cultura dessas duas diferentes organizações eu pude experimentar os impactos de quando a instituição de fato está engajada a regenerar tudo que toca, em todo o ecossistema! Fui me percebendo muito mais engajado em trabalhar no voluntariado: fazendo diversas coisas que não eram de meu domínio de conhecimento, utilizando uma boa parcela dos meus finais de semana e noites livres para tal, e cada vez mais querendo construir uma organização mais forte! Meu engajamento no trabalho com a TETO aumentava exponencialmente, enquanto toda minha motivação para a empresa — que já havia sido alta — caia vertiginosamente. Eu só fui entender com clareza os motivos disso algum tempo depois…

Para encurtar a história, meados de 2017, eu me demiti desta empresa. Tentei uma outra oportunidade no meio do caminho, que trouxe grandes aprendizados sobre gestão, reconhecimento de comando-e-controle e mais uma grande decepção. Eu estava cheio de desconfianças do mercado como um todo, o que incluía até a minha profissão, mas isso é assunto para outro texto.

Reconhecendo um território fértil na OLX Brasil

Vim parar na OLX Brasil no início de 2018 como engenheiro sênior — e o importante aqui é que dia após dia eu pude perceber a minha confiança na empresa sendo construída de maneira muito sólida, a partir de ações e não mais palavras. Também continuei no TETO e aí que alguns links começaram a fazer bastante sentido na minha cabeça.

Assim que entrei aqui, os valores e o propósito ditos estavam bem alinhados com o que eu acreditava e eu fui percebendo que a maneira como eram executados no dia-a-dia me alegravam. Não estou dizendo que não haja problemas ou algumas inconsistências entre o discurso e a prática, mas percebo que, quando os problemas são levantados, existe uma vontade genuína e pragmática de endereçá-los! Era o mesmo sentimento que eu tinha dentro da TETO e, pela primeira vez em algum tempo, eu tenho toda minha motivação e energia para entregar o melhor que eu podia para a organização.

Por volta de junho do mesmo ano, fui convidado para gerir o time no qual eu já trabalhava e, neste processo, fui aprendendo muito sobre gestão com meus líderes. Foi nesta época que eu me deparei com o livro “The 5 dysfunctions of a team” de Patrick Lencioni, que me permitiu entender como a confiança é a base para a construção e a manutenção de uma equipe de alto desempenho, pois ela estabelece a qualidade das relações dentro da equipe e o nível desta tem uma relação proporcional à qualidade da conexão dentro do time. E por ser a base, precisamos de tempo, consistência e dedicação para construir e manter. Sendo esta composta por diversos componentes, o que torna a construção mais complexa (e particularmente excitante!). Em minhas pesquisas me deparei com os seguintes componentes: Limites, Responsabilização, Integridade, Não Julgamento, Generosidade, Sigilo e Confiabilidade. Esses componentes da confiança são definidos por Brené Brown, em seu livro “Dare to Lead”, como B.R.A.V.I.N.G: Boundaries, Reliability, Accountability, Vault, Integrity, Nonjudgment, Generosity.

Foi então que percebi que tinha muita confiança em meus pares de trabalho na TETO e por isso nosso trabalho escalava tão bem. Percebi que uma das práticas que ajudaram muito para isso acontecer eram os “Espaços Formativos”. Eram momentos onde parávamos para discutir sobre o porquê estávamos ali. Por que estávamos construindo aquelas moradias de emergência? O que nos levara a estar fazendo trabalho voluntário? Quais os fatores da sociedade que faziam o trabalho da TETO ser necessário? Como esse processo estava ocorrendo em cada um de nós? Quais razões daquelas favelas serem tão invisíveis a ponto de termos mais dados socioeconômicos do que o poder público? Quais eram os nossos sonhos e como o trabalho com a TETO nos servia como ferramenta para realizá-los?

Quando olhei para estes e diversos outros momentos de conexão dentro da TETO, percebi que eram fundamentados nessas práticas que a TETO fomentava, a integralidade. Eu era convidado a estar por inteiro naquele espaço — e quanto mais eu me expunha, mais acolhimento e empatia eu recebia! Com toda certeza aprender a escutar com empatia o olhar do outro, dentro daquele contexto que eu também estava experimentando, foi uma das grandes chaves para que eu pudesse rapidamente criar laços fortes de confiança. Laços que permitiam uma agilidade incrível nas decisões! Nós tínhamos certeza que cada pessoa estava dando o seu melhor, usando toda capacidade que tínhamos consciência — e sempre testando limites quando era necessário pelo coletivo, pelo propósito!

O entendimento disso foi me inspirando a arriscar reproduzir algo parecido com a equipe que trabalhava! Eu tinha todo o solo abundante para isso: os valores da OLX Brasil encorajam esse olhar humano para o outro; Nosso propósito — Empoderamos as/os brasileiras/os para realizarem seus sonhos, mudando o modelo de consumo — é comprometido com o que o mundo pede, sentimos isso trabalhando aqui dentro e ouvindo as grandes histórias na vida de nossos usuários; Acreditamos na autogestão e confiamos no poder de decisão das pessoas que trabalham conosco; queremos sempre estar abertos a melhorar e ouvir com empatia como podemos fazer melhor para nossos pares, líderes e liderados!

Plantando sementes

O solo estava preparado, eu só precisava me movimentar para fazer florescer alguma iniciativa que tivesse o poder de trazer cada vez mais forte nossos corações para dentro de nosso ambiente e aprender muito mais nesse processo.

O time já tinha uma prática quinzenal, o Compartilhamento Técnico, onde a equipe se reunia para falar sobre alguma descoberta, projeto ou material técnico que alguém acreditasse que fosse somar para o arsenal técnico da equipe. Com isso vi a oportunidade de compartilharmos também outras fontes de informação, trazendo material que fomentasse conversas sobre nossa cultura organizacional, como: desenvolvimento pessoal/equipes, comunicação, psicologia, mercado, sociedade, ética, produto, entre outros. Surgia então o Compartilhamento Cultural!

O quadro do Compartilhamento Cultural da equipe de Verticais da BU OLX

Iniciamos o ritual com alguma pessoa do time compartilhando o material proposto e, em seguida, abrimos para uma conversa, nos questionando como aquele conhecimento impacta nossas vidas, trabalhos e histórias. Esse efeito de compartilhar conhecimento e histórias criam vínculos pessoais, pois exercitamos a vulnerabilidade ao expormos nossas histórias, ao mesmo tempo que nos conectamos a partir delas — nos enxergando cada vez mais como pessoas com dificuldades e desafios pessoais. Os materiais compartilhados servem como pontes entre as histórias das pessoas da equipe, as conversas sobre os temas aumentam nossas capacidades de escuta ativa e também sobre debater ideias de maneira construtiva — o que nos ajuda nas decisões e conflitos cotidianos. Mantemos os materiais consumidos registrados para consultas posteriores e até releituras, quando for necessário.

O compartilhamento cultural é importante pois ele conecta as pessoas a partir de histórias, enquanto aprendem algo novo! O compartilhar conhecimento é uma prática de curiosidade intencional e ativa. Ao mesmo tempo, requer que exista algum nível de confiança estabelecida. Quanto mais você confia, mais você compartilha informação. Quanto mais você confia, mais você absorve a informação, pois você confia que quem está te passando informação o faz de forma genuína. Se observarmos, em última instância, compartilhar conhecimento é se expor, logo, se vulnerabilizar em algum nível. Quando criamos esse ambiente de vulnerabilidade e aprendizado, temos a oportunidade de criar vínculos fortes pois aumentamos o nível de empatia dentro do time. O nível de empatia cresce pois entramos no ritual com a curiosidade que é fomentada pelo simples fato de que estamos indo absorver um novo conhecimento.

A curiosidade inicial é de extrema importância para a boa qualidade deste espaço. A curiosidade pode ser definida como o sentimento de privação que experimentamos quando identificamos e focamos em alguma lacuna em nosso conhecimento. É o nosso alerta interno de que não detemos alguma informação relevante para o contexto! Ela engatilha nosso estado de vulnerabilidade — estar curioso é admitir que não sabemos algo, logo, que estamos frágeis sobre aquele contexto! Então se você esta propondo esse espaço dentro da sua equipe, fomente a curiosidade com perguntas que exploram as situações: “Como você se sentiu quando passou por isso?”, “Como você percebe isso no seu dia a dia?”. “O que pra você é importante nesse trecho?”, “O que isso representa para você?” … Seja a pólvora da chama da curiosidade no seu grupo!

Adubar a terra, colher frutos e repetir!

Checkin em silêncio no time de Growth Data Intelligence da BU OLX

Ao longo desses encontros, colhemos esses aprendizados abaixo que podem te ajudar a como manter esse espaço:

  • Defina e escreva acordos coletivos em conjunto e pontue eles rapidamente a cada início, ainda mais para grupos novos! Acordos como “respeitar ordem de fala” e “não levar as coisas para o pessoal” , “não tire conclusões — mantenha-se curioso” são exemplos que funcionaram para a gente!
  • Mantenha uma lista de materiais, onde as pessoas podem colocar lá quando se depararem com algo interessante!
  • Persistência na caminhada, confiança é uma construção contínua: especialmente em grupos novos, é muito importante pelo menos uma figura que sempre incentive trazendo textos, se abrindo, contando casos relacionados com sua vida! O exemplo inspira!
  • Cheque periodicamente se o ambiente esta funcionando para todos ou se não é hora de rever periodicidade e acordos
  • Use a oportunidade para trazer materiais que possam ajudar nas situações vivenciadas pelo time/grupo atualmente!
  • Faça o link dos temas trazidos com os valores de sua organização! Isso pode ajudar a compreensão prática do que são esses valores em comportamentos!
  • Fica aqui o link para um dos quadros de compartilhamento. Fique a vontade para se inspirar e pegar referências de artigos e videos!

Essa prática de grupo pode potencializar as relações na sua equipe e ela é uma das maneiras em como podemos continuar cultivando as relações dentro de uma equipe! Em momentos de trabalho remoto, ela pode ser uma âncora que lembra a todos do time o que às vezes podemos esquecer: estamos trabalhando com pessoas — é tudo sobre gente!

Jornada de Pontapé do time de Cross-Functional Growth (atual Growth Data Intelligence) em Fev/2020 onde compartilhamos nossos valores fundamentais

Se enquanto você lia a minha história você ficou com vontade de fazer parte de um time que constrói um ambiente de confiança e valoriza toda troca de conhecimentos, eu tenho uma boa notícia. Nós da OLX Brasil estamos de portas abertas para você construir a sua jornada com a gente!

--

--

Felix Ribeiro
Grupo OLX Tech

Um realista esperançoso que teima em acreditar que o potencial coletivo tem poder para mudar o mundo