A Jornada do Herói em Game of Thrones

Se é que ela existe

Jean Prestes
Onirika
5 min readJun 23, 2020

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Esse cara é um gênio.

Para mim, naquele momento — e talvez até hoje — eu dizia muito: era a melhor coisa que eu já havia visto em uma tela, contando filmes, séries, tudo.

Antes de iniciar, deixe-me esclarecer. Eu não assisti a todos os episódios. Parei de assistir acho que na quarta temporada, quando o anão começou a sofrer demais. A gota d’água para mim foi quando Shae, a paixão dele, o acusou lá no tribunal ou algo assim, não me lembro bem. Acho que estava identificado com ele em excesso. Acho não, estava. Quase todos nós, sim? Acontece que só voltei a assistir na última temporada. Desde o primeiro até o último episódio, lançamento por lançamento. Sim, o último episódio foi uma bosta. Mas a última temporada como um todo eu gostei muito, embora tenha sido muito criticada. Enfim, quando me reposicionei em Game of Thrones, pegando o trilho dos últimos episódios, senti toda a satisfação do mundo em acompanhar o que eu realmente queria acompanhar, desde o começo. A invasão dos caminhantes brancos. Para mim, toda a essência de GOT girava em torno disso. Eu sabia que, enfim, várias picuinhas iriam acontecer entre os humanos, disputas de tronos, de poder etc, mas no final, seriam os vivos contra os mortos.

Quando comecei a acompanhar GOT, quando ainda só havia sido lançada a primeira temporada, estava no mesmo momento, se me lembro bem, em que eu estava interessado pelas obras de Jung. Eu estava encantado por Game of Thrones de uma forma que há muito não me encantava por algo assim, de tela. Para mim, naquele momento — e talvez até hoje — eu dizia muito: era a melhor coisa que eu já havia visto em uma tela, contando filmes, séries, tudo. Por quê? Porque era completamente imprevisível. O mocinho morre no final. Aliás, o mocinho morre a qualquer momento. Na verdade, qualquer um morre a qualquer momento. Ou perde uma mão. Ou é atingido com uma flecha. Fica paraplégico. Sei lá eu. Quando começava uma batalha, em GOT, eu não ficava entediado, pensando que “ah, claro, o mocinho, ele não vai morrer”. Quando vários foram morrendo na primeira temporada, e Ned Stark morreu gloriosamente no final, tendo sua cabeça arrancada por ser… err… justo, eu pensei “Agora sim!”. Era isso que eu queria ver, algo imprevisível. Mas, e a Jornada do Herói?

“Leaving the comfort zone”

Bom, a Jornada do Herói era previsível, muito. É um roteiro, um script arquetípico. Arquétipos, às vezes, parecem existir para nos entediar, hein, Deus? Enfim, então fui concluindo: Não há jornada do herói em GOT. Não há um herói que recebe um chamado, recusa num primeiro momento, depois aceita, vive a aventura, enfrenta o monstro final, e volta para contar a história. Ou, então, existiam várias jornadas em uma mesma série. Eram tantos personagens geniais e tantas histórias envolventes ao mesmo tempo que, se um personagem morresse ou uma linha de história toda sumisse (como os Stark indo atrás de vingança e sendo trucidados no casamento vermelho) ainda haviam várias outras para sustentar a trama. Cada vez que uma nova batalha começava, que espadas começavam a se chocar, meu nível de atenção subia ao máximo. Picos de prazer. Quando acabava, o alívio. Com morte ou sem morte, o alívio. Mas, porra, tem ou não tem Jornada do Herói em GOT?

Ter ou não ter jornada do herói, eis a questão.

Ainda não sei, talvez descubra nos próximos parágrafos. Mas, recentemente, tive um insight. “Encontrei a jornada do herói em Game of thrones”, eu pensei. Não é um personagem que é o herói. São os humanos. Os humanos todos são o herói da jornada. E não se movimentam com as pernas, e sim com os grupos de gente. Enquanto ficam se remexendo entre eles para o sul da muralha, recebem o chamado para a aventura, logo na primeira cena, que é investigar os caminhantes brancos. Num primeiro momento — e em muitos momentos durante a série — há a negação. Gente que acha que se trata de histórias contadas pelas amas etc. Mas, a Patrulha da Noite faz os humanos partirem para a aventura. E, no final de GOT, finalmente enfrentam o último monstro, o último desafio, o último inimigo. A morte. E vencem. Mas e a batalha de Daenerys com Cersei, no final? E todo aquele fogo, aquela queimação? Disso eu gostei. Gostei muito dessa atitude de Daenerys. Não que eu tenha achado bonita né, não é isso. Mas, foi importante. Foi coerente com a evolução da personagem. Mesmo que eu não tenha assistido a maior parte das temporadas. Será que faz sentido eu estar fazendo esse tipo de análise sem ter assistido a tudo? Sim, faz. Quer ver? Vamos lá. Ainda preciso descobrir como encaixar “Daenerys x Cersei” em minha teoria sobre a jornada do herói em GOT. A explicação estará no próximo parágrafo, eu tenho fé. Simbora.

Isso. Cersei representa a negação da morte. Ah, sei lá, Cersei não foi lá ajudar na luta contra os caminhantes brancos, então tem mais é que morrer mesmo, mesmo que tenha morrido todo mundo de Casterly Rock. Eu poderia ter finalizado o texto antes de levantar essa questão sobre o papel do combate entre as duas na jornada do herói. Esse texto todo, nesse momento, me parece um grande desperdício de tempo. Mas, veja, não é. Trata-se, sobretudo, da minha própria jornada do herói.

Agora sim!

Recebi o chamado. Escrever sobre a Jornada do Herói em Game of Thrones. A princípio, recusei. “Não sei se estou pronto”. Mas, algo aconteceu e eu finalmente vim para essa aventura. No final, encontrei o meu último inimigo: a dúvida. A incoerência. Uma peça faltando para completar o quebra-cabeça. Meu último quebra-cabeça é o vazio. Uma imprecisão. Uma inconstância. Como posso vencer isso?

Não sei. Ainda estou na minha Jornada do Herói.

Bela resposta. Venço o inimigo com ela. Volto para casa. Pronto. Jornada cumprida.

Foda-se a jornada do herói. Game of Thrones é muito bom.

E ponto final.

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Jean Prestes
Onirika
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Produzo conteúdo para humanos, não para algoritmos.