Não é a consciência que está na cabeça, é a cabeça que está na consciência

E esse erro de perspectiva pode ser a causa raiz de todos os tipos de sofrimento, sabia?

Jean Prestes
Onirika
6 min readMar 1, 2022

--

Photo by ABDALLA M on Unsplash

Que conversa de maluco, né? Não, não, veja só.

O que a Neurologia já descobriu é que a realidade é uma espécie de simulação criada pelo cérebro.

Claro, porque a realidade inteira nos é revelada pelos sentidos, sim? Então, vamos dar uma observada no principal deles: a visão.

Como a visão acontece?

Photo by Perchek Industrie on Unsplash

Primeiro, é preciso luz. Sem luz não há visão.

Então, a luz incide sobre um objeto, digamos, uma bola.

Mas, antes de aquela bola refletir a luz no sentido do seu olho, ela não é uma bola, pelo menos não como a visão te mostra. É que a visão só se completa quando a luz refletida pela bola incide sobre a retina dos seus olhos, fazendo com que células receptoras levem esse estímulo elétrico através de neurônios até o cérebro, onde o estímulo será interpretado e uma imagem será construída.

Isso mesmo, construída. Só aí é que passa a existir a bola como a sua visão percebe.

E antes disso, o que a bola é?

Quem sabe?

Photo by Joshua Hoehne on Unsplash

Dependendo dos atributos atômicos do objeto ele vai refletir um espectro diferente da luz. Se ele tiver atributos que o façam absorver toda a luz incidida, se apresentará como preto. Se ele tiver atributos que façam com que ele reflita toda a luz incidida, se apresentará como branco. Antes da luz completar todo o processo até ser interpretada pelo cérebro e ter uma imagem montada, o objeto é branco ou preto? Nem um, nem outro.

Com os outros sentidos não é muito diferente.

Exemplo: o tato.

Photo by Jackson David on Unsplash

O tato é muito louco, porque um átomo é 99,9999% espaço vazio. Além disso, átomos não se tocam, porque sua configuração eletrônica não permite. Sendo assim, nós jamais estamos tocando um objeto. A aproximação entre os átomos da nossa mão e os átomos do objeto geram um estímulo elétrico recebido pelas células táteis, enviado através dos neurônios até o cérebro, que cria a impressão do tato, a sensação de que estamos tocando algo.

Muito doido, sim?

Audição, paladar, olfato, tudo se trata de estímulos elétricos sendo levados ao cérebro, o grande construtor dessa simulação neuroeletrônica na qual vivemos e chamamos de realidade.

Mas, se o cérebro cria a realidade…

… Quem cria o cérebro?

Photo by Natasha Connell on Unsplash

Esse é o pulo do gato que a Neurologia ainda não deu, mas a vertente mais profunda da religião mais antiga da humanidade parece já ter dado há muito, muuuuuito tempo.

Estou falando do Advaita Vedanta, cuja origem está relacionada aos trabalhos de Shankara, datados entre os anos de 788 e 820 d.C.

O Advaita, cuja tradução é “não-dois” ou “não-dualidade”, é uma das três escolas de Vedanta do pensamento monista hindu.

Acontece que o conceito de Brahman, tido para o Hinduísmo como o Ser, único, divino, essência de tudo que há no universo, tem sido traduzido pelos autores modernos influenciados pelo Advaita Vedanta simplesmente como:

Consciência.

Photo by Dollar Gill on Unsplash

Em geral, para os psicólogos, psiquiatras, neurologistas e até filósofos convencionais, a consciência é uma qualidade da mente, que torna o indivíduo capaz de perceber a relação entre si e o ambiente.

Mas se a mente existe primeiro e tem a consciência como uma mera qualidade secundária, como a mente poderia existir sem uma consciência para percebe-la?

Como qualquer coisa poderia existir sem a consciência para percebe-la?

Imagine que a consciência não existe. Algo poderia existir?

Não, né?

Imagine que você pudesse ter acesso ao maior tesouro, à maior riqueza do mundo, seja ela qual fosse. Você aceitaria ter acesso a esse tesouro em troca da sua consciência?

Não, né?

Isso nos mostra que a consciência é não só anterior a tudo o que possa existir, mas também mais valiosa do que qualquer riqueza que se possa conceber.

É o Brahman, o Ser, o Tao, Buda, Deus. Essência de todo o universo. Palco e matéria-prima de toda a criação.

Photo by Gabriel Testoni on Unsplash

O que a mente e os sentidos fazem não é produzir a consciência. Em verdade, mente e sentidos surgem no campo da consciência e o recheiam com todos os fenômenos perceptíveis que formam o que chamamos de realidade, seja a realidade em vigília ou a realidade onírica, a dos sonhos.

O que acontece durante o sono profundo, então, não é ausência de consciência, mas a consciência da ausência. É a consciência pura, sem nenhum fenômeno para ser percebido.

O seu corpo é feito de consciência. A sua mente é feita de consciência. Seja lá a que você se refere quando usa o conceito “eu”, isso também é feito de consciência.

Consciência é a essência do que você é.

Photo by Juan Gomez on Unsplash

Quando isso não é percebido, ou seja, quando você acha que você é o seu corpo, que você é a sua mente e seus pensamentos, que você é essa palavrinha “eu”, você sofre.

Identificado com seus pensamentos, você acredita nos conflitos produzidos por ele. Identificado com a sua personalidade, você sofre com as frustrações de quando ela não atende às suas expectativas ou quando você não consegue controle completo sobre suas ações e emoções.

Quando você se reconhece como consciência, o sofrimento desaparece, pois, repare, a consciência é intocável, inabalável, não machucável. Apenas os fenômenos produzidos pelos sentidos, entre eles corpo, mente e “eu”, podem sofrer alterações, transformações, dores e prazeres.

Quando afirmamos que tudo muda, tudo está em constante transformação, há uma meia verdade nisso.

Porque, sim, desde que você se conhece por gente, seu corpo se transformou completamente, assim como seus pensamentos, ideias etc.

Mas…

Se você reparar bem, verá que a consciência, a pura capacidade de perceber as coisas, continua intacta. O que é percebido sim, muda. Mas a capacidade de perceber, o palco das transformações, é inabalável, eterno, imutável, sem cor, forma, tamanho, infinito. A mais pura e inabalável paz.

Photo by Sixteen Miles Out on Unsplash

Portanto, quando surgir um incômodo, quem está percebendo esse incômodo? Quando surgir uma dor, quem está percebendo essa dor?

Incômodo, dores, pensamentos, transtornos, conflitos, medos, e todo tipo de emoção, são sinais, pixels que surgem na simulação-realidade que ocorre na consciência que você é.

Você é infinito e intocável em sua essência.

Perceber isso, realizar que não só a sua cabeça, mas todo o seu corpo e personalidade são fenômenos efêmeros da consciência, do Ser, de Brahman, pode ser o segredo para a paz absoluta.

E não é algo que você precisa praticar para reconhecer. Não é algo que está disponível no futuro, uma “iluminação” que virá depois de muita disciplina.

Nada disso.

Está sempre presente. Aqui. Agora. Em todo lugar.

Afinal, onde a consciência não está?

Procure.

Photo by Brett Jordan on Unsplash

--

--

Jean Prestes
Onirika

Produzo conteúdo para humanos, não para algoritmos.