Reorganização Pessoal

O que eu quero reorganizar e por que me refiro a mim como uma pessoa?

Jean Prestes
Onirika
4 min readMay 31, 2022

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Photo by Houcine Ncib on Unsplash

Até que ponto as nossas novas crenças, percepções, valores, desejos e objetivos conseguem transpor a grossa casca psíquica formada por toda velharia com a qual fomos “criados”, condicionados?

Coloquei isso como uma tarefa para mim hoje, pela manhã: reorganização pessoal. Li essa expressão-chave da tarefa e fiquei um pouco perdido sobre o que eu realmente queria fazer ao definir isso para mim. Seria novamente criar um plano mirabolante e megalomaníaco do tipo começar a construção de um novo sistema econômico na Terra pautado na liberdade, autonomia e autorrealização? Ou seria avaliar cada área da minha vida, colocar um peso de importância para cada uma delas, transformar isso numa planilha, dar uma nota para cada aspecto, calcular as prioridades e o que precisa ser feito primeiro para aumentar minha média geral? Ou seria utilizar o Dragon Dreaming para inventar/canalizar um sonho grandioso em torno do qual eu construiria um plano de ações? Todas essas coisas já funcionaram para mim em algum momento da vida. Por um tempo…

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O que eu quero realmente organizar? O que está desorganizado? De onde vem essa sensação de que algo está desorganizado? Quem sou eu para definir, diante da imensidão e da suposta caótica organização do universo, o que está desorganizado? Quantas “desorganizações” não estão acontecendo e que estão contribuindo em alguma coisa com algo? Por que acho eu que deveria mover pauzinhos com a força da vontade, impor as minhas querências no mundo das ações, para “manifestar” os meus desejos, provavelmente egóicos, na Terra ou no meu campo de consciência? Eu acredito em uma espécie de força maior que guia a minha vida — quer eu queira quer não — que guia tudo o que acontece, confio e já testei a estratégia taoísta do Agir pelo não agir. Deixar de ser um ego pensante/escolhedor para ser um cosmo pensado/guiado. Mas o tempo todo existe uma voz me dizendo que eu preciso fazer alguma coisa. Que o futuro é perigoso. Que o dinheiro pode acabar. Que meu filho pode passar privações. Que eu preciso garantir uma vida digna para ele, para que eu não só me sustente como possa garantir as condições para que ele não só se sustente mas possa acessar tudo do melhor que seja necessário para desenvolver seus talentos e suas aptidões no mundo, desde o começo, conforme os sinais que ele me apresente, sem forçar nada, apenas facilitar. Por via das dúvidas, em vez de reorganizar qualquer coisa, vim aqui escrever.

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E veja, nem vou divulgar esse texto porque não ando divulgando mais meus textos aqui. Vez ou outra alguém lê, aplaude, comenta, passa a me seguir, e isso me deixa incrivelmente contente. Isso aqui é um espaço de depósito de coisas, mas também é um botão que se liga quando eu começo a escrever e gera uma linha de raciocínio suavemente caótica. É divertido e pronto. Sem um propósito maior que isso. Não preciso que seja lido por muita gente, mas preciso que esteja público e sob risco de que alguém leia. Porque sou muito observador e introspectivo e talvez gente assim tenha facilidade para sufocar aspectos da personalidade no mar de dentro, e aí quando escrevo sai um monte de coisa que parece que não sou eu, ou um eu que não quero mostrar para todo mundo. Eu gosto um pouco de me esconder em mim, ficar aqui guardadinho e protegido. É bom.

Mas vamos lá, “pessoal”. Eu já não estou cansado de saber que essa sensação de que eu sou uma “pessoa” é não só ilusória como responsável pela maior parte ou talvez todos os meus conflitos psíquicos que repercutem na minha vida prática e objetiva? Mas aí vem aquilo. Esse aprendizado de que a pessoa é uma construção psicológica formada pela montagem inexata de uma autoimagem, um personagem com o qual eu me identifico, esse aprendizado me foi entregue pelo Advaita Vedanta há uns 5 anos. O ensinamento de que eu sou uma pessoa me foi dado diariamente, cotidianamente, ininterruptamente, e continua sendo dado, pelo fucking mundo inteiro. Como eu me descondiciono de vez dessa perspectiva limitada e instalo completamente a percepção de que só há uma consciência, preenchida por experiências, e que eu sou isso tudo? Tô cansado de saber disso. Taoísmo + Advaita. Mas fico aqui, me colocando uma tarefa de “reorganização pessoal”. É muita falta de juízo, inconsciência e ignorância. Mas mesmo esse intercalar entre luz e escuridão parece ser a máxima do universo, de modo que desejar uma experiência estável e iluminada me parece um pensamento nascido justamente em um momento de escuridão. Na luz mesmo, na luz real, não se quer nada, aparentemente. E essa luz real, supostamente, está aqui presente o tempo todo. Um campo de consciência iluminado pelo Sol. Mais nada. Estamos aqui. Somos. Somos e Estamos. O que mais posso querer?

Reorganização pessoal. Foda-se.

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Jean Prestes
Onirika

Produzo conteúdo para humanos, não para algoritmos.