Doc colaborativo sobre a greve dos caminhoneiros

O que isso tem a ver com novas economias?

Alex Bretas
Oniversidade
8 min readJun 4, 2018

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Pergunta geradora: O que podemos aprender com a crise causada pela greve dos caminhoneiros, no contexto das novas economias?

Para responder a essa pergunta, as pessoas participantes da Comunidade Novas Economias se organizaram em um hackathon no dia 26/05/18 com o objetivo de refletir sobre os acontecimentos no país e gerar informação qualificada sobre o tema.

1. O PROCESSO DE DESCOBERTA

Qual foi o formato do hackathon?

Um learning sprint de 3 horas, das 10h às 13h, em 3 turnos de 45min.

Qual foi o resultado?

FAQ da Greve dos Caminhoneiros, compartilhado nesse documento com as principais informações sobre o que aconteceu.

Como foi organizado o learning sprint?

1. Brainstorm de perguntas (O que eu quero descobrir?) e brainstorm de fontes de pesquisa (Onde posso conseguir informação qualificada?) (mural de post-its)

2. Formação de trios ou quartetos

3. Grupos selecionam quais perguntas vão querer atacar (até 3 perguntas por grupo para começar).

4. Turno 1 (45 min)

5. Turno 2 (45 min)

6. Turno 3 (45 min)

7. Finalização do doc compartilhado (15 min)

8. Reflexão coletiva (foco: novas economias) (30 min) (círculo)

Quais foram nossas premissas?

  1. Cuidado com fake news! — checar os fatos antes de dizer que aconteceu.
  2. Reconhecer que existem múltiplas perspectivas sobre o tema.
  3. Não é só coletar informação, mas também refletir criticamente.

Algumas das fontes consultadas foram:

El País, The Guardian, BBC Brasil, Nexo Jornal, Revista Piauí, Outras Palavras, SCIELO, Google Acadêmico.

2. DOC COLABORATIVO SOBRE A GREVE DOS CAMINHONEIROS

2.1 Quais foram os antecedentes da paralisação?

Outubro de 2016 — Após alteração da presidência, houve uma mudança na política de preços praticada pela Petrobrás, que passou a estar baseada na cotação internacional do barril de petróleo. (https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/05/22/Por-que-a-pol%C3%ADtica-de-pre%C3%A7os-da-Petrobras-est%C3%A1-em-xeque)

20 de julho de 2017 — aumento do PIS/COFINS que incide nos combustíveis. (http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2017-07/governo-divulga-aumento-de-aliquota-do-piscofins-sobre-combustiveis)

10 de maio — Paralisação agendada pelas redes, mas não houve adesão. (http://piaui.folha.uol.com.br/falta-combinar-no-whatsapp/)

11 de maio — maior preço do diesel desde meados de 2017. (https://brasil.elpais.com/brasil/2018/05/25/politica/1527281155_879383.html)

16 de maio — CNTA — Confederação Nacional dos Trabalhadores Autônomos pediu audiência emergencial com o governo federal. Não foi atendida.

(https://brasil.elpais.com/brasil/2018/05/25/politica/1527281155_879383.html, https://theintercept.com/2018/05/25/caminhoneiros-avisaram-governo-de-greve/)

21 de maio — Petrobrás anuncia aumento do preço do diesel em 0,97% — passando a custar 2,3716 — começando a valer em 22 de maio. (https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2018/05/21/petrobras-aumento-gasolina-diesel-refinarias.htm)

21 de maio — Início da paralisação por caminhoneiros autônomos organizados em grupos de Whatsapp — (http://dc.clicrbs.com.br/sc/noticias/noticia/2018/05/greve-dos-caminhoneiros-nasceu-em-grupos-do-whatsapp-dizem-motoristas-10354868.html)

2.2 Quais são as principais reivindicações dos caminhoneiros?

As principais preocupações por trás da crise são:

  • Aumento dos preços do diesel.
  • Baixo valor dos fretes.
  • Cobrança de pedágio sobre eixo suspenso.
  • Falta de diálogo por parte do governo.
  • Falta de um marco regulatório para os caminhoneiros.

(https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/05/24/Como-o-protesto-de-caminhoneiros-abalou-o-Brasil-em-4-dias; http://www.bbc.com/portuguese/brasil-44205870; https://www.cartacapital.com.br/economia/o-que-querem-os-caminhoneiros-em-greve)

Os caminhoneiros pedem:

  • a redução da carga tributária incidente sobre operações com óleo diesel a zero, sendo elas as alíquotas da contribuição para PIS/PASEP — e Cofins — incidentes sobre a receita bruta de venda no mercado interno de óleo diesel a ser utilizado pelo transportador autônomo de cargas;
  • a isenção da contribuição de intervenção no domínio econômico — CIDE, incidente sobre a receita bruta de venda no mercado interno de óleo diesel a ser utilizado pelo transportador autônomo de cargas;
  • a revisão da política de preços da Petrobrás.

(http://www.abcam.org.br/index.php/pt/noticias/522-nota-oficial-paralisacao-nacional-dos-caminhoneiros-autonomos)

2.3 Quem representa os caminhoneiros?

Quem começou a greve foram os caminhoneiros autônomos. Não há uma organização que centralize a representação desses caminhoneiros e que consiga falar sozinha em nome da categoria. No entanto, algumas apresentaram certo protagonismo na situação atual:

CNTA — Com intuito de melhorar a representação dos caminhoneiros, a FENACAM — Federação Interestadual dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens, a FETRABENS — Federação dos Caminhoneiros Autônomos e Cargas em Geral do Estado de São Paulo e a FECONE — Federação Interestadual dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Cargas e Bens da Região Nordeste se uniram e fundaram, em 5 de junho de 2012, a CNTA — Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos, cujo presidente é Diumar Bueno.

(https://www.cntabr.org.br/QuemSomos)

ABCAM — Fundada em julho de 1983, na cidade de São Paulo, do ideal de um grupo de caminhoneiros liderados por José da Fonseca Lopes, a ABCAM — Associação Brasileira dos Caminhoneiros — tem pautado toda sua existência na defesa constante, árdua e muitas vezes incompreendida dos direitos dos caminhoneiros autônomos. Em 2003, teve sua liderança reconhecida nacionalmente, passando a fazer parte integrante da 3ª Seção do Transporte de Cargas da CNT e dos Grupos Paritários de Trabalho (GPTs) que passaram a deliberar sobre o transporte de cargas e a situação logística do país. Diz representar 650 mil caminhoneiros.

(http://www.abcam.org.br/index.php/pt/abcam)

UNICAM — A União Nacional dos Caminheiros (UNICAM) é uma entidade de classe de âmbito nacional fundada em 1998, cujo objetivo é defender os direitos e interesses referentes à atividade dos caminhoneiros autônomos e microempresários, visando o desenvolvimento e aprimoramento do transporte rodoviário de cargas no país.

CNT — patronal — A CNT (Confederação Nacional do Transporte) é a entidade máxima de representação do setor de transporte e logística e tem como missão apoiar o desenvolvimento e atuar na defesa de seus interesses. Oficialmente não está apoiando, participando ou incentivando a greve.

(http://www.cnt.org.br/imprensa/noticia/nota-imprensa-cnt-nao-participa-nao-incentiva-nao-apoia-greve)

2.4 Quais os canais de comunicação do movimento?

Sabe-se que existem ao menos quatro grupos de whatsapp: “Brasileiros/Caminhoneiros” — 252 integrantes; “Ajudando Caminhoneiros”; “Lutar pelo Melhor”; “ Caminhoneiros pelo Brasil” — 200 integrantes

O caminhoneiro conhecido como “Ferro Velho”, um dos organizadores dos bloqueios em Jacareí, em São Paulo, na Rodovia Presidente Dutra, que liga São Paulo e Rio de Janeiro, afirmou que “cada bloqueio tem seu líder”.

(http://piaui.folha.uol.com.br/falta-combinar-no-whatsapp/)

2.5 Como as forças de segurança estavam agindo?

Essa foi a primeira vez que Garantia da Lei e da Ordem (GLO) é utilizada em todo o território nacional, autorizado em 25 de maio até 4 de junho. Isso significa que o Exército, a Polícia Federal e a Força Nacional passam a ter as mesmas funções que as polícias, com a missão principal de desbloquear todas as rodovias federais no país. A decisão foi do Ministro do STF Alexandre de Moraes que autorizou o governo a remover manifestantes que estejam bloqueando vias ou protestando nos acostamentos, com possibilidade de impor multa de até R$100 mil por hora aos manifestantes.

“As operações de Garantia da Lei e da Ordem, tal como existem hoje, foram criadas por uma lei de 1999, editada durante o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Segundo a lei, cabe ao presidente da República decretar a operação, sempre que estiverem ‘esgotados os instrumentos (polícia, bombeiros etc) destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio’”.

(http://www.bbc.com/portuguese/brasil-44248222)

A Polícia Federal instaurou 37 inquéritos para apurar locaute. A Polícia Rodoviária Federal emitiu 400 autos de infração no valor total de R$ 2,03 milhões, sem incluir as multas de R$ 100 mil por hora determinadas em decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Operações para garantir serviços essenciais, como hospitais foram realizadas com escoltas de caminhões-tanque em ao menos sete estados.

(https://g1.globo.com/economia/noticia/forcas-de-seguranca-escoltam-caminhoes-para-garantir-abastecimento-de-combustivel.ghtml)

O Secretário de Segurança Pública de São Paulo propôs acordo com caminhoneiros — suspensão da cobrança do eixo suspenso, para liberar as vias bloqueadas. Disse ainda que iria fazer uso progressivo da força, e movimentou escolta para entrega de combustível em aeroportos de São Paulo.

(https://g1.globo.com/sp/sao-paulo/noticia/governo-de-sp-diz-que-vai-desbloquear-vias-interditadas-sem-uso-da-forca.ghtml)

2.6 Como acabou a crise?

Em 24/05/2018, foi assinado uma proposta de acordo com o Governo Federal por parte das entidades apoiadoras da greve:

  • Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA);
  • Confederação Nacional do Transporte (CNT);
  • Federação dos Caminhoneiros Autônomos de Cargas em Geral do Estado de São Paulo (Fetrabens);
  • Sindicato dos Transportadores Rodoviários Autônomos de Bens do Distrito Federal (Sindicam-DF);
  • Sindicato Nacional dos Cegonheiros (Sinaceg);
  • Federação Interestadual dos Transportes Rodoviários Autônomos de Cargas e Bens da Região Nordeste (Fecone);
  • Federação dos Transportadores Autônomos de Cargas do Estado de Minas Gerais (Fetramig);
  • Federação dos Transportadores Autônomos de Carga do Espírito Santo (Fetac-EC);

Estavam presentes na reunião e não assinaram: União Nacional dos Caminhoneiros e ABCAM.

(https://g1.globo.com/politica/noticia/governo-faz-proposta-para-suspensao-da-paralisacao-dos-caminhoneiros.ghtml)

3. ÁREAS RELEVANTES PARA PENSAR AS NOVAS ECONOMIAS

  • Existe a necessidade de descentralização da distribuição e o avanço na agenda da construção de cidades autossustentáveis, com incentivos à produção local e formas de transporte menos dependentes de combustíveis fósseis ou álcool.
  • Existe também a necessidade de acelerar a implantação de transportes intermodais e exigir planos de contingência para setores críticos do país (nacional, estadual e municipal).
  • A atuação das mídias e redes sociais nesse episódio dificultou o acesso à informação qualificada pela população, com pulverização da informação colocando em cheque a representatividade do movimento e dificultando a atuação de entidades representativas. Houve uso das redes para fortalecimento das pautas menores e descentralizadas, mais uma vez com proliferação de Fake News e polarização entre apoiadores do governo e apoiadores do movimento, espalhando pânico em meio à população. O comportamento consistente da mídia de massa (Rede Globo e demais veículos) em reportar prateleiras vazias, filas em postos de combustíveis e falta de mantimentos em hospitais alarmou a população, afetando o comportamento cotidiano nas grandes cidades e gerando um clima geral de desconfiança. É necessário repensar o papel das mídias na construção da realidade simbólica coletiva.

4. BALANÇO FINAL

No chinês, os mesmos ideogramas que representam a palavra crise também compõem a palavra oportunidade. Este episódio impacta as relações humanas nas esferas de trabalho, governo e sociedade e atestam a necessidade de reflexão de novos meios de organização, tomada de decisão, representatividade, geração de valor, geração e uso de energia e sobretudo, visão de mundo. Como este movimento contém múltiplos atores envolvidos é difícil ter dimensão e controlar as informações pela pulverização no tecido social, assim como organizar o conteúdo divulgado pelos meios de comunicação oficiais e extra-oficiais para formar uma opinião condizente com algo complexo e singular.

Na presença do menor traço de crise, a mídia de massa reportou o caos e a escassez, e boa parte da população aderiu a essa mentalidade construindo estoques particulares, enquanto a polarização crescia e os grupos se dividiam em realidades individuais e movimentos de menor escala. O Brasil se mostrou frágil diante da pouca diversidade de transporte, pólos de distribuição da produção e escoamento dos bens, e mentalidade coletiva da população. Um plano de transição para um modelo auto-sustentável de longo prazo deve passar por esses pilares, que transcendem a questão imediata dos impostos sobre o combustível.

PESQUISADORES

  • Miriam Cruz
  • Luiz Alcantara
  • Louise Nazareth
  • Frederico Godoy
  • Jade Chaib
  • Camila Melo
  • Lilian Otuka
  • Aline Lima
  • E contribuições muito especiais de Merikol Duarte, Maria Thereza do Amaral e Priscila Freitas (edição final) ;)

FONTES CONSULTADAS

https://gauchazh.clicrbs.com.br/geral/noticia/2018/05/greve-dos-caminhoneiros-esta-organizada-em-tres-camadas-cjhjgj9ax07ip01paqk4i6dvb.html

https://g1.globo.com/politica/noticia/temer-e-ministros-se-reunem-no-planalto-para-reuniao-que-monitora-greve-dos-caminhoneiros.ghtml

https://g1.globo.com/politica/blog/andreia-sadi/post/2018/05/26/planalto-discute-novas-medidas-para-conter-greve-dos-caminheiros.ghtml

https://www.metropoles.com/brasil/caminhoneiros-planalto-edita-decreto-e-tropas-federais-saem-as-ruas

https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,greve-de-caminhoneiros-nasceu-em-grupos-do-whatsapp-dizem-motoristas,70002324146

https://blogdosakamoto.blogosfera.uol.com.br/2018/05/25/com-organizacao-via-whatsapp-caminhoneiros-atropelam-acordo-com-temer/

https://www.portalt5.com.br/noticias/brasil/2018/5/96293-ministro-diz-que-grupos-de-whatsapp-impediram-fim-da-greve

https://www.nexojornal.com.br/expresso/2018/05/25/Como-a-greve-de-caminhoneiros-%C3%A9-lida-pela-esquerda-e-pela-direita

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Alex Bretas
Oniversidade

Alex Bretas é escritor, palestrante e fundador do Mol, a maior comunidade de aprendizagem autodirigida do Brasil. Saiba mais em www.alexbretas.com.