Matriz CSD no processo de pesquisa e desenvolvimento de produtos

Anna Muniz
OPANehtech
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9 min readJan 6, 2020

O propósito do artigo é trazer a importância da matriz CSD no processo de pesquisa e desenvolvimento de produtos. Essa metodologia é usada pelas áreas de design e pesquisa. Na sequência, vamos explicar como construir uma matriz CSD ao longo de um projeto, a partir da nossa experiência no Banco PAN.

Qual o contexto de utilização de uma matriz CSD?

A matriz pode usada em estudos exploratórios, por exemplo, quando se deseja entender o comportamento de um determinado público em um momento de consumo. Nesse caso, a matriz CSD é feita na etapa inicial do projeto, em que se alinha as expectativas dos stakeholders e também se obtém o posicionamento dos times sobre aquele projeto, ou seja, as questões que precisam ser respondidas. Aqui no Banco PAN usamos a matriz CSD no início de praticamente todos os projetos. É um momento importante para chegar a um consenso sobre o que já se sabe, o que queremos confirmar e o que queremos saber.

A matriz CSD também é muito útil para consultores que iniciam um projeto no banco. Nessa etapa de imersão o consultor entende qual o problema de pesquisa e onde irá atuar no projeto do produto além de definir a abordagem necessária e as técnicas que vai utilizar.

Quando estamos falando do desenvolvimento de um produto, a matriz CSD é usada na fase de definição, antes da realização de qualquer pesquisa, e no refinamento, com o incremento no produto. Conforme testamos os protótipos e captamos as percepções e questionamentos dos clientes nos testes de usabilidade, as respostas se tornam insumo para novas matrizes CSD.

O time de design do PAN diz que a matriz CSD acompanha um roadmap de um produto e vai evoluindo junto com ele. A natureza das dúvidas muda. Elas se tornam mais profundas. Os cenários podem mudar, mudando também as certezas. Assim, a matriz CSD evolui com o produto e o seu ciclo de vida.

Muitas certezas que se tem vão transitar por um produto e não somente para o projeto em si. É legal ver como a matriz evolui”, diz Eric Platas, designer do PAN.

Por quê ela é importante no processo de design e de pesquisa?

A matriz CSD é importante para alinhar as expectativas dos stakeholders. Com ela entendemos quais são as dúvidas que não podemos deixar de responder para cada área que irá consumir os resultados do estudo.

Além de definir as prioridades, ela é útil para definir o direcionamento de uma pesquisa de caráter exploratório. Quando o estudo é amplo, é preciso começar de algum ponto.

Em um estudo de comportamento por exemplo, podemos começar perguntando quem é o seu público, o que você conhece sobre ele e o que você gostaria de saber mais / detalhar / aprofundar.

A listagem das certezas traz à tona o que é certo e confirmado e o que é baseado em suposição, dado qualitativo isolado ou experiência prática e que precisa de uma confirmação quantitativa.

A pergunta sobre o que se quer saber mais ou confirmar ajuda muito a emergir as suposições e as dúvidas.

Conduzindo a dinâmica “O que já sabemos”, “O que queremos confirmar”, “O que queremos saber”.

Gosto de começar apresentando o projeto. Coloco todos na mesma página e explico o objetivo daquela dinâmica e ressalto a importância de ouvir a contribuição de todos para aquele projeto.

Segue-se à dinâmica, que começa com a explicação de como ela vai funcionar. Trazemos algumas perguntas como: Qual a sua expectativa com esse projeto? O que você espera dele?

Lembre-se de que alguém precisa tomar nota das falas dos participantes. Ou então, distribua post-its e caneta aos participantes e peça para que escrevam uma expectativa em cada post-it.

Quando entramos na fase de construção da matriz em si, podemos fazer isso de diversas formas, mas basicamente procuramos extrair o que se tem como certeza, quais são as suposições ou hipóteses que se quer confirmar e o que se quer esclarecer, descobrir ou aprofundar. O predicado dessa frase pode ser um produto, uma área, um segmento do negócio ou um perfil de público específico.

Você vai se deparar com afirmações do tipo “Não conhecemos o nosso cliente” O que pode parecer um ato de humildade a princípio, pode também ser a resposta mais simples e fácil de se dar. Afinal, algo sempre se sabe, ou se supõe, já que é com este público que se tem trabalhado. Então, é preciso entender o que se sabe, o que se aprendeu com o trabalho feito até aqui.

Você também pode encontrar dificuldades de arrancar certezas do seu interlocutor. Afinal de contas, pode haver um medo de se comprometer com aquela verdade, e isso pode ser difícil para alguns grupos.

Rômulo Azevedo, designer e researcher do PAN nos contou

Acontece comigo com frequência, as pessoas não querem trazer suposições, tem medo de arriscar na CSD, deixando sob a responsabilidade do pesquisador criar as hipóteses, quando na realidade é exatamente esse o objetivo da CSD: conseguir trazer suposições para poder ter uma confirmação. Por exemplo, quando alguém levanta uma dúvida “o cliente gostaria de ser atendido em todos os canais?” Isso é uma dúvida? Vamos elaborar e transformar isso em uma suposição.

No caso de produtos, é mais comum uma matriz com mais suposições para se confirmar, já que se existe uma iniciativa de desenvolvimento de um produto, ela partiu de alguma suposição, que surgiu de conhecimento prévio vindo uma desk research, um monitoramento de mercado ou um insight.

No caso de uma pesquisa mais ampla, com o objetivo de conhecer públicos, mapear jornadas e comportamentos, a matriz CSD costuma trazer mais dúvidas.

Em geral, poucas questões vão parar na coluna de suposições. Nós do time de design acreditamos que uma das razões para isso pode ser uma dificuldade com o conceito de hipótese.

Algumas pessoas tem dificuldade de entender o que é uma hipótese e como construir uma. Diz Luciano Infanti, designer do PAN.

Enquanto isso, outros tem mais dificuldade de assumir que tem dúvidas. Por exemplo, se estamos falando com diretores, superintendentes, CEOs, a posição exige ter mais certezas o tempo inteiro. Para estes, ver-se em uma situação de expor dúvidas pode ser desconfortável.

De toda forma, podemos ajudar os participantes a construírem suas hipóteses durante a dinâmica. Elas são as nossas apostas, ou seja, aquilo que acreditamos que acontece com o mercado, o público, ou o produto a partir de determinado cenário ou contexto ou intervenção.

Por exemplo: “o produto que vamos desenvolver vai suprir uma demanda reprimida por crédito no mercado. Vamos conseguir aumentar a nossa receita em 30%”. Ou ainda, “o nosso cliente prefere o atendimento humano porque tem dificuldades de acesso à internet no celular, devido ao tamanho pequeno das letras”.

Ao fim das reuniões, é importante perguntar aos participantes o que é imprescindível saber, ou então, se for necessário priorizar alguma dúvida ou hipótese, o que não podemos deixar de investigar. Também procuramos priorizar as questões que mais surgiram, as mais frequentes e em todos os grupos.

Como conduzir a dinâmica da matriz CSD?

Mulher conduzindo uma dinâmica da matriz CSD, apontando para os postits. Na mesa estão 4 pessoas prestando atenção.

Podemos conduzir a dinâmica em um único grupo, mais comum quando estamos falando de um projeto de desenvolvimento de produto. Nesse caso, convidamos representantes de várias áreas. Ou podemos fazer grupos distintos. Procuramos envolver participantes de todos os perfis de atuação e interação com o produto: analistas, P.Os, P.Ms, coordenadores, gerentes, diretores.

É legal aproveitar a matriz CSD para colocar todos na mesma página. Como fazer isso? Colocando pessoas de áreas e níveis diferentes na mesma sala pode ser positivo para circular o conhecimento e o que era uma dúvida para alguns pode ser esclarecida e ir para a coluna das certezas.

Por outro lado, pessoas de níveis hierárquicos muito diferentes em uma mesma reunião pode resultar em uma inibição de alguns quando colocados frente a um diretor, por exemplo. Um diretor a seu turno, pode se ver inibido a trazer dúvidas em frente a um subordinado. Além disso, as mesmas questões podem ser olhadas com vieses diferentes pelos players de diferentes níveis hierárquicos.

Fazer uma dinâmica com muitas pessoas, seja em uma única turma ou em várias turmas, pode ser complexo e mais demorado para o andamento do projeto. Mas eu sempre voto por dar voz a todas as áreas, permitindo que todos se apropriem do projeto e possam ter suas dúvidas ouvidas – e que depois devem ser devidamente respondidas e apresentadas aos donos.

Uma matriz viva: como usar a matriz durante o processo de design e pesquisa.

No processo de pesquisa quando se trata de um estudo exploratório, uma matriz CSD acaba se tornando insumo para o pesquisador responder algumas dúvidas do briefing e montar o seu roteiro de entrevistas ou questionário.

O pesquisador deve separar as questões que devem ser investigadas com que tipo de técnica: se uma entrevista em profundidade, grupos de discussão, safari, entrevistas contextuais, teste de usabilidade ou técnicas quantitativas como análise de dados ou pesquisa quantitativa.

O pesquisador também vai organizar as dúvidas e as hipóteses em uma ordem cronológica de investigação, do macro para o micro, em se tratando de um estudo exploratório, e clusterizar, ou seja, categorizar por temáticas e seus respectivos públicos.

No caso de um estudo com foco em produto, a matriz CSD é mais dinâmica: as hipóteses iniciais e as dúvidas são poucas, mas elas vão mudando a cada sprint de desenvolvimento, após cada teste de usabilidade e percepção dos usuários. No desenvolvimento de produto há questões que são respondidas com teste de usabilidade, mas há também dúvidas e suposições que precisam ser abordadas em entrevista em profundidade como teste de conceito e proposta de valor. Em alguns casos hipóteses que não puderam ser confirmadas em uma etapa qualitativa precisam ser investigadas em um estudo quantitativo, com validade estatística para garantir que deixem de ser hipóteses, de forma irrefutável.

Por exemplo, durante o desenvolvimento de um produto, investigamos qual seria o nosso maior diferencial frente aos concorrentes. Como não foi possível identificar um padrão nas respostas na etapa qualitativa, partimos para a pesquisa quantitativa, com representatividade estatística, junto à nossa base de clientes para obter a resposta.

O valor que se entrega e a matriz no fim do projeto

Dar o feedback para quem participou da dinâmica de construção da matriz.

Depois de realizados os testes e analisados os dados, é hora de apresentar os resultados.

E aqui fazemos um minuto de silêncio por todas aquelas fotos de matriz CSD postadas no LinkedIn e que nunca mais foram utilizadas novamente. Você vai fazer diferente!

Resgate a sua matriz CSD!

Uma boa forma de começar é pelas certezas.

Retomar as certezas apontadas inicialmente e ver como se correlacionam com os resultados da pesquisa”, diz Lia Castro, researcher do PAN.

As certezas podem ser fortalecidas e ganham mais embasamento, mais justificativas. Ou, de repente, surgem informações que transformam essas certezas em dúvidas (e aqui surge uma nova matriz CSD).

As dúvidas podem ser resgatadas Ipsis literis e respondidas de acordo com os achados.

A matriz CSD tem um passo a passo que recomendamos fortemente que seja seguido. E cujo resultado deve ser entendido como um avanço no conhecimento sobre um determinado objeto de pesquisa, mas que representa um momento específico do ciclo de vida de um produto.

Todos aqueles que contribuíram para a criação da matriz CSD devem receber um feedback dos resultados do estudo e das suas questões. Aqui no PAN, nós procuramos fazer apresentações dos resultados do projeto a todas as áreas envolvidas. Também procuramos deixar o documento resultante da pesquisa em um local acessível para consulta e ponto de partida para projetos subsequentes.

Vale lembrar que algumas dúvidas podem não ter sido respondidas num primeiro momento, mas não podemos esquecer delas, mantendo-as no radar para serem abordadas no futuro. Por fim, mas não menos importante, a matriz CSD ajuda a divulgar dentro da empresa a cultura da pesquisa e de design para os colaboradores.

Obrigado por ter chegado até aqui nesse post!

E aí, o que achou de nossas experiências com a matriz CSD?

Você já viveu situação parecida ou totalmente oposta? Conte pra gente nos comentários!

Um agradecimento especial ao Eric Platas, Rômulo Lima, Luciano Infanti, Lia Castro, Lindsay Bispo, Wagner Aquino, Jefferson Sestaro, Eduardo Matachun, pelas preciosas discussões que tornaram esse artigo viável.

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Anna Muniz
OPANehtech

Especialista em pesquisa, com experiência em diagnóstico e mensuração de marcas em mídias sociais e digitais. Ampliando os horizontes para UX research.