Vamos falar sobre NPS: talvez não estejamos fazendo isso direito

Eric Platas
OPANehtech
Published in
9 min readJun 15, 2020
A lição do Tamagotchi: mantenha seu cliente satisfeito

Quem cresceu nos anos 90 deve se lembrar do Tamagotchi, popularmente conhecido como bichinho virtual. Ele era um brinquedo que simulava um animal de estimação que o dono podia alimentar, dar banho, brincar etc. Aliás, não só podia, mas devia, pois se o seu bichinho ficasse insatisfeito por algum motivo, ele ficava triste, adoecia e até morria se o dono fosse muito negligente.

Produtos funcionam de forma muito parecida. Os clientes têm necessidades diferentes durante o ciclo de consumo e você deve responder a essas necessidades, ou sua relação pode se deteriorar facilmente. Diferentemente do Tamagotchi, seu cliente não está na palma da sua mão, pelo contrário, ele tem uma vida além do seu produto. Seu cliente pode consumir outros produtos e influenciar outras pessoas sobre qual produto elas devem escolher. Foi pensando nisso que Fred Reichheld criou uma forma para a avaliar o quanto os clientes estão dispostos a recomendar um produto, serviço ou empresa… o famoso NPS.

No Banco PAN o NPS é uma métrica muito importante, sendo considerada na estrutura de todos os produtos. Porém ao longo de algumas conversas com pessoas de diferentes setores do banco, percebi que existem diferentes opiniões sobre o assunto.

Esse artigo não tem o objetivo de ensinar a fazer NPS, nem mesmo de dar respostas definitivas sobre o assunto, embora eu espero iniciar uma discussão construtiva, que no final te ajude a compreender melhor alguns pontos. Quero agradecer a Lia Moraes Castro, Maísa de Melo Vieira e Anna Muniz por me ajudar a escrever este artigo.

O que é NPS?

O Net Promoter Score (algo como Pontuação Líquida de Promotor) é uma metodologia de pesquisa quantitativa com um campo aberto para feedbacks criada para medir quanto seus clientes estão dispostos a recomendar seu produto, serviço, empresa, etc. Essa metodologia enfatiza os clientes com potencial de promover seu produto contra aqueles que aqueles que o atacam e considera menos os clientes neutros, por isso "Pontuação Líquida".

Existe o NPS Relacional, que é uma métrica da marca ou seja da empresa como um todo. Ele é realizado periodicamente, para acompanhar o impacto das ações feitas dentro deste período. Existe também o NPS Transacional, que é realizado sempre após alguma transação (compra, contratação, atendimento etc) e costuma ser mais focado no momento que o cliente acabou de experimentar.

Eu não vou me aprofundar muito sobre a teoria por traz do NPS, pois esse não é o objetivo deste artigo. Se quiser saber mais, acesse alguns dos artigo abaixo:

Moving beyond the Net Promoter Score

Cada vez mais o NPS tem sido associado a uma métrica de experiência e satisfação de clientes. Muitas empresas definem metas anuais de NPS, com bônus de salário associados a ele, o que gera um grande esforço das equipes para apresentar números cada vez maiores.

Em seu artigo “How NPS Drives Profitable Growth” (Como NPS entrega crescimento lucrativo, em tradução livre) Fred Reichheld e Rob Markey descrevem como a Philips usou o NPS para comparar seus segmentos de mercado com a concorrência. Segundo eles, Gerard Kleisterlee, CEO da Philips, percebeu que o que importava mais não era ter um número ideal, mas que os segmentos de maior crescimento eram aqueles onde o NPS era maior que o dos concorrentes.

Em 2015, cerca de 60% do faturamento da Philips vinha de segmentos onde ela era líder e estava entre as primeiras posições de NPS. Com isso em mente a Phillips estabeleceu uma meta para seus executivos de que todos os seus segmentos de negócio buscassem ter o melhor NPS do mercado. Na opinião de Reichheld, os resultados financeiros de uma empresa estão diretamente relacionados à qualidade das relações entre a companhia e seus consumidores.

Faça bom uso do NPS

É verdade que o NPS é uma excelente ferramenta para promover a transformação das empresas. Também é verdade que um NPS com alguns defeitos é melhor que nada. Porém se usado de forma errada, ele pode se tornar ineficaz para promover a transformação necessária ou, no pior dos casos, pode até apontar a empresa na direção errada. Para ter um bom resultado evite cair nos seguintes cenários:

NPS como métrica de vaidade

Um erro comum das companhias é olhar para o NPS apenas como um número, ignorando a riqueza de informações que ele fornece e assim, não completando o processo.

O NPS é mais que uma pesquisa periódica. É uma metodologia que não só usa um número indicador para medir a saúde de uma empresa, mas também estrutura a análise dos sintomas para chegar a um diagnóstico mais assertivo.

Quando não investigam mais a fundo os problemas da empresa, os gestores assumem terem as respostas aos problemas, investindo em soluções falhas, que eles sequer iriam considerar se ouvissem o que os clientes têm a dizer.

Enviesar a pesquisa

Talvez sua equipe não esteja fazendo isso conscientemente, mas isso é uma consequência comum de focar um NPS apenas nos números. Nesse esforço muitas equipes podem cometer erros que tornam o NPS irrelevante para o resultado da empresa, ao enviesar a pesquisa ou segmentar o público para que a pesquisa aponte notas maiores e respostas mais “positivas”, que não refletem a realidade da opinião do público geral.

Ao fazer isso, você está negligenciando o tratamento de problemas, que tendem a aparecer mais tarde, quando forem tão grandes que não possam mais ser ignorados.

Não identificar as prioridades

Um dos papéis mais importantes de um NPS é ajudar a construir o Roadmap de um produto. Por ser uma pesquisa abrangente, ela ajuda a medir não só quais são os pontos fortes e fracos do seu produto, mas também o tamanho e as implicações de cada um desses pontos.

Nesse ponto, ao identificar insights, muitas empresas falham em medir o valor que uma solução pode entregar e consequentemente, falham em priorizar quais soluções devem ser implementadas. Designers estão acostumados a conviver com isso. Estamos constantemente frustrados com nossas ferramentas de trabalho, por problemas persistentes ou tarefas mais trabalhosas do que deveriam. No mês seguinte a ferramenta lança uma atualização, com milhões de novas features que você testa uma vez apenas por curiosidade, mas sem a solução do que você realmente precisa.

O erro está em priorizar tarefas de acordo com seu apelo: — ninguém fez isso ainda; — isso é mais moderno; — assim fica mais legal… entre outros motivos que influenciam pouco na experiência de consumo. Em seu artigo Stop Trying to Delight Your Customers (Pare de Tentar Encantar Seus Consumidores, em tradução livre), Matthew Dixon, Karen Freeman, and Nicholas Toman abordam esse assunto. Apesar de a maioria dos gestores de empresas acreditarem que o sucesso de seus produtos depende proporcionar experiências encantadoras, o aspecto que mais impacta na experiência dos produtos é a quantidade de esforço despendido para realizar uma tarefa. O que todos gestores deveriam estar se perguntando primeiro é: — Eu estou resolvendo os problemas dos meus clientes? Caso a resposta seja sim, deveriam prosseguir: — Essa é a melhor forma de resolver o problema? Felizmente o NPS fornece as ferramentas para responder essas duas perguntas e indica o caminho para se aprofundar mais nessas questões.

Como fazer um NPS

Esse é um ponto onde as opiniões se dividem. Existem muitos aspectos a se considerar no planejamento de um NPS. Será relacional ou transacional? Quantas respostas eu preciso? Qual a periodicidade? Qual o canal de pesquisa? E por aí vai. A resposta para estas perguntas depende de cada caso. Aqui vão algumas dicas que vão te ajudar a tomar essas decisões.

Pense no quê está medindo

Você quer medir a lealdade do consumidor à marca ou ao produto? Quer medir a experiência geral ou em um momento específico, como uma compra ou atendimento? Uma dica aqui é sempre ter um NPS Relacional (de toda a empresa ou de segmentos de negócio) pois ele dá um parâmetro geral sobre a lealdade dos consumidores no longo prazo, além de ser melhor para medir a evolução ao longo do tempo.

Você pode complementar sua pesquisa com alguns NPS Transacionais. Por serem disparados logo após algum contato (compra, suporte, etc) as respostas tendem a ter algum grau de profundidade relacionado ao ponto de contato. Porém eles não refletem com muita exatidão a lealdade dos clientes, pois essa pode ser a primeiro compra ou o atendente podia estar de mal humor no dia.

Não exagere

No mundo ideal, você pesquisaria todos os clientes constantemente, porém isso não é viável nem necessário. Seu NPS não vai mudar muito de um dia para o outro e seus clientes não estarão sempre dispostos a colaborar. Além disso você deve medir o volume de dados com os quais você consegue trabalhar. Poucas respostas significa pouca profundidade de informações. Muitas respostas significa muito esforço de análise.

É sempre uma boa ideia definir uma amostra dos clientes, pois isso permitirá que você fale com clientes diferentes a cada onda de pesquisa. Dessa forma você não sobrecarrega seus clientes com pesquisas e tem opiniões diferentes sempre. Você pode ir testando até chegar a um tamanho de amostra ideal, que seja representativa, que vai fornecer o volume de dados e a qualidade das respostas que você precisa.

Reflita sobre o canal de pesquisa

O canal pode afetar o resultado de uma pesquisa, seja enviesando, seja pelo engajamento dos consumidores. Por exemplo, no Banco PAN, nós tomamos cuidado de não disparar pesquisas apenas por e-mail para clientes de empréstimo consignado, pois a maioria dos aposentados não possuem email. Ao fazer isso, nós estamos atingindo uma parcela dos clientes que é mais digitalizada, o que acaba enviesando as respostas. Isso não é um problema caso o foco da pesquisa seja um perfil digitalizado, porém para abranger todo o público é necessário estender essa pesquisa a outros canais, como telefone e pesquisas nas lojas.

Cuidado com a pergunta

Considerando que o NPS se baseia em apenas uma pergunta, essa pergunta pode afetar todo o resultado da pesquisa. É comum perguntarem sobre a experiência, gosto e outros aspectos subjetivos, mas o verdadeiro foco deve ser uma questão objetiva: Os clientes recomendam seu produto?

Você pode adaptar a pergunta ao contexto da pesquisa, mas tome cuidado com a linguagem e com a interpretação da pergunta. Evite palavras difíceis, como "experiência" ou "transação". Sempre que possível, seja direto, por exemplo "Você recomendaria…" ou se precisar, contextualize, por exemplo "Considerando nosso atendimento, você recomendaria…".

Um exemplo ruim e um exemplo bom de perguntas para usar em um NPS

Não induza respostas

As vezes alguns fatores sutis podem influenciar a resposta dos clientes. É importante deixar sua pesquisa mais neutra possível. Por exemplo, em CSAT é comum usarmos cores e emojis para descrever o nível de satisfação, o que não é um problema, pois a satisfação é uma emoção subjetiva. Para um NPS, isso já não é recomendado, pois ele mede uma questão objetiva: se o cliente recomenda seu produto ou não.

Você não quer que o cliente pare para pensar na resposta, mas que dê uma resposta espontânea, pois uma recomendação geralmente é uma atitude espontânea.

Comparação entre um CSAT (à esquerda) e um NPS (à direita)

Conclusão

Espero que esse artigo ajude você a ver a importância de medir a qualidade do relacionamento com os consumidores. Existem diversas outras metodologias para isso, como o CSAT (Costumer Satisfaction Score) que mede a satisfação relacionada aos aspectos de um produto ou serviço, ou o CES (Costumer Effort Score) que mede a dificuldade para realizar tarefas. Não importa qual metodologia você escolha, desde que tenha um plano de como fazer a pesquisa e o que fazer com os resultados. Seus clientes agradecem.

Obrigado por ler até o final, agora dê sua opinião, você concorda com essa visão? Faltou falar alguma coisa? Ficou com alguma dúvida ou quer saber mais sobre o assunto? Deixe um comentário e vamos conversar!

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Eric Platas
OPANehtech

Sou designer de produtos no Banco PAN, formado em publicidade, com mais de 10 anos de experiência em Design, UX, CRO, Marketing Digital e por aí vai…