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OPEN SOURCE [na sala dos ‘profes’] #00

Cynthia Hansen
OPEN SOURCE [na sala dos profes]
5 min readFeb 28, 2019

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Uma coluna sincera sobre a docência no Ensino Superior

Sou professora do Ensino Superior há mais de dez anos e sempre gostei das conversas na sala do professores. Há quem pense que professor só sabe falar mal dos alunos quando está por lá (até parece! Tantas coisas para filosofar primeiro…), mas o fato é que é um momento riquíssimo de troca de ideias. Em instituições maiores, esse momento é com colegas de curso (no meu caso, Publicidade e Propaganda) e de área (Comunicação Social). Nas menores, inclusive com colegas de áreas bem diversas (das Engenharias à Medicina Veterinária).

Na ‘sala dos profes’ a gente tem oportunidade de perceber que, independentemente da área, temos os mesmos sonhos, as mesmas agruras e diferentes formas de solucionar problemas. Ao mesmo tempo em que nos identificamos uns com os outros — por mais diferentes que sejamos — e nos sentimos acolhidos por nossos pares (ah, o poder da empatia!), também temos a maravilhosa oportunidade de acesso a um arcabouço infinito de conhecimentos e estratégias. Tanto sobre as áreas específicas de atuação como sobre a docência.

E, falando em docência, você já parou para pensar que, de modo geral, no Ensino Superior, não temos educadores? Explico: eu, por exemplo, me formei publicitária e fui dar aulas alguns anos depois. Na Especialização houve aquelas horinhas de Metodologia do Ensino Superior (aham, seeeei…) e ficou por isso, pois meu Mestrado e Doutorado não foram na área da Educação. Fora o pessoal da Pedagogia, Magistério e afins, esta é a realidade de muitos e muitos colegas professores. Um profissional da área ‘X’ que dá aulas.

Eu sempre gostei de estudar e acredito profundamente no poder transformador do aprendizado (veja, do aprendizado, não da tal da ‘Educação’, pois esta noção é muito variável pro meu gosto). Como aluna, notava que muitos colegas não percebiam a escola como eu. Alguns achavam um saco, enquanto outros tantos se arrebentavam tentando dar conta do recado e, ainda assim, às vezes não conseguiam.

Quando mudei de lado, não encontrei nada de diferente. Então, tratei de me esforçar para fazer meus alunos perceberem que estudar, adquirir novos conhecimentos, enfim, aprender, poderia ser uma coisa muito interessante e útil. Só que eu não tinha a menor ideia de como fazer isso!

Inventividade, erros, acertos e reflexão passaram a integrar a minha atuação como professora desde que eu percebi que nem todo mundo dava conta de aprender como eu aprendia, ou seja, há anos minhas turmas são laboratórios experimentais. Tudo isso porque o dia-a-dia nos leva a ir cada vez mais fundo nas questões relacionadas a nossa área de formação e porque não existe uma cultura verdadeira de desenvolvimento de conhecimento sobre o processo de ensino e aprendizagem (as Formações Continuadas e Capacitações Docentes que me perdoem a sinceridade!).

Muitas destas reflexões só se cristalizaram depois que eu tive uma oportunidade fantástica: participar de uma Certificação Docente Internacional em Pedagogia do Ensino Superior elaborada nada mais, nada menos que por um consórcio de universidades finlandesas. Sim, o sumo do supra sumo da educação mais empoderadora que eu conheço. Eu não curto educação para passar em testes e provas, eu acredito em aprendizado para a vida, então dá para entender minha reverência ao modo de educar dos finlandeses, né? (veja, é uma questão de filosofia, não de estrutura, apesar de uma boa estrutura ajudar bastante).

Entre as milhares de coisas incríveis que aprendi durante quase um ano deste primeiro curso (e que tenho aplicado no meu dia-a-dia em sala com excelentes resultados), uma coisa fez meu coração bater ainda mais forte: o conceito de Comunidades de Prática.

O termo Comunidade de Prática (Community of Practice - CoP) foi usado pela primeira vez em 1991 pelos teóricos Jean Lave e Etienne Wenger, que discutiram a noção de participação periférica legítima. Em 1998, o teórico Etienne Wenger ampliou o conceito e aplicou-o a outros domínios, como organizações.

As Comunidades de Prática podem ser definidas, em parte, como um processo de aprendizagem social que ocorre quando pessoas que têm um interesse comum em um assunto ou área colaboram durante um longo período de tempo, compartilhando ideias e estratégias, determinando soluções e construindo inovações. Wenger dá uma definição simples: “Comunidades de prática são grupos de pessoas que compartilham uma preocupação ou paixão por algo que fazem e aprendem como fazê-lo melhor, pois interagem regularmente”. Observe que isso permite, mas não exige intencionalidade. A aprendizagem pode ser, e frequentemente é, um resultado incidental que acompanha esses processos sociais (tradução livre).

Resumo da ópera: a minha querida sala dos profes é o lugar em que se materializa, mesmo que apenas momentaneamente, uma Comunidade de Prática Docente. Eu amo estas comunidades porque acredito no poder de inovação que elas têm e é por isso que, desde que me deparei com o conceito que sintetiza essa sinergia tão legal, tenho quebrado a cabeça pensando em formas de potencializar estes momentos de reunião de pessoas praticantes da docência que, em muitos casos (ufa!), são pessoas apaixonadas pelo que fazem.

Até agora, consegui ter só duas ideias: 1) começar a escrever a respeito das minhas experiências como docente, especialmente depois do impacto das Certificações Docentes que fiz (torcendo para estimular colegas a escreverem de volta) e 2) criar, com os corajosos que quiseram encarar o desafio, um grupo de estudo de uma obra seminal da filosofia de educação finlandesa (e que, se tem tradução para o português, ainda não encontrei), o livro de John Biggs e Catherine Tang ‘Teaching for quality learning at University’.

Este texto que você está lendo é a primeira materialização da ideia 1, a qual eu pretendo dar sequência com relatos das minhas disciplinas deste semestre, com sínteses dos capítulos do livro que vamos estudar no grupo (ideia 2) e (vai que…) com relatos recebidos de colegas. Vou ter a ousadia de propor a mim mesma um texto por semana e torcer para dar conta!

Ah! O primeiro encontro do grupo de estudos vai acontecer depois do carnaval.

Me conta o que você achou da ideia, seja você professor ou não. E, caso tenha, me mande seu(s) causo(s) de docência e/ou sugestão(ões) de temas para discutir aqui no #OpenSource (que quer dizer código aberto, pois a ideia é que colegas possam usar os erros e acertos que virem por aqui para refletir sobre suas próprias práticas).

Escreve pra mim: komonolearning@gmail.com

Eu vou adorar poder conversar com você na #SaladosProfes :)

P.S.: se você gostou da minha ideia de falar sobre estes assuntos e ficou com vontade de acompanhar minha coluna, clica aqui, responde o form e eu vou te avisando na medida em que publicar novos textos ;)

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Cynthia Hansen
OPEN SOURCE [na sala dos profes]

Publicitária, professora, apaixonada por aprendizagem, eterna aprendiz, co-idealizadora do Heimo Learning Lab e ligada em 220V! about.me/cynthia.hansen