A pessoa que colore a cidade

o prisma
oprisma
Published in
4 min readNov 18, 2019
Rosane e um de seus mais recentes trabalhos / Foto: Natália Perezin

Rosane Araujo é uma mulher simples. Sem muitas cerimônias, convida as pessoas para sua casa com o maior prazer. Fala sobre a arte de forma pura e singela. Não esconde sua preferência aos bichos do que às pessoas. É sincera com todos, consigo mesma e com a arte. Sua casa é uma simples bagunça, ou uma bagunça simples. Apesar de toda a simplicidade, deixa sua marca registrada por Londrina, mesmo que muitos não saibam: ela é a autora dos pequenos e grandes coloridos mosaicos espalhados na cidade. Nos bancos, escadarias, postes ou muros, Araujo usa sua arte para colorir o cotidiano das pessoas. Há pouco tempo assina seus mosaicos, apenas com o primeiro nome. Os desenhos que mais gosta de fazer são animais — como pássaros e gatos — , flores e figuras femininas. Com uma história de vida às vezes simples, às vezes complexa, a artista absorve vários elementos de seu dia a dia como inspiração.

A figura feminina é uma das imagens que Rosane prefere reproduzir / Foto: Natália Perezin
Londrina fica cheia de mosaicos coloridos devido ao trabalho de Rosane / Foto: Natália Perezin

Ela desenvolve esse trabalho desde 2011 e, em 2013, foi para a Vila Portuguesa, no centro de Londrina. Escolheu o bairro porque é apaixonada pelas “ruas estreitas e sem saída”, além pela vontade de levar luz, cor e alegria para o bairro que, segundo ela, é muito quieto.

Araujo não tem intenção financeira alguma com a arte: faz pelo amor, pela alegria e porque, segundo ela, a arte é alimentadora. Por isso, está sempre aberta às pessoas que desejam aprender a fazer mosaicos.

A relação entre Araujo e a arte é bem íntima, e ao que tudo indica, ela deseja que seja assim com as outras pessoas. Afirma que um dos motivos pelos quais espalha mosaicos pela cidade é para instigar, alegrar, mexer e provocar curiosidade nas pessoas. Ela diz que considera a vida, por vezes, muito pesada e acha que sua arte é uma forma de faz. Também não leva os créditos para si ao ouvir um elogio: “Tudo que faço é pela arte. Ela é uma pessoa para mim. Faço arte pensando nela e quando alguém elogia, penso ‘é pra você, arte, esse elogio’. Porque sou apenas um instrumento da arte”, diz.

Em 2017, aconteceu em sua vida o que considera uma perda irreparável: a morte de sua nora. Os três anos anteriores a esse, Araujo intercalou entre cuidar da moça, que estava doente, e fazer arte. Ela afirma que, pela lógica do tempo, quem deveria morrer era sua mãe ou ela mesma, mas foi a nora, que tinha idade para ser sua filha. Esse momento, marcado por imensa tristeza na família, despertou em Araujo vontade de se dedicar ainda mais às atividades artísticas. Ela comenta que sua nora sempre foi uma grande parceira e incentivadora.

“Eu faço um trabalho e fico pensando ‘será que ela gostou?’ Até hoje a opinião dela, pra mim, tem peso.”

O torquês é um dos instrumentos de seu trabalho / Foto: Natália Perezin

Araujo encontra em caçambas de lixo a maioria dos materiais que utiliza nos mosaicos. De vez em quando, recebe doações inesperadas e guarda em sua casa. Ela explica que para aplicar o mosaico em qualquer lugar que seja precisa, primeiramente, desenhar e montar em casa e só depois transfere a peça. De acordo com ela, essa técnica facilita o trabalho porque reduz o tempo de produção e minimiza os erros. Além dos azulejos, utiliza uma torquês e uma riscadeira para deixar a peça do jeito que deseja.

Rosane afirma que não pretende parar de fazer arte. Com a mesma simplicidade, diz que não tem nenhum projeto em mente para o futuro, mas sabe que deixar os mosaicos não é uma opção. Ela se considera uma funcionária da arte, apaixonada por arte. “Enquanto tiver condições físicas, vou ser artista.” Simples assim.

“A arte salva. Salva de algo, do quê, eu não sei.”

Texto: Natália Perezin

--

--