TOC: Caracterização, Causas, Tratamento e Psicanálise
Manias, rituais, culpa, necessidade de controle, de organização, comportamentos repetitivos e pensamentos recorrentes e incontroláveis. Esse conjunto lhe parece familiar?
Saiba que essas características estão presentes em um transtorno chamado Transtorno Obsessivo-Compulsivo, ou — à luz da Psicanálise — Neurose Obsessiva-Compulsiva (a qual veremos mais à frente).
O Transtorno Obsessivo-Compulsivo — o famoso TOC — é classificado como um transtorno de ansiedade caracterizado por ideias obsessivas e comportamentos compulsivos, segundo o DSM-V (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais).
Mas como diferenciar um comportamento comum e até valorizado socialmente de alguém que é organizado e disciplinado, de alguém que tenha o transtorno?
Na Psicologia, falamos sobre o grau de sofrimento e o prejuízo que esses comportamentos causam à vida social e familiar como forma de distinguir um transtorno de um comportamento “comum”. Diferentemente da pessoa organizada, a pessoa com o transtorno é invadida por pensamentos intrusivos e não consegue contê-los: ela se sente impotente diante desses.
A maior parte dos indivíduos com TOC apresentam o que chamamos de comorbidade — ou seja, possui outro transtorno além desse, o que piora ainda mais o quadro clínico.
TRAÇOS OBSESSIVOS, CARÁTER OBSESSIVO E TRANSTORNO OBSESSIVO-COMPULSIVO: Qual a diferença entre eles?
Os traços obsessivos são traços de personalidade como qualquer outro. Estes, neste caso, se referem à comportamentos de dúvidas, controle, meticulosidade, entre outros, que não costumam gerar grande sofrimento emocional.
O caráter obsessivo se refere à pessoas cuja personalidade e estrutura psíquica são marcadas por disciplina, necessidade de ordem, método, entre outros.
Já o transtorno obsessivo-compulsivo é um conjunto de sintomas e comportamentos que trazem um enorme sofrimento à pessoa, seus amigos e sua família.
CARACTERIZAÇÃO DO TOC
Como dito anteriormente, o TOC é definido por ideias obsessivas e comportamentos compulsivos. Vamos agora explicar o que cada uma significa.
As ideias obsessivas são pensamentos persistentes e absurdos, marcados por dúvidas, grande preocupação e uma necessidade de controle. Na maioria das vezes, a pessoa até mesmo percebe que eles são irracionais e ilógicos, entretanto, não tem autoridade sobre eles — não consegue evitá-los e os vivencia com muita angústia e ansiedade, como se fosse uma permanente indecisão em que a escolha “errada” arruinaria sua vida.
Os comportamentos compulsivos são comportamentos repetitivos e marcados por rituais como lavar a mão várias vezes, verificar a tranca muitas vezes antes de sair de casa, organizar e contar as mesmas coisas repetidas vezes, entre outros. Estes são os mais popularmente conhecidos e representados em séries, filmes, novelas, etc.
Eles também se apresentam como pensamentos mágicos seguidos de comportamentos ritualísticos, cujo objetivo é afastar algo indesejado ou então anular magicamente algo que já foi feito. Esses rituais, realizados de forma compulsiva, aparecem como uma tentativa de aliviar a ansiedade causada pelos pensamentos obsessivos.
O quadro obsessivo-compulsivo pode ter predomínio de ideias obsessivas, de comportamentos compulsivos ou se apresentarem de forma mista.
Há também mais duas formas em que o transtorno pode se manifestar. Uma delas é através da passividade, na qual há uma grande preocupação em agradar os outros e existe um receio de perder o amor ou não ser aceito por essas pessoas. A outra é por meio de uma assertividade exacerbada, beirando à agressividade, com tendência à intolerância à falhas de outros e imposição de suas ideias aos demais, geralmente encontrado em pessoas com perfis de liderança.
Em alguns, além da obsessividade e compulsividade, há também a presença de traços narcisistas disfarçados como uma aparente modéstia.
No geral, a pessoa com TOC está sempre em busca da perfeição e tem pavor de que haja um fracasso ou falha de sua parte. Isso faz com que ela seja inflexível e extremamente exigente consigo mesma (ou com os outros), e sinta culpa com facilidade.
Agora que abordamos o que a psiquiatria diz sobre o transtorno, vamos seguir para a Psicanálise.
NEUROSE OBSESSIVO-COMPULSIVA: O QUE DIZ A PSICANÁLISE?
Para a Psicanálise, o TOC é denominado como neurose obsessivo-compulsiva e é entendido como uma forma de organização dos mecanismos de defesas do Ego.
Mas o que é Ego? Freud explica.
Segundo o autor, as ações humanas são influenciados pela interação de três instâncias que compõem a psique humana: Id, Ego e Superego.
No Id estariam nossos instintos, guiados pelo princípio do prazer, sempre dispostos a atender nossas vontades — para o Id tudo é possível.
Em oposição ao Id, temos o Superego, que é responsável pela ética e moral, é onde temos a censura, as regras e o medo de ser punido.
Por fim, entre os dois, estaria o Ego, o grande conciliador que busca mesclar as vontades do Id e as responsabilidades exigidas pelo Superego.
Na neurose obsessivo-compulsiva há o conflito entre um Ego extremamente rígido e cruel, submetido às demandas do Superego, e as pulsões do Id. No próprio Id podem haver conflitos entre as pulsões de vida e de morte.
O neurótico obsessivo-compulsivo precisa de uma grande energia para reprimir fantasias de desejos intensos de caráter sadomasoquista e lutar contra um Superego sádico e cruel.
CAUSAS
As causas do TOC ainda não estão bem esclarecidas, embora estudos apontem a uma causa multifatorial de questões genéticas, psicológicas, individuais e familiares, e de funcionamento cerebral.
Já para a Psicanálise, segundo Zimerman (Manual de Técnica Psicanalítica, 2004), podemos pensar em fatores como:
- Pais obsessivos que acabam impondo um Superego extremamente rígido e punitivo. Esse domaria de forma extremada os instintos;
- Uma grande carga de pulsões agressivas, dificultando o Ego a processá-las;
- Fixação na fase anal, esta fase como forma de evitar a angústia de castração (angústia que se revela através do medo de perder algo significativo como uma forma de punição, e tem como base o conflito entre o desejo e a interdição);
- Identificação com referências obsessivas encontradas na cultura e nos pais.
Além disso, o momento social e histórico que estamos vivenciando contribui para desencadear e agravar quadros de TOC. Estudos apontam que os danos psicossociais causados pela pandemia podem afetar negativamente a saúde mental de todos indivíduos independente das patologias apresentadas.
TRATAMENTO
A psicoterapia e a medicação são consideradas as melhores alternativas de tratamento.
Na psicoterapia de orientação psicanalítica, entre diversas possibilidades e manejos, podemos destacar a importância do analista ajudar o paciente a reconhecer suas limitações e possibilidades, de forma a aumentar a tolerância à falhas e diminuir a necessidade de perfeição imposta por ele mesmo.
Pode-se também auxiliar o paciente a sair de um lugar de obrigação em cumprir ideais que o deixam extremamente suscetível à críticas e comumente decepcionado consigo mesmo. Na análise, procura-se transformar o Superego em um Ego auxiliar — ou seja, um Superego menos rígido e ameaçador.
Outras abordagens, como a Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC), também apresentam grande eficácia na remissão dos sintomas.
A psicoeducação também deve ser considerada, já que a orientação aos pacientes e familiares sobre como lidar com os sintomas e com o tratamento podem favorecer para uma maior qualidade de vida e maior adesão ao tratamento.