A pescadora de almas ressuscita uma busca antiga

Melissa Setubal
oqueaprendihoje
Published in
3 min readJul 15, 2018

Maria Madalena só é uma figura polêmica por um fato: ela foi uma mulher. Alguém consegue pensar em algum outro motivo, além do fato de ser cristã numa época em que isso era bem mal visto, para ela causar tanto frisson?

Sim, bora tocar na polêmica das religiões, porque afinal de contas nada mais é do que um pedaço da looooooonga história de supressão do impacto positivo das mulheres na sociedade como um todo, independente de crenças.

Mas eu resolvi assistir o recente filme sobre a vida dela com a Rooney Mara no papel principal não com meu olhar criado na igreja católica, nem mesmo apenas pelo repertório no sagrado feminino, e por um instante além das premissas do feminismo.

Olhei para ela como uma buscadora. Alguém que enquanto ser humano percebe não se encaixar na forma vigente da cultura em que está inserida, que sabe que pode experimentar mais da vida, e que parte numa jornada para explorar isso.

E que acaba por descobrir, muitas vezes, que em seu interior já viva muito do que é mostrado como o novo caminho, porém ainda não tinha encontrado gente que a desse algum incentivo nessa direção, ao invés de julgá-la como louca ou subversiva ou perigosa.

O que mais me tocou neste filme em particular foi que fica claro desde o princípio que ela não precisou da figura e da permissão de Jesus para sentir e experimentar Deus, o pai benevolente.

Ela já tinha essa conexão, só que nada nem ninguém à volta dela reconhecia a forma dela, e a razão fica óbvia: ao invés de Deus, os homens a condenam como recebedora do capeta.

Se é que Jesus a libertou de alguma coisa, não foi de sete demônios, e sim da visão limitada e condenadora de quem a cercava, oferecendo a ela não julgamento e amor incondicional.

E é o que ela oferece de volta pras pessoas. As cenas dela dando um show de compaixão e de bondade amorosa estilhaçam nosso coração. Eu, além de chorar copiosamente, de todas as emoções possíveis, fiquei meditando por um bom tempo sobre ser uma buscadora.

Não é para as fracas, mas é para as sensíveis. Não é para expulsar demônios, mas é para integrar luz e sombra. Não é para loucas, mas é para quem sabe no fundo que a lucidez não mora na normalidade.

Como Maria Madalena, que foi condenada a um papel secundário, mal visto, e pouco relevante na igreja, é comum eu me sentir desvalorizada sobre o que sou, estou e faço no andamento da minha vida pessoal, amorosa, profissional entre outras coisas porque meu foco principal em qualquer aspecto da minha vida é o meu desenvolvimento espiritual enquanto um ser humano.

Definitivamente ter vindo como mulher neste mundo em um momento e uma cultura que começam a dar visibilidade para as qualidades da energia feminina, as contribuições dos comportamentos femininos, e mais que tudo, o impacto imensamente positivo das mulheres (independentes de femininas ou masculinas, interpretem isso como quiserem) na transformação do mundo, um ato ordinário, sutil, pequeno e rotineiro por vez, não é ainda um passeio no parque.

But is one hell of a ride!

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