Grey’s Anatomy e o nosso apego ao trabalho

Melissa Setubal
oqueaprendihoje
Published in
3 min readJul 12, 2018

Uma dedicação de quase 15 anos. Se eu parar para pensar, se um dei tanta atenção e consideração a algo na minha vida por tanto tempo, talvez não preencha todos os dedos das mãos.
Maldita Shonda Rhimes que nos enfeitiça com seus dramalhões cheios de tantos acontecimentos trágicos e intensos, que um midseason dela mais parece final de série de qualquer outro programa na TV, e que um final de temporada é um acontecimento com um cliff hanger mais emocionante que Brasil na final de Copa do Mundo.
E nem é que o trem tá bom nos últimos tempos. As histórias se arrastam, não fazem sentido, as personagens mais legais já foram embora faz tempo (#RIPGeorge, #volta Yang, #saudadesCallie), os interessantes ficam cada vez com menos apelo (Grey e Bailey), e os chatos, jesus, como fazem a coisa ficar difícil de continuar a assistir.
Mas a questão é: a temporada 14 terminou, eu estou pensando na próxima que está confirmada, e independente de existir muitas outras coisas interessantes para usar meu tempo e energia para acompanhar, eu vou baixar religiosamente toda quinta o próximo episódio.
Por que eu ainda estou aqui neste relacionamento sério com esta série que já não me oferece tanta satisfação assim?

Talvez seja porque nos últimos tempos, muitos episódios tragam discussões relevantes sobre feminismo, relacionamentos familiares, românticos e de trabalho, evolução e dilemas da medicina. Mesmo que por poucos minutos.
Talvez porque Shondinha e seus roteiristas tenham a habilidade de trazer leveza e um toque de humor permeando os dramas, o que parece ser a dose exata de alívio para tanta tensão, e o segredo para manter a atenção (vide o episódio dos biscoitos de maconha hehehehe).
Mas talvez, o mais provável mesmo, seja só uma questão de costume.
Daí comecei a pensar sobre apego. O que fazem pessoas há 15 anos estarem apegadas a essas pessoas de mentiras em seus dramas surreais, mas que na maior parte de tempo passam por questões que em muito se parecem com os dilemas que a gente vive?
Quais são as pessoas, coisas e situações que eu passei mais tempo apegada?
Há algum tempo percebo que eu tenho uma tendência a me apegar ao meu trabalho. Ontem mesmo estava conversando sobre isso, depois de ouvir um podcast do canal Mamilos sobre “Você não é o seu trabalho”, e percebi ser uma coisa mais comum do que imaginava.
O quanto do nosso senso de valor enquanto seres e a nossa identidade estão atrelados a carreira que dedicamos boa parte do nosso tempo e energia? O que leva a gente a encontrar alguma satisfação na atividade em si, ou em como servimos aos outros seres, ou ainda ao status que ela nos dá perante a sociedade, ou ainda a grana gerada por ela?
Voltando a Grey’s Anatomy, vemos inúmeros indivíduos com uma hiper identificação com seus trabalhos, a ponto que suas vidas inteiras giram em torno daquele hospital, anos inteiros foram dedicados apenas com o objetivo de ter a ‘honra’ de trabalhar lá, e anos inteiros são dedicados a subirem para posições de gerência e diretoria.
Qual será o sentido disso tudo?
Qual o sentido das coisas as quais a gente mais se dedica?
Qual o sentido de eu ainda estar assistindo essa série?

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